Copa Petrobras

Diferentes melodias

O clube Harmonia - que recebeu a última etapa da Copa Petrobras 2010 - viveu uma semana em que se ouviu diversas composições de uma mesma ópera


"PEGOU MAL O QUE O BELLUCCI DISSE, NÉ?", indagou um jovem tenista, percebendo o clima estranho que cercava jornalistas e técnicos antes mesmo de a etapa de São Paulo da Copa Petrobras começar. Na sexta-feira anterior ao início do quali, Thomaz Bellucci, sempre comedido nas palavras, havia soltado uma frase em que sugeria que não havia tantos técnicos brasileiros de alto nível e que faltava envolvimento dos ex-jogadores no tênis. Segundos depois, a balbúrdia estava instalada com gente rebatendo suas palavras de todos os cantos do Brasil. De bom moço, de repente, Bellucci passou a vilão.

Para piorar a situação, no dia seguinte, outra bomba. João Zwetsch não era mais seu técnico. Segundo o próprio tenista, o motivo seria um desgaste na relação. Tamanha reviravolta na carreira do principal tenista brasileiro da atualidade chamou a atenção para o torneio. Diante de tantas críticas e suspeitas, que resposta Bellucci daria? O clube Harmonia se tornou, assim, palco de composições desajustadas, nada harmônicas, mas, que, no fim, como sempre, ainda chegaram a um nal apoteótico para um dos envolvidos. Sendo assim, detalhamos os quatro diferentes atos que acabaram compondo esta ópera.

I ato
MANON LESCAUT DE BELLUCCI

divulgação Copa Petrobras

Depois de uma declaração pouco feliz antes de o torneio começar, Thomaz Bellucci voltou ao seu pouco falar durante a Copa Petrobras. Depois das derrotas recentes, especialmente na Copa Davis, seu mundo pareceu ruir. Logo não estava mais trabalhando com o competente João Zwetsch. Logo, seu apogeu estaria comprometido? Solo, perduto, abbandonato? Da glória ao ostracismo, como na Manon Lescaut de Giacomo Puccini?

Sujeito a todas as críticas, que alguns jornalistas, técnicos e ex-jogadores - todos melindrados com o comportamento do jovem - fizeram questão de apontar, Bellucci, como sempre, devia responder em quadra. E o script lhe era todo favorável. As vitórias denunciavam um final apoteótico - sem técnico, absolutamente sozinho, ele reencontraria o caminho e a glória, calando a todos.

Mas, como em toda ópera, não há final sem drama. Sua composição vacilou no final, dando a oportunidade a que outras melodias, mais harmônicas, invadissem o torneio. Vencido, Bellucci, como todo grande compositor, busca um regente para dar vida às suas obras mais importantes e, ao que tudo indica, esse maestro seria o maior de todos no Brasil. Somente um perfeccionista e mão de ferro Herbert von Karajan daria forma aos seus acordes ainda dessincronizados.

Atração principal do torneio, Bellucci chamou ainda mais a atenção
depois de declarações fortes e I ato rompimento com técnico

#Q#

II ato
BACHIANAS ALAGOANAS

Depois de Bellucci, o nome mais comentado nos bastidores do tênis neste último ano é o de Tiago Fernandes. O jovem alagoano, de apenas 17 anos, vive - desde que venceu o Australian Open juvenil - sempre procurado, observado, pela mídia nacional. Seu tênis, ainda um pouco barroco, esconde-se às vezes num rebuscamento exacerbado. Seu regente, contudo, vai lapidando sua música, que mistura o primor clássico com o toque típico nacional. Com golpes plásticos, mas ainda um pouco erráticos, sua composição vai tomando forma e vislumbrando cenários ainda mais promissores.

Muito se esperava de Tiago Fernandes, mas foi Christian Lindell
o jovem que se destacou em São Paulo

III ato
SUPER TROUPER LINDELL

fotos: divulgação Copa Petrobras

De uma hora para outra, o clube Harmonia, que estava encantado com a performance do principal compositor do torneio, Bellucci, viu-se tomado por uma onda de swing, uma mistura de rock com Bossa Nova, algo a que os ouvidos da comedida plateia não estavam acostumados.

O nome, sueco. Christian Lindell. O sotaque, carioca. O rapaz de 18 anos, alto e competente com a raquete, é filho de pai sueco e joga pela Suécia, apesar de ter sido criado e treinar no Brasil. "É pelas facilidades que há lá, pelo que me oferecem", garante. Sem jogadores de alto nível atualmente, os suecos querem adotar o garoto, como adotaram a rainha Sílvia.

Em São Paulo, seu gingado carioca e seu jogo potente, com alguma inspiração nórdica, surpreenderam. O rapaz foi à semifinal e quase engatou um novo hit, a lá Dancing Queen, no classicismo que imperava no torneio.

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IV ato
O BOLERO DE MARCOS DANIEL

O que esperar de um tenista de 32 anos? Que ele pense na aposentadoria seria o mais natural... O gaúcho Marcos Daniel, porém, vive se reinventando. Ele - que atingiu o ápice de sua carreira no ano passado, entrando entre os 60 primeiros do mundo - parece sempre estar prestes a terminar sua jornada no tênis. A cada ano, um problema, mais ou menos sério, atrapalha sua caminhada. Antes de chegar a São Paulo, ele tinha saído do top 150. Era o prenúncio do m?

Daniel, todavia, é como uma melodia uniforme e repetitiva, como o Bolero de Maurice Ravel. Sempre no mesmo ritmo, na mesma cadência, porém alternando entre tons mais altos e outros mais graves, seu jogo experiente parece de cartas marcadas, mas, diante de adversários menos tarimbados, sobressai-se.

Quem viu o gaúcho nos primeiros dias percebeu que nesta semana os tons estavam altos, a esquerda de uma mão afiada com golpes na paralela, o saque bem encaixado e a paciência de quem tem 32 anos e uma família para cuidar. Foi na companhia do filho e da esposa que a sinfonia regular de Daniel suplantou os arroubos apoteóticos dos adversários mais jovens, incluindo a voluptuosa, porém, inacabada peça apresentada por Bellucci. Venceu a dinâmica simples e compassada.

 

RESULTADOS
Semifinais Marcos Daniel (BRA) v. Nicolas Devilver (FRA) 6/4 e 7/5 Thomaz Bellucci (BRA) v. Christian Lindell (SWE) 4/6, 6/3 e 6/3
Final Marcos Daniel (BRA) v. Thomaz Bellucci (BRA) 6/1, 3/6 e 6/3
Arnaldo Grizzo

Publicado em 18 de Novembro de 2010 às 08:43


Torneio

Artigo publicado nesta revista