Torneio Grand Champions

Revivendo tradições

A tradicional Sociedade Harmonia de Tênis recebeu seis tenistas top para a realização do Grand Champions Brasil e reviveu tempos áureos do esporte


Tenistas reviveram duelos históricos

A PRINCIPAL QUADRA DA SOCIEDADE HARMONIA DE TÊNIS, clube fundado em 1930 em meio a um dos bairros mais requintados da capital paulista, já foi palco de inúmeros duelos importantes e já recebeu alguns dos principais nomes do tênis mundial. Aquele saibro tem história para contar, aquela arquibancada já viu muita destreza na hora de empunhar uma raquete, aquelas árvores que rodeiam a quadra já fizeram sombra para o breve descanso de grandes gênios.

E, em maio, o clube reviveu seus tempos de glória, dos primórdios do tênis em São Paulo, que viu o surgimento de Alcides Procópio, Maria Esther Bueno, Maneco Fernandes e tantos outros que tiveram suas histórias vinculadas ao Harmonia. Para a disputa do Grand Champions Brasil, reuniram-se seis tenistas que, juntos, acumularam cinco títulos de Grand Slams e certamente faziam jus à honra de poder mostrar suas habilidades na mesma quadra que consagrou tantos ídolos.

MARCARAM PRESENÇA

O público presente no Harmonia foi bastante diverso. Muitas crianças, ao lado de seus pais, acompanhavam os jogos e já aprendiam como se bate uma bolinha com a classe de Carlos Moyá. Os jovens também tiveram forte presença, e o clube serviu como um ponto de encontro entre amigos de quadra e de fora delas. O Harmonia abrigou também um público internacional. Era possível ouvir conversas em espanhol ou inglês durante os intervalos. Em alguns jogos, como nos de Andrés Gomez, a bandeira do Equador era levantada com orgulho. E as mulheres também estavam em grande número.

Um dos motivos da presença massiva do público feminino: a beleza dos jogadores. Especialmente de Moyá e Thomas Enqvist. O sueco, estereótipo perfeito de um gringo nórdico, alto, pele clara, cabelos loiros e olhos verdes, deixou as adolescentes extasiadas, e foi preciso muitas fotos para saciar a vontade de estar perto dele. Já Moyá, com seu jeito um pouco tímido de bom moço, não ficou para trás. Como levou o título, acabou ganhando o coração da mulherada, que fazia plantão na saída querendo fotografar com o espanhol.

NO FRIO

Durante os quatro dias de jogo, o frio não deu descanso, e algumas vezes até mesmo a garoa típica de São Paulo assustou o público, mas nem por isso os amantes do tênis deixaram de conferir os duelos. Em todos os confrontos ficou claro o respeito que os jogadores tinham um pelo outro. Não era incomum ver os tenistas aplaudirem a jogada do adversário, ou até mesmo fazer brincadeiras entre si durante um ponto e outro. As brincadeiras, aliás, foram os grandes marcos desde torneio. Flávio Saretta, por estar jogando em casa, era o mais confortável neste assunto.

A todo o momento falava com a plateia, fazia brincadeiras consigo mesmo e com seus adversários. Recebia até mesmo conselhos gritados da arquibancada. Na partida entre ele e Thomas Muster, que foi uma das mais disputadas da etapa, alguém sugeriu: "dá uma curtinha nele que você ganha!". Saretta agradeceu e seguiu o conselho. Já nas horas em que cometia algum erro não forçado, gritava: "Aí Flavinho! Não faz assim!". Além disso, alguns jogadores, como Enqvist, fizeram questão de estar no Harmonia todos os dias, mesmo que não fosse jogar, só para prestigiar os companheiros.

fotos: João Pires/Fotojump



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fotos: João Pires/Fotojump

BOLINHAS

Entre todos os jogadores, um dos que mais se destacou foi Thomas Muster. Conhecido por seu gênio forte e por sua facilidade em arrumar encrenca, o austríaco não fez diferente no Brasil. Em seu primeiro jogo, ficou bravo por não concordar com algumas marcações. O resultado foram três bolinhas isoladas e uma advertência do juiz de cadeira, que foi respondida com um beijo.

