Tática ganha jogo

Tem horas em que entrar em quadra com um plano de jogo definido é crucial para conquistar uma vitória


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"Vou tentar fazer o meu jogo". Esta é uma frase que os jornalistas ouvem bastante quando entrevistam um tenista que vai entrar em quadra novamente no dia seguinte contra um oponente qualquer. Esta expressão, pode não parecer, mas é um pouco dúbia. Pois, "fazer o meu jogo" pode tanto significar que o estilo do tenista anula as qualidades de seu próximo oponente, ou seja, ele está tranquilo quanto à sua tática; ou então, pelo contrário, ele, na verdade, não tem a menor ideia do que vai fazer contra o próximo adversário e sequer pensou nisso.

Se o "vou tentar fazer o meu jogo" significar esta segunda hipótese, pode acreditar, as chances deste jogador em vencer a partida que está por vir diminuem drasticamente. Quanto mais alto o nível técnico, maiores as exigências, especialmente as mentais, que moldam as estratégias usadas em quadra.

Há um ponto em que, ter uma tática ou não, define se você é capaz de vencer. Quantas vezes você, leitor, acha que Rafael Nadal entrou em quadra sem ter um plano de jogo previamente definido dependendo de seu adversário? É bem possível que nunca! Não há tenista na atualidade que tenha tanta aplicação tática quanto o espanhol, pode perguntar isso a qualquer treinador. Aliás, por esse motivo, ter um jogador tão obediente como o "Touro" é o sonho de todos os técnicos do mundo.

Tênis não é só bater na bola

Durante o qualifying do Brasil Open 2009, muitos jovens brasileiros tentavam a sorte e uma vaga na dura chave principal. Um deles, o promissor José Pereira, 18 anos, enfrentou o português Rui Machado, 25, na segunda rodada. Mesmo com peso de bola maior, apesar da desvantagem na idade, o brasileiro perdeu fácil, por duplo 6/2.

No fim, uma frase um tanto ingênua do menino revelou o que foi a diferença no jogo: "Ele (Rui) pensa em cada ponto, não só bate na bola". Pode parecer engraçado, mas a verdade é que Pereira tem golpes melhores que o português, contudo, para vencer, faltou-lhe algo que parece primário: pensar.

Não, o jovem brasileiro não é o único a sofrer desse mal. A falta de experiência faz com que muitos garotos (e marmanjos também) acreditem que jogar tênis trata-se apenas de golpear aquela bolinha amarela com força até que o oponente não consiga mais devolver.

Então, se você é um dos que acredita nesta premissa, é melhor rever seus conceitos. Não estamos falando aqui que não é possível vencer sem ter uma estratégia (sim, é possível - além de que, algumas vezes, não ter estratégia pode ser uma estratégia), o que queremos dizer é que a falta de um plano e de visão de jogo comprometem o seu desempenho em quadra e fatalmente isso vai lhe levar à derrota.

Conhecendo os pontos-chave

Já dizia Brad Gilbert em seu famoso livro "Winning Ugly" (Vencendo Feio) que: ter bons golpes não significa vencer, pois tênis é muito mais do que possuir uma bela técnica. Para o renomado treinador norteamericano, quem entra em quadra sem um plano está fadado a perder. Segundo ele, você precisa conhecer os seus pontos fortes e as fraquezas de seu adversário e usar suas qualidades nas deficiências do outro. Assim, a vitória seria certa.

O importante é encontrar a chave para vencer seu oponente. Fernando Verdasco, na final da Copa Davis 2008, entrou em quadra sabendo que tinha que suportar a pancadaria de Jose Acasuso e deixar o jogo o mais longo que pudesse, assim, teria chance de vencer. E foi exatamente o que aconteceu.

Voltando ao Brasil Open, temos outro exemplo notório de como a tática é essencial. Nas quartas-de-final, o português Frederico Gil enfrentou o favorito Nicolas Almagro. Todos esperavam que o espanhol passeasse em quadra, mas o que se viu foi uma típica vitória da aplicação tática. Gil explorou a frágil esquerda de uma mão de Almagro e o levou à loucura.

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Cristiano Andujar e Marcelo Ruschel

No dia seguinte, porém, o português não teve forças para segurar Thomaz Bellucci que foi à final contra Tommy Robredo. O brasileiro, confiante em seu jogo, foi um dos que usou a famosa frase do começo deste texto ao dizer qual seria sua estratégia para bater o espanhol: "Vou tentar fazer o meu jogo". Se Bellucci tivesse visto a partida entre Gil e Almagro talvez tentasse usar o mesmo plano de jogo que o português utilizou e que foi extremamente eficiente contra um tenista que, assim como Robredo, tem na esquerda de uma mão seu ponto mais fraco.

Imbatível?

Algumas vezes, no entanto, mesmo sem pensar muito, estamos usando alguma tática. Talvez nosso próprio estilo de jogo seja uma e não percebemos. Se você é adepto de saque-e-voleio, por exemplo, esta é sua estratégia. Se você é um jogador de contraataque, eis o seu plano. Obviamente que, mesmo tendo essas coisas definidas como um padrão, isso só funciona de maneira correta se você entende como se joga sacando e voleando ("Onde devo sacar com mais freqüência para vencer os pontos?") ou contraatacando ("Quais pontos devo forçar para aumentar minhas chances de ganhar?"), por exemplo. Acredite, há estratégias dentro das estratégias.

