Agassi, um exemplo de como lidar com a imprensa

Ele nunca usaria a coletiva para criticar jornalistas, ao contrário de Meligeni


A DESPEDIDA DE ANDRE AGASSI em Nova York transformou o US Open num dos maiores torneios dos últimos anos. Senti vontade de chorar ao final da partida contra Benjamin Becker, mas o ofício jornalístico falou mais alto. Estava ao vivo para todo Brasil pela Rádio Jovem Pan, na abertura de Santos e Palmeiras, na Vila Belmiro. Minha voz tremeu, mas consegui relatar o fato histórico. Foi uma das cenas mais lindas que presenciei em mais de 20 anos no Circuito.

Na primeira rodada, duvidei que Agassi passaria por A ndrei Pavel. Ele venceu em quatro sets , com três tiebreaks. Após a partida, aproveitando a velocidade imbatível do rádio, demos com exclusividade a informação de que Agassi fora ao hospital tomar injeção de antiinflamatório. Jamais imaginei que pudesse derrotar Marcos Baghdatis na segunda rodada. E lá foi ele. Desta vez em cinco sets, com 7/5 no quinto, após três horas e 48 minutos de luta. O cara não é normal.

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No domingo, o clima era de despedida. Depois da chuva no sábado, o sol voltou a brilhar. Diferente dos primeiros jogos, este estava marcado para a sessão diurna. Desta vez os jornais teriam tempo de publicar no dia seguinte a entre vista de Agassi após a partida. E não deu outra. Agassi terminou a carreira contra um alemão, ex-tenista universitário, chamado B.Becker. Foi um roteiro perfeito.

Na última entrevista como tenista profissional, apenas duas perguntas brasileiras. Dácio Campos, comentarista do SporTV, perguntou se ele pensava em participar do ATP Senior Tour. Depois de muitos risos na platéia, Agassi foi muito simpático e resumiu que não pensava em voltar tão cedo. Na minha vez, perguntei da importância do primeiro título em Itaparica . Sua resposta foi manchete no Brasil. Ele disse que a premiação de 90 mil dólares o ajudou a pagar muitas contas e lhe deu tranqüilidade para jogar a próxima temporada. No final, perguntou aos jornalistas se iríamos sentir sua falta de verdade. Foi aplaudido de pé durante alguns minutos. André Agassi foi um profissional fora de série, um exemplo dentro e fora das quadras.

Seu respeito com os jornalistas deveria servir de exemplo para muitos brasileiros. Acompanhei de longe a Copa Davis em Belo Horizonte e li as críticas que Fernando Meligeni fez à imprensa ao final do confronto. Foi um barraco desnecessário. Fininho deveria aprender com as críticas. Não é preciso concordar com elas, mas respeitá-las.

Vejam o exemplo da dupla Guga/Larri. Depois de Roland Garros, em 1997, muitos tenistas, técnicos e comentaristas diziam nos bastidores que Larri era fraco. Ouvi até que a sua origem humilde seria um obstáculo para o sucesso de Guga. Na opinião de muitos, Guga deveria trocar de técnico. A pressão continuou nos próximos anos. Em 2000, finalmente, Guga explodiu. A dupla Guga/Larri respondeu às críticas na quadra, com títulos e trabalho sério. Este é o caminho.

Não adianta bater boca com a imprensa. Ainda mais no tênis, com uma cobertura tão pequena. Será que algumas críticas à equipe da Davis não foram merecidas? Será que entender de tênis é um privilégio de meia dúzia? Jornalista deve ter opinião. Jornalismo não é assessoria de imprensa. Foi a imprensa crítica, independente e investigativa que ajudou na transição da CBT. Naquela hora, todos procuraram a imprensa.

Este ano, no Nasdaq em Miami, um profissional do tênis feminino disse numa conversa que foi Carlos Alves quem fez o Guga. Com certeza, ele não sabia que meu era. Imaginem vocês, eu qu e acompanhei durante dez anos a dupla Guga/Larri ouvir isso de um profissional do tênis. Pois é, este cara não era jornalista .

Fernando de Sampaio Barros produz programas para a tevê e boletins para a Rádio Jovem Pan AM.
fernandosampaio@jovempan.com.br
Fernando Sampaio

Publicado em 31 de Outubro de 2006 às 12:51


Coluna/Análise

Artigo publicado nesta revista