As bolinhas também foram destaque nos pés dos tenistas. Flavio Saretta, mostrando que vem do país do futebol, fez uma série de embaixadinhas e arrancou aplausos da plateia. Depois, num outro jogo, foi a vez de Muster, que ganhou o público e foi aclamado. Na final, Enqvist também deu uma brincada com as amarelinhas.

ÚLTIMO DIA

No domingo, dia da final entre Moyá e Enqvist, o sol deu as caras em São Paulo. O clima era de muita festa. Antes do duelo, Saretta e Yevgeny Kafelnikov disputaram o terceiro lugar que, para a alegria dos brasileiros, ficou para o tenista de Americana.

Antes da partida entre os finalistas, a organização preparou uma homenagem a alguns tenistas brasileiros que fizeram história, como Marcos Hocevar, Sylvio Boock, Manuel Carlos Fernandes, o Maneco, e Alcides Procópio.

Após as homenagens, Moyá e Enqvist, que buscava o tri no Brasil (o sueco ganhou o Grand Champions Brasil nos últimos dois anos), entraram em quadra para um duelo que não deixou nada a dever às partidas profissionais. Os dois esbanjaram ritmo e determinação, mas Moyá deu mais um motivo para a Espanha ser considerada o país dos saibristas. Para a cerimônia de premiação, e também para receber uma homenagem, entrou em quadra a maior tenista brasileira, Maria Esther Bueno. Junto com Moyá, Enqvist e Saretta, ela recebeu flores e foi aplaudida de pé pelo público.

Durante seu discurso, Enqvist agradeceu a organização do ATP Champions Tour e foi só elogios para o espanhol: "Quero parabenizar Moyá por seu primeiro título. Estou feliz que ele faça parte deste circuito, por ser um excelente tenista, mas, especialmente, por ser uma grande pessoa".

Ao receber o troféu, Moyá parabenizou os companheiros e elogiou a cidade, em que nunca esteve: "Estou muito contente por ter ganhado meu primeiro torneio no ATP Champions Tour aqui em São Paulo, onde nunca estive. Fiquei maravilhado com a cidade e com as pessoas. Já joguei em muitos lugares em todo o mundo e este é um dos clubes mais bonitos em que estive". O espanhol também falou de seus planos de jogar, no total, cinco ou seis torneios por ano. Esperamos que ele volte em 2012.

RESULTADOS GRAND CHAMPIONS BRASIL 2011

Disputa de terceiro lugar
Flavio Saretta v. Yevgeny Kafelnikov 1/6, 6/3 e 10/6

Final
Carlos Moyá v. Thomas Enqvist 7/6 (0) e 6/3



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A CASA DO TÊNIS

Fundada em 1930 pela junção da Sociedade Paulista de Tênis e a Sociedade Harmonia de Dança, a Sociedade Harmonia de Tênis nasceu com uma cara diferente dos demais clubes de São Paulo. Exatamente por ser uma união de duas associações distintas, priorizou desde seu início a prática do tênis e o convívio sóciocultural. Para isso, investiu tanto na construção de uma Sede Social, que abriga sala de jogos, restaurante, sala de TV, sala de snooker e salão de eventos, mas também se foca na parte esportiva, que conta com ginásio de fitness, piscinas, salas de aulas para balé e judô e, é claro, quadras de tênis.

Ao todo são nove de saibro, incluindo o Estádio Anésio Lara Campos, em homenagem a um dos fundadores do Harmonia e aquele que mais se preocupou com a excelência do esporte. Foi ele que, em 1930, fez uma viagem à Europa buscando um professor que pudesse efetivamente ensinar o esporte aos associados.

