Três, o número perfeito

Sem dificuldades, Rafael Nadal e Justine Henin levaram o tricampeonato seguido em Roland Garros


Ron Angle/TPLPARA A NUMEROLOGIA, teologia e outras ciências, o três é considerado um número perfeito. Simboliza, no cristianismo, a trindade, ou seja, Pai, Filho e Espírito Santo. Seria a união entre a mente, o corpo e o espírito. Os três pontos, que no plano servem para formar a figura primordial de um triângulo, representariam a junção de passado, presente e futuro. Porém, ciências místicas à parte, o três significa, no tênis, que o saibro de Roland Garros possui donos incontestáveis.

Pelo terceiro ano seguido, o espanhol Rafael Nadal e a belga Justine Henin ditaram as regras do esporte sobre terra batida. Com mais esse título, o “touro” se tornou o mais jovem tricampeão em Paris. O garoto de 21 anos nunca perdeu jogando no Grand Slam francês, ao todo são 21 vitórias seguidas. Com isso, ele se equipara ao sueco Bjorn Borg, último a vencer o torneio consecutivamente por três anos. Ele ainda iguala a marca dos tricampeões Mats Wilander, Ivan Lendl e Gustavo Kuerten, de quem Nadal recebeu o troféu na final.

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Ron Angle/TPL

Ron Angle/TPLSe o espanhol impressiona em Roland Garros, o que dizer da “pequena notável’? Henin já soma quatro títulos em Paris. Com seu terceiro consecutivo (o primeiro foi em 2003), ela repete o feito de Monica Seles, que ganhou de 1990 a 92. A superioridade da belga no saibro é tamanha que há mais de dois anos ela não perde um set sequer na competição. Henin se tornou apenas a quinta tenista desde 1925, quando começou o torneio, a conquistá-lo pelo menos quatro vezes. Na lista estão Chris Evert, com sete, Steffi Graf, com seis, Margareth Smith Court, com cinco, e Helen Wills Moody, também com quatro.

Apesar de o enredo e os protagonistas de Roland Garros 2007 terem sido uma repetição dos últimos três anos, os coadjuvantes se renovam aos poucos. A final feminina trouxe o ar jovial e o sorriso fácil da sérvia Ana Ivanovic, mais uma beldade para se ficar de olho. Entre os homens as coisas parecem que demorarão um pouco mais para mudar já que Federer e Nadal, Nadal e Federer fazem esse jogo de gato e rato há tempos.

Ron Angle/TPLDOIS E UM
Já que tratamos de números, a decisão masculina ficou entre um e o dois mais uma vez. Se o primeiro numeral representa a divindade, a liderança, o singular, algo inatingível, o segundo é a criatura, a junção entre corpo e alma, essência e existência, é o conflito. E mais uma vez esta oposição se provou a tônica entre os homens. No fim, nem mesmo o “divino” conseguiu quebrar a (im)perfeição do “humano”. O antagonismo inerente de Nadal, que ataca ao mesmo tempo em que defende, tirou Federer de sua apoteose e o trouxe ao chão, ou melhor, ao saibro.

#Q#

Depois que o suíço venceu o espanhol na final do Masters Series de Hamburgo, acreditava-se que ele teria chance de completar os quatro Grand Slams e dar mais um passo rumo ao título de melhor tenista da história. Esse termo, aliás, foi usado por Guga ao elogiar o suíço na premiação. A federação francesa de tênis prestou uma homenagem aos dez anos da primeira conquista do brasileiro e convidou-o para entregar a taça ao campeão do torneio. Kuerten cumprimentou os dois tenistas que definiu, arranhando o francês, como: “o melhor jogador de saibro e o melhor de todos os tempos”.

fotos: Ron Angle/TPLNadal, que fez uma campanha devastadora, voltou a mostrar ao “deus” que, em seu campo, é ele quem dita as regras. Federer teve chances, principalmente no primeiro set, quando não converteu nenhum dos dez break points que alcançou (no total foram 17 e apenas uma quebra na partida). Contudo, na “terra”, as qualidades deíficas do suíço perderam poder e ele se tornou falível, como qualquer um. Tanto que deu 60 pontos de graça para o espanhol. Por fim, prevaleceu a força mental e física de Nadal mais uma vez.

