Boom Silencioso

O tênis está crescendo nos Estados Unidos, mas este é o tipo de crescimento de que eles precisam?


QUANDO DREW, filho de Rick e Wendie Harris, tinha idade suficiente para praticar esportes, seus pais o colocaram para fazer futebol, beisebol, basquete e tênis. Rick tinha jogado tênis quando criança na Flórida, mas cansou do esporte quando era adolescente e não voltou a pegar na raquete até que Drew tivesse começado. Porém, ele se apaixonou novamente pelo esporte nesta segunda vez e achou que seria sensacional dividir isso com seu filho. Drew, contudo, tinha outra ideia.

"Ele gostava de bater a bola sobre o alambrado", diz Rick. Por outro lado, Drew preferia basquete e beisebol. Foi assim até que Craig Jones - proprietário do Petersburg Racquet Club em Martinez, no estado da Geórgia, onde a família Harris vive - introduziu Drew a uma bola maior de espuma quando o garoto tinha oito anos. Jones foi um pioneiro no que a Associação Norteamericana de Tênis (USTA) agora chama de QuickStart (começo rápido), um programa nacional que usa raquetes e quadras menores, redes mais baixas e bolas mais macias e de quique mais baixo para tornar o aprendizado mais fácil. Isso funcionou com Drew. "Até aquele momento, ele poderia ir para o tênis ou deixálo. Desde então, tem sido incrível", diz Rick.

Drew pôde trocar bolas imediatamente, algo que não conseguia antes. Agora, aos 12 anos, ele deixou os outros esportes para optar pelo tênis, assim como ele transferiu sua devoção para sua irmã de nove anos, Avery. Ambos disputam torneios. Drew joga de duas a cinco vezes por semana com bolas e raquetes normais e marca seus próprios jogos depois da escola.

A família Harris é parte do que a USTA chama de segundo boom do tênis. No ano passado, 30,1 milhões de pessoas nos Estados Unidos estiveram em quadra, o maior número desde que a USTA e a Associação das Indústrias de Tênis começaram essa pesquisa de participação, que é conduzida por telefone, em 1988 (a melhor marca anterior havia sido 27,2 milhões em 1992). Esta foi a primeira vez que a participação de tenistas ultrapassou a linha dos 30 milhões desde o boom original, que começou na década de 1970 e atingiu a melhor marca de todos os tempos com 34 milhões, medida por Nielsen, em 1974. No ano passado, o Conselho de Atividade Física chamou o tênis de esporte tradicional de maior crescimento nos Estados Unidos, com um acréscimo de 43% de participação de 2000 a 2009.

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Fotos: Divulgação

"O primeiro boom no tênis pareceu acontecer do dia para a noite. Este boom tem sido manufaturado e não é resultado de uma tendência social ou evento", afirma Kurt Kamperman, executivo da USTA. Ele vê os ganhos recentes como resultado de 15 anos de trabalho para promover o tênis em parques públicos, comunidades e escolas, e no desenvolvimento de ligas e torneios - alternativas divertidas para aulas - para adultos e crianças.

ESSE É O BOOM QUE ELES QUEREM?
Tudo é uma boa notícia. Agora alguns detalhes perturbadores. Se isso é realmente um boom, pode não ser do tipo que os Estados Unidos precisa ter para desenvolver profissionais top e criar mais interesse em torno do esporte. O que a USTA precisa, mais do que tudo, são pessoas que joguem tênis por muito tempo e especialmente crianças, como Drew e Avery Harris, que escolhem o tênis em detrimento a outros esportes e que o jogarão por muito tempo ainda. Contudo, obstinados ou famílias como os Harris são minoria no Boom II. A pesquisa da USTA mostra que muitos dos tenistas hoje são casuais e não fanáticos, e menos ainda são juvenis competitivos.

Segundo pesquisa, mais de 31 milhões de pessoas praticam tênis nos EUA

Em essência, o tênis se tornou um hobby para muitas pessoas, mas uma obsessão para uma pequena porcentagem delas. O grupo mais cobiçado de jogadores da USTA, aqueles que jogam pelo menos 21 vezes por ano, encolheu em 200 mil, de 5,6 para 5,4 milhões em 2009. Isso, em conjunto com a economia em queda, reduziu o tráfego nas quadras do país. As pessoas jogaram tênis 563 milhões de vezes no ano passado, abaixo das 603 milhões de 2008.

