Larry Scott

Este homem mudou o tênis das mulheres. Sob sua gestão, a WTA ganhou notoriedade, se equiparou ao tênis masculino e promete crescer mais no rastro de tantas celebridades


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As conquistas da WTA nos últimos anos apenas refletem as mudanças pelas quais a sociedade atual passa. O tênis feminino cresce assim como cresce a participação das mulheres no mercado de trabalho. Somente isso, contudo, não explica o boom que a WTA atravessa, mas é um fator que o seu presidente, Larry Scott, observa. Para ele, a essa transformação social, somam-se fatores como a fascinação das pessoas pelo mundo das celebridades e o desejo de alguns países, considerados repressores do “sexo frágil”, de mostrar ao planeta que as mulheres também são importantes em sua cultura.

Scott segue à frente do circuito feminino desde abril de 2003 e está prestes a poder se gabar de ter alcançado a tão sonhada igualdade entre os sexos. Após 13 anos trabalhando na AT P, ele alavancou a WTA , angariou apoios mundiais e regionais. Em sua gestão, conseguiu o maior patrocínio da história do tênis (masculino e feminino), com os US$ 88 milhões da Sony Ericsson. Para ele, 2007 foi um ano histórico, pois, pela primeira vez, os quatro Grand Slams pagaram o mesmo prêmio para homens e mulheres. Nas próximas temporadas, Scott projeta uma equiparação ainda maior e vê as instituições do tênis (WTA e ATP) trabalhando cada vez mais em sinergia em prol do esporte.

Nesta entrevista exclusiva à Revista TÊNIS, o presidente da WTA , que já foi tenista profissional, conta por quais meios a turnê pretende crescer, quais as chances de a América Latina voltar a ter torneios de grande porte e como as tenistas estão se tornando grandes celebridades. Então, homens, cuidado, pois o mundo, agora, é das mulheres...

Qual a importância da beleza das tenistas para o marketing do tênis feminino?
O tênis feminino é muito abençoado e sortudo, pois não temos somente grandes atletas, mas também personalidades muito atraentes. As tenistas também são estrelas, seja nas capas de revistas de moda, de estilo de vida, assim como são nas de tênis. Isso ajuda o tênis crescer mais rápido porque aumenta a exposição do esporte além dos limites da audiência de tênis.

Mas a beleza se tornou um fator preponderante? Mais do que o talento?
Isso é algo com que você sempre tem que ser cuidadoso. Estamos sempre promovendo as nossas jogadoras primeiramente como atletas e, em segundo lugar, como personalidades. Acho que o equilíbrio é muito bom agora. Elas ganham grande notoriedade quando vencem torneios e assim o status de celebridade fora da quadra melhora. Somos muito cuidadosos e, seus agentes também são, em promover o tênis feminino como grandes campeãs primeiro e, depois, como celebridades glamourosas.

Não como Anna Kournikova...
Acho que, de alguma maneira, foi bom para o tênis feminino haver tanta discussão sobre o fenômeno Anna Kournikova. Todo mundo percebeu os perigos, ou riscos, de ter as jogadoras percebidas como celebridades primeiro e, depois, atletas. Mesmo que eu ache que isso foi um pouco injusto com Kournikova, acho que todo mundo ficou alerta de que as agências de representação de tenistas deveriam ser mais cuidadosas para promover as credencias esportivas das atletas primeiro. De alguma maneira isso foi muito útil. Mas Kournikova também abriu oportunidades. Ela foi a primeira a mostrar o que uma atleta poderia alcançar em uma perspectiva de marketing.

Você sempre defendeu que as atletas deveriam ser mais acessíveis para o publico, mídia. Acha que hoje elas são mais acessíveis?
Definitivamente acho que elas são mais acessíveis agora do que há cinco ou dez anos, porque encorajamos muito isso. E rompemos algumas barreiras entre os tenistas e a imprensa e encorajamos mais interação. Por exemplo, no início de cada torneio criamos a “hora de acesso total”, onde as jogadoras top devem estar lá por uma hora e todo jornalista tem a oportunidade de falar com elas. Você não precisa ter uma exclusiva agendada, é aberto. Também encorajamos as jogadoras a fazer mais promoção, sessões de autógrafos, atividades para a caridade, coisas deste tipo. Mas obviamente vivemos num mundo com muita demanda, com diversos tipos de mídia, então se mantém um olho aberto para barreiras de proteção apropriadas às jogadoras também. Mas começamos a equilibrar isso.

