Mudanças drásticas



Apostas só se tornaram um problema para as entidades recentemente

Quando o treinador Elson Longo sugeriu esta pauta, a primeira reação, obviamente, foi de questionamento. Ao relatar casos que havia presenciado, ele certamente estava perplexo e indignado. Mesmo sabendo que não poderíamos citar nomes, decidimos levar o assunto adiante não para chocar os leitores, tenistas e técnicos, mas para que servisse como um alerta para muitos que podem inocentemente ser envolvidos por um submundo que, mesmo que ATP, WTA e ITF combatam, acabam por estar presente, ainda que ocultamente, nos torneios. O artigo, então, vale como alerta.

Como editor desta publicação que está há 12 anos no mercado, gostaria de trazer um relato para complementar as informações trazidas pelo autor e mostrar que, até pouco tempo atrás, as principais entidades do tênis ainda estavam alheias ao problema das apostas e dos jogos combinados.

Em agosto de 2003, ainda no primeiro ano da Revista TÊNIS, fui cobrir o Masters de Montreal, no Canadá. Entre os jornalistas credenciados, conheci um que logo se mostrou muito simpático. Perguntei para qual veículo trabalhava e vi que era um site de apostas e informações esportivas voltadas para apostadores. Percebi que ele vivia acompanhando treinos, procurando papo com treinadores e outras pessoas do staff dos tenistas, sempre buscando informações de bastidores sobre alguma possível lesão de um atleta ou mesmo uma noite mal dormida. Qualquer um que fornecesse uma “inside information” já valia para que ele alertasse seus “leitores”.

Ainda novato no ramo, tudo pareceu muito normal para mim, já que ele não fazia nada às escondidas. A coisa toda era tão “liberal” que até ele mesmo apostava um resultado ou outro com alguns colegas jornalistas. Num dia, quando eu disse por alto que acreditava que Andy Roddick poderia vencer Roger Federer, ele não titubeou e propôs no meio da sala de imprensa, sem qualquer pudor: “Quer apostar?” Desconversei e fui para o meu canto (teria ganho, pois o norte-americano venceu a partida).

Pouco mais tarde, começou-se a aventar na mídia alguns casos de possíveis combinações de resultados em jogos de tênis. Logo em setembro daquele ano, um partida entre Irakli Labadze e Tomas Tenconi, no ATP de Palermo, levantou suspeitas de manipulação antes mesmo de começar devido a um volume incomum de apostas em uma zebra italiana. A ATP foi alertada e o árbitro de cadeira da partida chegou a advertir ambos os jogadores com a incomum punição por “falta de combatividade”. Mas foi somente em 2004, quando o conhecido apostador Martin Führer tentou novamente apostar contra seu “amigo” Labadze que o problema das apostas e jogos combinados veio à tona no tênis. Na ocasião, a casa de apostas não aceitou pagar a aposta de Führer, que a processou.

O caso foi alardeado no mundo e, nessa altura, a ATP já estava começando a olhar para o problema. Não à toa, as credenciais do “colega” passaram a ser negadas nos torneios, assim como jornalistas convencionais agora eram proibidos de levar seus laptops para as arquibancadas durante os jogos. Cartazes afirmando que era proibido apostar em jogos foram fixados nas salas de imprensa. De repente, todos eram suspeitos.

A coisa toda continuou ainda muito nebulosa até 2008, quando estourou o caso do jogo de Nikolay Davydenko que teve US$ 7 milhões de apostas e terminou com o russo abandonando a quadra. Naquele ano, as conversas só giraram em torno desse escândalo (que, no fim, não foi provado) e a ATP fez questão de minimizar o fato. Apesar de adotar medidas para combater a corrupção no esporte, entre elas ajudar a criar a Tennis Integrity Unit, a entidade preferia se calar.

Naquele ano, Etienne de Villiers assumiu a presidência da ATP e, durante o US Open, solicitamos uma entrevista. Antes de aceitar concedê-la, porém, o staff da ATP se certificou de que não trataria do escândalo das apostas. Mesmo depois de afirmar que não tocaria no assunto, um dos assessores do presidente, durante o trajeto que fizemos da sala de imprensa até o camarote onde estava De Villiers, fez questão de frisar novamente o assunto proibido, dando a entender que, se ele fosse sequer mencionado, a entrevista seria dada por encerrada.

É compreensível que ATP não queira que esses casos tenham muita publicidade. Nenhum esporte que mexe com tanto dinheiro e tantas paixões gostaria disso. Portanto, o assunto continua sempre à boca miúda. Sabe-se que os perigos ainda estão rondando o esporte, mas também se sabe que cada vez mais se está de olho em possíveis irregularidades. Se antes as entidades que regem o tênis estavam alheias ao problema, hoje elas se juntaram para combatê-lo em várias frentes.

Por Arnaldo Grizzo

Publicado em 23 de Maio de 2015 às 00:00


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