Essa queda prejudica os revendedores, que já estavam esperando um ano difícil pela recessão. Depois de ganhos substanciais de 2003 a 2007, as vendas de raquetes se estabilizaram e então declinaram para 4 milhões vendidas em 2009, uma queda de 500 mil em relação a 2008. A venda de bolas, tipicamente uma barômetro da saúde do esporte, caíram também: os fabricantes venderam 129 milhões de bolas em 2009, abaixo dos 132 milhões de 2008. O número de raquetes vendidas está 9,3% abaixo de 1992, quando havia cerca de 3 milhões a menos de praticantes do que hoje, enquanto o número de bolas vendidas está 6,8% abaixo.

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BUSCA PELAS CRIANÇAS
A saúde do tênis juvenil permanece a grande preocupação. A USTA estima que haja 200 mil juvenis competitivos em uma nação de 309 milhões de pessoas. A França, cuja população é de 62 milhões, tem 483 mil juvenis competitivos. Se quiser equivaler com a França, o número de jovens precisaria saltar para 2,4 milhões. Mas isso requereria que a USTA superasse um complicado obstáculo cultural: os franceses têm afinidade com o tênis, enquanto que os norte-americanos preferem beisebol, basquete e futebol americano.

No entanto, isso não significa que um esporte não tradicional não possa se dar bem nos Estados Unidos. O sucesso do futebol pode ajudar a mostrar para a USTA o esquema para o crescimento entre as crianças. O futebol ainda está longe de alcançar o tênis por lá em termos de popularidade entre crianças (9,6 milhões de garotos jogam tênis, comparado com 3,2 milhões que jogam futebol). Mas, devido ao envolvimento dos pais, às organizações de fomento e a facilidade de se jogar, 85% dos jogadores de futebol registrados no país são crianças (de acordo com uma associação de futebol local), versus 32% no tênis. "Temos que ter mais crianças abaixo de 10 anos. Ainda não deciframos o código", diz Kamperman.

A USTA quer que mais crianças optem pelo tênis e permaneçam jogando

MUDANÇA DE CURSO
A USTA é uma organização sem fins lucrativos com uma meta: tornar o tênis maior. Internamente, a questão sempre tem sido: "qual a melhor forma de fazer isso?" A filosofia original pressionou a comunidade e o tênis juvenil, mas quando a organização contratou Arlen Kantarian, ex-executivo de marketing da liga de futebol americano, em 2000, a estratégia mudou.

Sob o comando dele, o tênis pro ssional recebeu mais atenção do que nunca e o US Open se beneficiou. O lucro do torneio passou os US$ 200 milhões por ano.

Isso aconteceu na era dos replays instantâneos e ela ganhou um parceiro televisivo de prestígio, a ESPN, para substituir o parceiro anterior de longa data, a USA Network. A USTA aumentou ainda seus associados e parceiros. Kantarian não ganhou fãs entre os tradicionalistas, porém ele sabia como fazer um show. Ele também tinha um preço. No último de seus nove anos com a organização, 2008, ele teve rendimentos de US$ 9 milhões, de acordo com o Sports Business Journal, uma quantia considerável para algo sem fins lucrativos, mas um preço que os executivos da USTA julgaram publicamente como "vale a pena".

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Vale a pena, mas não vale repetir. Kantarian saiu n fim de 2008 e o novo diretor executivo, Gordon Smith, devolveu a USTA para a filosofia baseada na comunidade. A organização está colocando mais recursos no QuickStart e no Jr. Team Tennis(programa de equipes juvenis), o que oferece às crianças competição e instrução em equipe (o grande aumento no orçamento foi ajustado para 2011, de acordo com Kamperman, mas ele não quis abrir os números exatos). Os times de tênis juvenil, que solicita que os pais ajudem com os treinos e funções de equipe, possuem uma simples e assustadora ambição: roubar crianças de outros esportes com organizações juvenis mais fortalecidas, como futebol, natação e beisebol. Isso tem estado ativo por sete anos, com crescimento limitado, de 3 a 4% ao ano.

MAIS E MAIS JOVENS

Fotos: Ron C. Angle / TPL

"Ainda não atingimos 100 mil crianças e isso é frustrante. Ainda temos que convencer as pessoas de que o tênis pode ser um esporte de equipe", conta Kamperman. A esperança é que o QuickStart, programa que começou em 2007, atraia mais e mais jovens crianças para os times juvenis, assim como conquistou Drew e Avery Harris. Um experimento da comunidade de North Carolina mostra que há esperança nesse tipo de approach. Esperança e grandes desafios.