Entretanto, novos e velhos players tomaram parte deste jogo. O russo Nikolay Davydenko se mostra cada vez mais constante, tanto nos golpes quanto nos resultados, e deu algum trabalho para Federer na semifinal. O jovem sérvio Novak Djokovic também atingiu este estágio, mas, apesar de possuir a combinação explosiva entre talento e potência, faltou maturidade diante de Nadal. Além deles, se destacaram, alcançando as quartas, o argentino Guillermo Cañas, provando que pode jogar de igual para igual com qualquer um, e Carlos Moyá, que mesmo aos 30 anos ainda tem motivação e tênis de sobra.

fotos: Ron Angle/TPLUM RISO TRÊMULO
Entre as mulheres, um rol de jovens beldades desfilou pelas últimas rodadas de Roland Garros, com maior evidência para Ivanovic. A moreninha, de 19 anos e sorriso espontâneo, não conquistou o título, mas seduziu o público com seu jeito meigo. Na final, diante da tarimbada Henin, a menina ficou tão nervosa – parecia uma criança em seu primeiro torneio – que nem mesmo conseguia acertar o toss.

A despeito desta tremida na final, os sérvios devem estar satisfeitos com seus tenistas, pois mais uma representante do país foi à semifinal na França. Jelena Jankovic eliminou a bela tcheca Nicole Vaidisova nas quartas, mas não fez frente a Henin na semifinal. Os poderosos golpes da norte-americana Serena Williams, campeã do Australian Open, também sucumbiram à habilidade da belga nas quartas. A musa russa Maria Sharapova, por sua vez, chegou à semi, porém perdeu para uma inspirada Ivanovic. Os russos ainda tiveram mais duas tenistas nas quartas, Anna Chakvetadze e Svetlana Kuznetsova.

fotos: Ron Angle/TPLO Brasil, por sorte, contou um representante na chave principal, o gaúcho Marcos Daniel, que heroicamente passou o qualifying, mas lesionou-se na estréia. O único alento nacional foi ver o garoto Fernando Romboli chegar às quartas entre os juvenis.

Por fim, como estávamos falando sobre números, se Federer resolver dar valor à ciência pitagórica, pode sonhar em conquistar Roland Garros, pois o número três, além de tudo o que já foi dito, representa o encerramento de um ciclo. Mas, pensando bem, nem ele, nem Nadal devem ligar para isso, porque para eles os números servem apenas para serem somados e, no final, quem tiver mais fica com o um. É só isso o que importa.

fotos: Ron Angle/TPLRESULTADOS:
Simples
Rafael Nadal (ESP) v. Roger Federer (SUI) 6/3, 4/6, 6/3 e 6/4
Justine Henin (BEL) v. Ana Ivanovic (SRB) 6/1 e 6/2 Duplas
Mark Kwnoles (BAH) e Daniel Nestor (CAN) v.
Lucas Dlouhy e Pavel Vizner (CZE) 2/6, 6/3 e 6/4
Alicia Molik (AUS) e Mara Santangelo (ITA) v.
Katarina Srebotnik (SLO) e Ai Sugiyama (JPN) 7/6(5) e 6/4
Nathalie Dechy (FRA) e Andy Ram (ISR) v.
Katarina Srebotnik (SLO) e Nenad Zimonjic (SRB) 7/5 e 6/3 Juvenis
Vladimir Ignatic (BLR) v. Greg Jones (AUS) 6/3 e 6/4
Alize Cornet (FRA) v. Mariana Duque Marino (COL) 4/6, 6/1 e 6/0
Thomas Fabbiano (ITA) e Andrei Karatchenia (BLR) v.
Kellen Damico (USA) e Jonathan Eysseric (FRA) 6/4 e 6/0
Ksenia Milevskaya (BLR) e Ursula Radawanska (POL) v.
Sorana Cirstea (ROU) e Alexa Glatch (USA) 6/1 e 6/4

Arnaldo Grizzo

Publicado em 25 de Junho de 2007 às 15:34


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Artigo publicado nesta revista