Local da maior vitória brasileira na Davis

Clube porto-alegrense está vinculado à história do nosso tênis. Local foi palco de uma das maiores vitórias do Brasil na Copa Davis


O bairro Moinhos de Vento em Porto Alegre é repleto de prédios elegantes, com comércio fino e bares da moda, que a elite da mocidade porto-alegrense costuma freqüentar. E incrustado em meio a chiques condomínios residenciais, fica um dos mais tradicionais clubes da região sul do Brasil, a Associação Leopoldina Juvenil. A fachada exuberante já demonstra um pouco da imponência do lugar e seus 145 anos. O grande salão é constantemente requisitado para suntuosas festas de debutantes, no verão a visão da piscina torna-se ainda mais atraente com adornos de beleza da juventude gaúcha, mas é nas quadras de tênis que o movimento nunca pára.
“O clube tem outros esportes, mas é difícil algum suplantar o tênis. Porque a razão dele é o tênis”, explica Luiz Fernando Koch, 71 anos, representante de uma das famílias que mais se destacou na história do Leopoldina. “É um clube que tem salões muito bonitos, arquitetura bonita, mas o que mais chama atenção é a cor do saibro mesmo. Quem entra, sente que o clube é tênis”, conta o atual diretor de tênis, Roberto Mello. Com 14 quadras de saibro – impecáveis – em duas sedes e cerca de doze mil associados, a agremiação tem extremo zelo pelo esporte que lhe rendeu grande fama.

fotos: Arnaldo Grizzo
Fachada imponente Salões recebem grandes bailes até hoje

Influência dos Koch
A história do clube remete a tempos pós-Revolução Farroupilha (1835-45), quando a capital da província do Rio Grande do Sul se desenvolvia economicamente e uma elite urbana, marcadamente de origem alemã, formava-se. Nesta época, começaram a aparecer diversas agremiações de cultura e lazer, entre elas, a Gesellschaft Leopoldina (Sociedade Leopoldina, em alemão), fundada em 24 de junho de 1863.
Augusto Koch, um dos fundadores da Sociedade Leopoldina, tornou-se o primeiro dirigente do clube a receber o título de presidente honorário, em 1923. Aficionado esportista, ele também foi um dos fundadores do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense. A veia esportiva de Augusto continuou com o filho, Walter, um dos grandes responsáveis pelas transformações por que passou a agremiação nas décadas de 30 e 40. Em 1932, Walter Koch apresentou uma proposta de fusão entre a Sociedade Leopoldina e o Club Recreio Juvenil, fundado em 1903. O Juvenil era um clube de jovens solteiros que organizavam agitados bailes na cidade no início do século XX.
A fusão não ocorreu de imediato. Somente em 1941 nasceu a Associação Leopoldina Juvenil, fruto da junção entre as agremiações. E também foi Walter quem direcionou as atenções do clube para os esportes, já que antes o foco estava muito na parte social. Tanto que, em 1938, surgiu o departamento de tênis da Leopoldina. A inauguração teve a presença de Dom Pedro de Orleans e Bragança, neto da Imperatriz Leopoldina, que deu nome ao clube. Desde então, o tênis dominou o cenário e o a agremiação passou a deixar marcas na história do tênis brasileiro. Em 1948, foi realizado o primeiro Campeonato Noturno de Tênis, com mais de 200 inscritos. O torneio ganhou fama e recebeu tenistas brasileiros e estrangeiros de destaque como Edison Mandarino, Ronald Barnes, Lelé Fernandes, Ivo Ribeiro, Nicola Pietrangelli, Vera Sukova etc.

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Acervo Leopoldina
Vitória brasileira sobre os forte time norteamericano em 1963 foi um marco na história do tênis brasileiro, do clube e da cidade de Porto Alegre