Carla O'Connor vem de uma família de golfistas. Ela começou a jogar tênis por razões práticas: havia um belo clube de tênis com piscina na rua de sua casa, em Leawood, no estado do Kansas, assim que ela casou. Quando seus filhos começaram a jogar, ela se tornou voluntária em organizações locais. Hoje ela vive em Charlotte e é a diretora executiva da associação de tênis de lá. Equipes juvenis permanecem sua primeira e maior paixão no tênis.

Nos primeiros anos, o time juvenil de Charlotte tinha sua própria versão do QuickStart, que Carla e seus colegas chamavam de "bola de rali". Nesse formato, as crianças jogavam no quadradinho. "Encorajávamos o uso de bolas sem pressão", lembra Carla. Agora, com 12 anos, este é o maior programa de equipes juvenis no estado, com 1,600 crianças (Carla diz que a participação aumentou 12% de 2008 a 2009). A associação de Charlotte adicionou permanentemente as linhas do QuickStart em 16 quadras e tem planos para adicionar em mais. "Os parques locais apóiam o movimento QuickStart, assim como os profissionais de tênis", conta Carla. Todo ano, o programa de equipes acrescenta coisas novas para tornar mais atraente para as crianças. O último acréscimo? Uniformes da Nike entregues via acordo nacional com a USTA.

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"É assim que se vende. O programa de equipes juvenis sempre esteve no radar, mas não acho que as pessoas viam isso como o T-Ball (programa de desenvolvimento) é para o beisebol", diz Carla. Desde que a USTA passou a apoiar o QuickStart, "tudo tem sido mais consciente de cima para baixo, ao contrário de antes, quando tudo tinha que ser feito em nível local", segundo Carla. Mesmo assim, ela aponta o grande desafio que ela, seus dedicados voluntários e o departamento de parques ainda precisam superar. Na comunidade de lá, tênis ainda é tênis, um esporte visto como mais difícil, caro e exclusivo que outros. Retratá-lo como uma alternativa madura para o beisebol ou futebol leva tempo e consome energia. "Temos 7 mil jogadores adultos na liga de Charlotte. Não há razão pela qual não devêssemos ter mais tenistas juvenis que adultos", afirma Carla. É incerto se o QuickStart e as equipes juvenis são suficientes para alcançar aqueles números, ou algo mais deve ser feito.

O JOGO GLOBAL
Suponha que a USTA aumente participação, especialmente entre juvenis, e iguale ou passe aquele pico antigo de 34 milhões de jogadores. Suponha que muitos desses tenistas comecem mais cedo e passem a jogar partidas mais cedo, graças ao formato QuickStart. Isso garantiria um futuro brilhante para o esporte nos Estados Unidos, com uma indústria florescente e mais do que apenas alguns profissionais top lutando pelos principais títulos de torneios?

Não importa o que a USTA faça, pode ser que o tênis no país nunca pareça tão grande e nunca chame tanta atenção como no primeiro boom. Mais pessoas de outros países jogam mais do que antes. Depois do Australian Open, os tenistas top 10 eram cada um de uma nação. E, entre as mulheres, as 10 primeiras eram de sete países diferentes. Com tanta competição, os destaques para cada nação estão cada vez menores.

Quando sob o comando de Arlen Kantarian, foco da USTA
era no tênis profissional

Tudo isso leva a questão mais difícil de todas: "o boom de 1970 seria suficiente no mundo de hoje?" Poderiam os esforços da USTA inspirar um LeBrown James do tênis, que não apenas vence, mas chama a atenção da mídia e do público? Kamperman não finge saber a resposta, mas ele está certo de que a USTA não vai encontrar isso com um movimento na direção da juventude. "O que precisamos é ter crianças cada vez mais jovens jogando nos times e nos torneios, então quando precisarem escolher um esporte para se focarem, escolherão tênis". Essa escolha determinará se os Estados Unidos têm o início do boom do tênis da primeira década desse século. Ou algo assim.

Tom Perrotta

Publicado em 21 de Outubro de 2010 às 13:17


Coluna/Análise

Artigo publicado nesta revista

O novo tênis brasileiro

Revista TÊNIS 85 · Novembro/2010 · O novo tênis brasileiro