Um passeio em Bauru

Com Pablo Cuevas, já seria difícil para o Uruguai. Sem, ficou praticamente impossível. E os brasileiros souberam garantir o favoritismo com um implacável 5 a 0 na calorosa Bauru


O que significa para uma cidade grande sediar um evento da Copa Davis? Muito. O que significa para uma cidade pequena? Muito mais. Quem é natural de municípios menores do interior do Brasil sabe o significado de um "acontecimento". E foi isso o que ocorreu em Bauru no primeiro fim de semana de maio, no confronto entre Brasil e Uruguai.

fotos: Marcelo Ruschel/poapress

A cidade estava em festa e o evento reuniu fãs de tênis de toda a região. O resultado: Brasil 5 a 0 contra um Uruguai que, se já não era um adversário muito forte, ainda estava desfalcado de seu principal atleta, Pablo Cuevas, top 50, que preferiu não ir a Bauru para jogar o ATP de Estoril. O time do capitão estreante, João Zwetsch - também técnico de Thomaz Bellucci, principal nome da equipe -, passeou pelo interior paulista, fazendo a alegria da multidão que esgotou a lotação das arquibancadas - sobraram apenas lugares mais caros em cadeiras numeradas e camarotes.

A vitória fez com que o Brasil se classificasse novamente (pela quinta vez seguida) para o play-off do Grupo Mundial. Nossos próximos adversários serão os indianos - time que enfrentamos apenas duas vezes em toda a história secular (desde 1900) da competição entre nações, com uma vitória e uma derrota para cada nação.

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fotos: Marcelo Ruschel/Poapress

1. Duelo foi tão tranquilo que Marcos Daniel bateu bola com seu filhinho, Davi, na quadra central

2. Melo e Soares tiveram trabalho... com a chuva

3. Tenistas bauruenses foram homenageados: Cláudia Faillace, Roberto Cardoso, Edvaldo Oliveira e Júlio Góes

4. Daniel não deu chances para Felder

Um passeio

O confronto com o Uruguai prometia ser um pouco tenso caso Pablo Cuevas atuasse. Contudo, assim que foi anunciada sua desistência, toda a comissão uruguaia já dava o confronto como perdido, apesar de não admitir publicamente. O time brasileiro, por sua, vez também sabia que o duelo estava ganho e obviamente também não admitiu.

Com Bellucci e Marcos Daniel e os duplistas Bruno Soares e Marcelo Melo, todos atuando em nível ATP, não havia a mínima chance para Marcel Felder, Martin Cuevas (de 18 anos, irmão mais novo de Pablo) e Ariel Behar, que vêm jogando Futures. Além dos três e de Pablo Cuevas, o Uruguai só tem mais um tenista ranqueado, Frederico Sansonetti.

Sem grandes receios da equipe uruguaia, os treinos durante a semana foram sérios, mas descontraídos, com acesso do sedento público interiorano, que tinha a oportunidade de pegar autógrafos e tirar fotos com seus ídolos. Na sexta-feira, primeiro dia de jogos, Guga chegou para acompanhar a equipe. Sua presença causou furor nas arquibancadas da grande arena montada sobre o campo de futebol do Bauru Tênis Clube.

Daniel logo atropelou Felder. O jogo foi tão tranquilo que, ao final, Davi, filho do tenista gaúcho, entrou em quadra para bater uma bolinha com o pai coruja. Em seguida, Bellucci despachou Cuevas em ritmo de treino. Foi tão fácil que muitos desavisados ainda perguntaram: "O Guga vai jogar?", esquecendo que o catarinense está aposentado.

O sábado amanheceu chuvoso. O tempo fechado parecia que adiaria a partida de duplas, mas o jogo ocorreu mesmo com a garoa insistente. Quando as gotas ficavam mais fortes, ocorria uma breve interrupção. Nada, porém, impediu novo passeio brasileiro. Melo e Soares então sacramentaram a vitória. No domingo de festa, ainda com boa plateia apesar de os jogos não valerem mais nada, Zwetsch colocou Bellucci para "mais um treino" e o número um do Brasil bateu Felder. Na partida derradeira, Melo, mesmo sem o costume de atuar em simples ultimamente, jogou contra Cuevas e venceu, no que - pasmem - foi considerado o jogo mais emocionante do duelo. Enfim, o passeio em Bauru foi rápido e agradável.

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Índia x Brasil

Em setembro (17 a 19), o Brasil enfrenta a Índia pelo play-off do Grupo Mundial. Quem vencer vai para a elite da Copa Davis. O confronto provavelmente será jogado no R.K. Khanna Tennis Stadium, de Nova Deli, um estádio com capacidade para 5 mil pessoas, em quadra de grama, uma superfície pouco familiar para os brasileiros. Nos últimos cinco anos, os indianos jogaram seis vezes lá, levando a melhor em cinco oportunidades. O revés foi contra a Suécia. As vitórias foram contra times sem grande expressão no tênis, como China, Uzbequistão e Paquistão, por exemplo. Isso, contudo, não significa que será um confronto fácil.

O time da Índia tem uma dupla fortíssima com os veteranos Leander Paes e Mahesh Bhupathi. Apesar de terem brigado anos atrás, eles ainda continuam jogando duplas pelo país e formam uma parceria quase invencível na Davis, com 24 vitórias e apenas duas derrotas. Os dois singlistas são Somdev Devvarman, ex-tenista universitário que vem ganhando destaque nos últimos dois anos (com salto de mais de mil posições no ranking) e Rohan Bopanna. Outros dois ainda costumam estar nas convocações do capitão Shiv-Prakash Misra: Prakash Amritraj e Yuki Bhambri, ex-número um juvenil em 2009.