Os fundadores tinham uma meta clara: não queriam apenas um lugar com boas condições para treinar. Pretendiam estimular o interesse dos brasileiros pelo tênis. Deu certo. Após alguns anos e conquistas importantes de tenistas da casa, o Harmonia passou a disputar torneios interclubes, e, mais para frente, criou o Campeonato Aberto que, em 1937, recebeu tenistas de renome internacional.

No ano seguinte, por conta da iminência da II Guerra, as atividades do clube amornaram e só voltaram a borbulhar em 1947. Daí para frente, inúmeros tenistas de fora começaram a se interessar pelo Brasil e a querer conhecer as quadras do Harmonia. Passaram por lá tenistas italianos, franceses, norte-americanos e peruanos. De tão notável, o clube foi palco dos jogos Pan-Americanos de 1963.

Mas não era só para jogos oficiais que a Sociedade Harmonia de Tênis era requisitada. Tenistas como Jimmy Connors e Bjorn Borg, lendas do tênis, fizeram questão de treinar nas quadras do Harmonia. O sueco, que estava em São Paulo para um torneio do WCT, treinava lá todos os dias e participava de jantares e coquetéis. Já Jimmy Connors esteve de passagem pelo Brasil quando estava a caminho de um torneio que seria realizado na Argentina e quis conhecer de perto o clube de que tanto ouvia falar. Em 1987, em um dos grandes momentos, a entidade sediou a tradicionalíssima Copa Davis e, desde então, o Harmonia não para de receber grandes nomes em suas quadras.

OS TENISTAS

Quando falamos da Sociedade Harmonia de Tênis não podemos deixar de lado a história de alguns dos tenistas jogaram lá e que ganharam homenagem do Grand Champions. Alcides Procópio, por exemplo, começou sua carreira no clube. Enquanto seu pai cuidava de sua cantina no clube, Alcides passava o dia esperando algum jogador descansar para pedir emprestado seu equipamento e jogar um pouco. Aprendeu sem nenhum treinador, apenas olhando.

Pouco depois, passou a se dedicar totalmente ao esporte, começou a ganhar campeonatos e virou o orgulho da casa. Vencendo cada vez mais torneios, foi jogar fora do Brasil pouco antes da II Guerra, mas a viagem que devia durar cinco anos, acabou em seis meses. De volta ao Brasil, só entrou em quadra novamente em 45. Fora das quadras também teve bastante destaque, tanto em sua atuação na criação da CBT e do Banana Bowl quanto na presidência da Federação Paulista de Tênis. Outro jogador que começou no tênis meio que "por acaso" foi Sylvio Boock. Até os 20 anos, nunca havia pegado numa raquete.

Assim que iniciou sua carreira, conquistou seu primeiro título e não parou mais de ganhar. Tirando o hiato entre 1933 e 1936, período em que se formou em medicina, Boock era tênis de corpo e alma. Fez do Harmonia sua casa de 1938 até o fim de sua vida, foi o jogador brasileiro com os melhores resultados em cima de estrangeiros que vinham jogar aqui e, após muitas conquistas, foi considerado o melhor tenista paulista.

Na mesma época de Boock e Procópio, florescia Maneco Fernandes, um jovem que, durante três anos, foi pegador de bolas no Paulistano e que ganhou seu primeiro campeonato adulto aos 16 anos, no Harmonia. Maneco ganhou de gente muito importante, mas, assim como Procópio, deu azar de ser da geração da II Guerra Mundial e não conseguiu mostrar ao mundo seu talento.

Por fim, Marcos Hocevar, gaúcho que já foi top 30 na década de 1980, conhecido por seu jeito sereno e que atualmente é técnico do Instituto Gaúcho de Tênis (IGT), é um dos grandes que também atuaram nas quadras do clube.

Carolina Almeida

Publicado em 17 de Junho de 2011 às 07:17


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Artigo publicado nesta revista