Brasil x EUA
No entanto, poucos momentos esportivos no clube foram tão marcantes como a disputa da Copa Davis, em 1966. As quadras da Leopoldina receberam o duelo entre Brasil e Estados Unidos por uma vaga nas semifinais da competição. De um lado, uma equipe formada por figuras lendárias: Arthur Ashe, Cliff Richey, Charles Passarel e Dennis Ralston. Do outro, expectativas depositadas nos momentos fenomenais de Mandarino e no jovem e promissor tenista criado no clube: Thomaz Koch, com 21 anos na época, considerado o melhor juvenil do mundo em 1963, filho do ex-presidente Walter Koch e irmão mais novo de Luiz Fernando – que foi campeão brasileiro de tênis em 1960.
Com o confronto empatado em 2 a 2, após vitória de Koch sobre Richey, uma atuação espetacular de Mandarino contra Ralston selou uma das maiores vitórias do Brasil na Davis. O momento vivido na Associação Leopoldina teve grande repercussão. E o feito dos heróis brasileiros motivou a garotada a entrar nas quadras de tênis do clube.
O ex-tenista profissional Luis Carlos Enck, o Biba, que estaria no time da Davis dez anos mais tarde, sempre teve sua história ligada à Leopoldina e lembra bem daqueles dias do confronto. “Eu tinha dez anos na época. A gente ia cedo para o clube e ficava vendo os americanos e brasileiros treinarem. Foi em novembro, estava um calor bem grande e era uma época de muito movimento no clube, de piscina. A gente vivia freqüentando aquele ambiente todo. Foi uma coisa bem motivadora para uma turma que já estava se envolvendo com o tênis. Muita gente começou a jogar a partir daquilo”. E o clube também marcou a vida de Biba de outra maneira. Foi lá que ele e Niége Dias, que se tornaria a melhor brasileira no ranking da WTA, se conheceram. No início, era apenas uma relação entre técnico e atleta, depois se tornou um casamento.

Arquitetura clássica é um dos pontos altos da agremiação No verão, associados dividem a atenção entre as quadras e a convidativa piscina
FM e Bruno Mattos
Clube retoma agora o foco na formação de jovens tenistas

Recomeço
Aqueles foram anos de glória do tênis na Associação Leopoldina Juvenil. Atualmente, embora ainda existam importantes eventos realizados no clube como a Copa Gerdau, o principal torneio juvenil da América do Sul atualmente, e a Copa Yone Borba Dias, um importante torneio sênior da ITF, as raquetes ganharam mais foco no lazer e o tênis na Leopoldina se distanciou dos tempos em que tinha uma forte equipe de competição capaz de revelar talentos como Thomaz Koch, Luis Carlos Enck, Luiz Fernando Koch, Sabrina Giusto, Niége Dias, Andréa Meister, entre tantos outros. A retomada desta herança tem sido o principal objetivo da atual direção do tênis.
Para isso, a diretoria buscou ajuda de especialistas e reestruturou a equipe de treinamento. Hoje, ela é coordenada por Maurício Motta (tenista e técnico formado no clube), Cristiano Testa (extenista profissional) e supervisionada pelo principal nome do tênis do clube, Thomaz Koch. Além da parte de quadra, a formação da nova equipe tem especialistas em preparação física, nutrição, fisioterapia e psicologia. A gurizada agradece.

Mandarino é levado nos ombros por Vinicius Bergamaschi após a vitória espetacular na Davis
fotos: arquivo/Associação Leopoldina Juvenil
Até Rod Laver (segundo à esquerda) já jogou nas quadras da Leopoldina Confronto Brasil x EUA mobilizou a cidade

Personagens
João Augusto Menegatti, 45, sócio da Associação Leopoldina Juvenil, guarda em sua memória fatos curiosos e personagens que marcaram a história do clube. Um deles é Vinicius Bergamaschi. “Ele tinha algumas peculiaridades. Gostava muito de viajar e de esporte. Então, participou de momentos importantes, tinha fotos da Copa de 1958, por exemplo, quando ele foi à concentração da Seleção, na Suécia, e jogou snooker com os jogadores. Na Davis de 1966, o Thomaz e o Mandarino desfilaram pelas ruas de Porto Alegre no carro do Vinicius. No fim da década de 60 e 70, ele levava equipamentos de mergulho para a piscina do clube, para que as pessoas pudessem brincar. Às vezes, comprava pães aqui perto, vinha com o pão quentinho e distribuía para o pessoal. Foi uma pessoa bastante querida no clube.”
Um fato interessante aconteceu com Alexandre Augusto Medeiros, o Foguinho. “Cabelo cor de fogo, sardento, canhoto e jogava tênis muito bem... era muito parecido com o Rod Laver. Em março de 1982, Laver veio à Leopoldina inaugurar as duas quadras cobertas do Clubinho (segunda sede da ALJ) em um jogo de exibição com Thomaz Koch. Lembro que chegaram para Rod Laver e falaram: ‘Olha o filho que você tem aqui em Porto Alegre!’ E apresentaram o Foguinho. O australiano olhou espantado porque o menino era sardento, ruivo e canhoto como ele. No fim, Laver bateu bola e até jogou um set com ele.”

Rodrigo Linhares

Publicado em 6 de Novembro de 2008 às 12:28


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Artigo publicado nesta revista