O Brasil jogou duas vezes contra a Índia nos 110 anos de história da Davis. A primeira foi em 1966, na decisão do Inter-Zonal.

O vencedor do Inter-Zonal disputava a final contra o país campeão do ano anterior. Naquele confronto, o Brasil de Tomas Koch e Edison Mandarino - que havia vencido os poderosos norte-americanos - jogou contra o time formado por Jaidip Mukerjea e o lendário Ramanathan Krishnan - o maior jogador da Índia em todos os tempos, que venceu Koch no quinto e decisivo jogo.

Quase 30 anos depois, em 1991, o Brasil recebeu a Índia em casa pelo play-off do Grupo Mundial e arrasou no saibro do clube Pinheiros, em São Paulo, por 4 a 1. Nosso time era formado por Jaime Oncins, Luiz Mattar e os duplistas Nelson Aerts e Fernando Roese. Os indianos tinham Leander Paes, ainda muito jovem, e Ramesh Krishnan, filho de Ramanathan, que também foi um grande tenista, mas seu auge já tinha passado naquela época.

Apesar de atuar fora de casa e provavelmente em um piso pouco amigável, o sorteio foi bom para o Brasil, pois escapamos de potências como Suíça, Estados Unidos e Suécia; e temos, sim, chance de ganhar. Bellucci tem condições de vencer seus dois jogos e qualquer um dos candidatos a número 2 do Brasil (Marcos Daniel, Ricardo Mello, Thiago Alves ou João Souza) também. A dupla tem poucas chances, mas não se pode desprezar Bruno Soares e Marcelo Melo.

fotos: Marcelo Ruschel/Poapress
Guga também esteve na torcida pelo time brasileiro

RESULTADOS

Marcos Daniel (BRA) v. Macel Felder (URU) 6/4, 6/1 e 6/1
Thomas Bellucci (BRA) v. Martin Cuevas (URU) 6/4, 6/3 e 6/2
Marcelo Melo e Bruno Soares (BRA) v. Ariel Behar e Marcel Felder (URU) 6/3, 6/2 e 7/6(4)
Thomas Bellucci (BRA) v. Marcel Felder (URU) 6/4 e 6/1
Marcelo Melo (BRA) v. Martin Cuevas (URU) 6/7(5), 6/2 e 7/5

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Bauruenses se empolgam com Davis

Desde que foi anunciada a sede do confronto entre Brasil e Uruguai, Bauru, no interior de São Paulo, ficou em polvorosa. Não só a cidade, mas toda a região. A procura por ingressos foi grande, a atenção da mídia (um dos principais jornais da cidade foi um dos apoiadores) foi intensa e o resultado acabou sendo um belo evento.

O desfecho do confronto parece ter sido o que menos importou para os cidadãos. O time brasileiro cumpriu seu papel com superioridade, mas o que surpreendeu foi a maneira como a cidade acolheu o duelo. A partir do dia 19 de março, Bauru passou a viver a Davis. Em seus 113 anos de história, conquistava pela primeira vez o direito de abrigar uma etapa do evento. "Para Bauru, a Davis ser disputada na cidade seria 'o evento', e não apenas mais um", comentou o prefeito, Rodrigo Agostinho, que nas horas vagas se arrisca como tenista.

Por cerca de um mês, a cidade respirou tênis. Vários outdoors foram espalhados com motivos da Davis. Diversas placas mostravam o caminho para se chegar ao clube e até uma rotatória foi reformada e enfeitada em forma de uma bola de tênis. "A cidade está de parabéns pela vontade e comprometimento demonstrados para realizar esse evento. Estamos trabalhando para ser um grande espetáculo", enfatizou o diretor administrativo e de marketing do jornal patrocinador do torneio, Renato Zaiden.

Uma semana antes do duelo começar, as equipes chegaram à cidade. Os treinos eram abertos ao público, então várias pessoas vinham ao Bauru Tênis Clube para tirar uma foto ou pegar um autógrafo. "É legal esse clima, acho bacana a garotada me ver como um ídolo. Fazer uma Copa Davis no interior é bem legal e, como a cidade não é tão grande, a atração fica ainda maior", disse Bellucci, natural de Tietê, também no interior do estado.

No fim de semana, o que se viu em quadra foi um massacre do Brasil sobre os uruguaios. "Adorei o evento. Felizmente o Brasil fechou o confronto ontem, mas o jogo do Melo hoje foi muito emocionante. Ele jogou muito, tanto hoje quanto ontem nas duplas", relatou o advogado bauruense Gustavo Guedes, de 26 anos.

Ao final, o clima era de festa no BTC. A estrutura foi muito elogiada, porém com algumas ressalvas. "Achei muito bom o evento, mas pecou um pouco na parte da organização, na entrada, na hora de pegar água, principalmente na sexta-feira. Mas são coisas que o pessoal daqui vai aprendendo e no sábado tudo isso foi solucionado. Em geral, o saldo foi bem positivo", relatou a universitária Thatianna e Oliveira, de 19 anos. "Acho que Bauru tem chances de sediar um novo confronto de Copa Davis pela infraestrutura e o empenho que foi mostrado", finalizou o professor universitário, José Roberto Laures, de 52 anos.

Por Matheus Martins Fontes

Arnaldo Grizzo

Publicado em 17 de Maio de 2010 às 12:30


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Artigo publicado nesta revista