A verdade é que muita gente, talvez a maioria das pessoas, entra em quadra pensando somente em "bater na bola". Contudo, se sua preocupação, além de jogar tênis é vencer algumas partidas (vamos lá, confesse, há sensação melhor do que ganhar?), é bom entrar preparado.

O "mau" exemplo de Federer talvez tenha deixado muitos tenistas mal acostumados. Em seu auge, o suíço parecia destroçar os oponentes sem fazer esforço, jogando "apenas" o que sabia. Mas engana-se quem acreditava que ele entrava em quadra sem pensar em nada. Quem o acompanhava de perto sempre ouvia a frase: "Sei como vencê-lo", referindo-se ao próximo adversário. Ou seja, Federer, mesmo com toda sua genialidade, admitia que tinha um plano para ganhar. Quem, na verdade, não tinha plano para derrotá-lo eram os seus oponentes.

Missão dada é missão cumprida

Vamos tomar por base a filosofia do personagem "capitão Nascimento", do filme "Tropa de Elite", ou seja, o Bope "não entra na favela atirando, entra com estratégia", pois, quando entra, "entra para matar, não para morrer". Calma, você não vai para a quadra para matar, mas vale a pergunta: "Você vai para morrer?"

No tênis, não há empate, alguém sempre ganha. Para não se transformar no que sempre perde, é bom respeitar algumas premissas e a primeira é a formulação de uma tática. Calma (de novo), não é necessário ser bitolado ao ponto de ficar esquadrinhando a vida do adversário para encontrar seus pontos fracos e a melhor maneira de explorá-los. Se você conhece o oponente, já o viu jogar, deve ser capaz de bolar um plano para vencê-lo, não?

Fotos: divulgação
Assim como a filosofia do capitão Nascimento e de Sun Tzu ("Arte da Guerra"), você deve sempre pensar em ter uma tática quando entrar na guerra... digo, na quadra...

Muitas vezes, esse plano se delineia durante a própria partida. Basta não entrar no piloto automático - achando que basta bater na bola - e perceber que jogadas incomodam mais o seu adversário e quais as que ele faz que estão lhe atrapalhando. Isso em mente, tente ajustar seu jogo para fazer mais as jogadas que lhe favorecem e impedir que o oponente atue de uma maneira que lhe perturbe.

Se você é daqueles que assumidamente, além de jogar, também querem ganhar, pense como o capitão Nascimento. Estabeleça estratégias previamente e entre em quadra como se fosse para cumprir uma missão de guerra: derrotar o adversário. E, lembre-se: missão dada é missão cumprida.

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A arte da guerra

Mas não foi Brad Gilbert nem o capitão Nascimento os primeiros a entender a importância da estratégia. No século IV a.C., um estrategista militar chinês, Sun Tzu, já escrevia um tratado chamado "Arte da Guerra". Livro cultuado atualmente por empresários, ele simplesmente mostra a relevância de planejar as ações com antecedência como forma de prevenir problemas.

Sun Tzu cita cinco aspectos que precisam ser examinados antes de qualquer ação: caminho, clima, terreno, liderança e disciplina. Se transpusermos isso ao tênis, o caminho poderia ser o objetivo a ser alcançado. O clima e o terreno podem facilmente ser comparados com as condições de jogo. A liderança seria transposta para inteligência, confiança, coragem e austeridade. A disciplina tem a ver com a coerência e eficiência entre o que foi planejado e o que deve ser executado.

Ron C. Angle/

Se para cada passo nessa vida você precisa pensar, por que seria diferente quando se entra em quadra? "Aquele que conhece o inimigo e a si mesmo lutará cem batalhas sem perigo de derrota. Para aquele que não conhece o inimigo, mas conhece a si mesmo, as chances para a vitória ou para a derrota serão iguais. Aquele que não conhece nem o inimigo e nem a si próprio, será derrotado em todas as batalhas", segundo a "Arte da Guerra".

Aliás, este livro traz mais uma sábia frase que pode ser usada no tênis: "A invencibilidade está na defesa; a possibilidade de vitória, no ataque. Quem se defende mostra que sua força é inadequada; quem ataca, que ela é abundante." O importante é descobrir o equilíbrio.

Às vezes não dá certo

No entanto, depois de tanto planejar, arquitetar, ruminar uma estratégia para enfrentar o próximo rival, existe mais uma verdade inexorável em toda essa filosofia sobre a importância da tática: ela pode não funcionar. Há de se levar em conta os dias em que nada do que você fizer vai dar certo.

O problema pode estar na execução do plano ou nem isso, pode ser que seu adversário também esteja atento à sua tática e anule-a. Jogar contra tenistas que não só batem na bola, mas que pensam, é muito mais complicado. Então, seja um deles.

Arnaldo Grizzo

Publicado em 24 de Junho de 2009 às 07:36


Instrução - Tática

Artigo publicado nesta revista