Instrução Mental

Quebrando o gelo

Aprenda com um dos fatores mais humanos do jogo: o erro


A TEMPORADA ESPORTIVA DO inverno europeu trouxe novas atrações para a televisão brasileira – disputando palmo a palmo o pouco espaço disponível para os esportes que não são disputados por dois times de onze jogadores correndo atrás da bola num campo gramado.

Quem já ouviu falar em curling? O apelo de marketing deste esporte é ter beldades deslizando no gelo, tentando colocar um disco dentro do alvo com o patrocinador estampado bem no meio. Fazendo uma análise puramente esportiva, as habilidades de deslizar e rebater um objeto com um bastão na direção de um alvo específico pode ter algo a ver com o tênis sim, mas com infinitamente menos complexidade e emoção.

Patinar no gelo executando coreografias com um parceiro ou parceira envolve também muito equilíbrio nos deslizes – equilíbrio dinâmico –, mas não envolve o rebater e a rotina de exercícios é sempre a mesma dentro da coreografia. Os atletas praticam exaustivamente a combinação de movimentos para que não aconteçam erros no dia da apresentação. A perfeição de execução é a meta, treino após treino. Sem surpresas: o ambiente e a música são sempre os mesmos e não há o adversário direto.

Visar à perfeição, enfrentar erros, deslizar com maestria, tudo isso acontece na temporada de saibro do tênis profissional que se inicia logo mais. Os tenistas se preparam para deslizar muito, para embates mais longos, para testar os próprios nervos e a inteligência tática. Todas as variáveis que envolvem o jogo de tênis estarão lá: pisos mais ou menos regulares, mais ou menos pesados, com mais ou menos vento, adversários mais ou menos pacientes, que usam mais ou menos slice, e cada tenista com suas ferramentas procurará vencer todos os desafios que se apresentam, a cada dia, diferentes.

Se houvesse robôs capazes de realizar coreografias programadas ou de rebater discos deslizantes no gelo, pode ser que o curling e a patinação artística não perdessem muito em termos de performance. Mas a graça está justamente em torcer pelos erros e “não-erros”: queremos ver como os seres humanos “de carne e osso” reagem diante das suas próprias dificuldades. Como reagem diante do desequilíbrio, do erro, diante da bola ou do disco que passaram raspando na linha. Como dominam a frustração e o medo.

Voltando sempre ao ensino do tênis e das primeiras experiências competitivas de crianças e jovens, é preciso que os pais deixem que seus filhos participem e errem bastante, que entendam que os erros fazem parte e que não há nada como um ponto após o outro. Sem a prática e a participação, não acontecem os erros nem os acertos, o caráter não é fortalecido, e podemos perder a oportunidade de formar jovens preparados para lidar com as frustrações no tênis e na vida.

Deixe seu filho jogar. Nosso desafio, enquanto pais e educadores que trabalham com crianças e jovens nas quadras de tênis, é observar carinhosamente, interferindo o menos possível no processo de aprendizagem emocional que pertence única e exclusivamente a cada ser humano. Sendo bons ouvintes e companheiros presentes, podemos fortalecer a autoestima dos jovens e prepará-los para os desafios que estão por vir.

Por Suzana Silva

Publicado em 13 de Abril de 2014 às 00:00


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Artigo publicado nesta revista

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