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"As tenistas também são estrelas, seja nas capas de revistas de moda, de estilo de vida, assim como são nas de tênis. Isso ajuda o tênis crescer mais rápido porque aumenta a exposição do esporte além dos limites da audiência de tênis"

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O envolvimento dos atletas na promoção do esporte é essencial?
Acho que há muitas coisas a se fazer para promover o esporte, mas especialmente em esportes individuais como tênis, os atletas são as estrelas do show. Eles criam o interesse nos fãs de tênis, ou nos fãs casuais. Nesse mundo de celebridades em que vivemos, acho que não basta apenas ser um grande atleta. As pessoas estão buscando informações sobre atletas como seres humanos, sua vida pessoal, o que gostam de fazer. Como vivemos numa cultura em que as pessoas constroem uma fascinação pelas celebridades, acho que – para um esporte alcançar todo o seu potencial – não é suficiente que os atletas sejam grandes campeões. Eles precisam ser bons com a mídia, com os fãs, ter boa imagem. De outra maneira, o interesse não alcança o todo o seu potencial.

A América do Sul tem poucas jogadoras top, apenas um torneio de grande porte. A WTA tem interesse em desenvolver o tênis por aqui?
Gostaríamos de aumentar a presença de torneios. Tenho estado desapontado que não temos mais torneios. Acho que, nos últimos anos, nossos planos de expansão estiveram mais focados nos mercados onde houve maior euforia ao redor do tênis, e desenvolvimento econômico muito forte. Em particular, na Ásia e Oriente Médio, em que os tenistas e as economias destas regiões estão dando um boom e o tênis é um tipo de novo fenômeno. Por exemplo, no ano que vem, vamos abrir um escritório na China que vai nos permitir concentrar atividades e tomar vantagem das oportunidades do mercado chinês, mas também vai servir como um centro para a região. No Oriente Médio, também temos grande interesse e estamos mudando nossos Masters para o Catar e, depois, para Istambul. Vejo grandes oportunidades de crescimento em outras partes da Ásia, especialmente na Índia. É a próxima grande oportunidade. Emocionalmente e intelectualmente gostaríamos de desenvolver a América Latina, mas acho que a situação econômica e o interesse não têm estado no nível da Ásia. Então, não faz sentido agora. É provavelmente um processo mais a longo prazo. Estivemos tão ocupados tentando manter a euforia e a febre na Ásia, que, honestamente, não tivemos a chance de concentrar a atenção na América Latina. Mas as oportunidades de curto prazo não parecem muito excitantes. Porém, tomara que isso aconteça. Obviamente que isso depende muito das tenistas, criarem interesse.

E como mudar isso?
A coisa boa da América Latina, ao contrário da Ásia e Oriente Médio, é a grande tradição do tênis. O tênis é maduro, como mercado, pois já existiram grandes campeões no passado, tivemos torneios. Eles (Ásia) estão em um estágio diferente no ciclo de desenvolvimento, que chamo de mercados em desenvolvimento. Nestes mercados, mesmo não tendo grandes jogadoras, eles estão sedentos para investir. Pois querem mostrar que possuem credibilidade internacional e escolhem torneios de tênis para anunciar e promover os seus países. E, tendo um grande torneio, também começam a produzir interesse nos juvenis. Então, acho que isso pode acontecer na América Latina. Mas precisam começar a ter um algum crescimento econômico, um espírito pioneiro, onde governo e federação de tênis estejam dispostos a aceitar certos riscos para trazer o tênis, para promover as cidades, o país, jogar sementes para o desenvolvimento. Não acho que exista uma dinâmica. Acho que muito vem do governo. O que vemos por aí, na Ásia, é que, nestes países, o governo está investindo para trazer esportes internacionais para lá.

Como uma atração turística...
No Brasil, uma coisa que espero, é que possa sediar uma Olimpíada algum dia. Quando o Brasil voltar suas atenatenções para ser uma das principais capitais do esporte mundial, sediando as Olimpíadas ou a Copa do Mundo, os governantes nacionais, municipais, vão perceber que, como outros países estão fazendo, sediar um grande evento de tênis internacional ajuda a construir a sua credibilidade e o credencia como um centro para outras grandes competições esportivas. É o que as cidades estão fazendo. Trazem um grande evento de tênis, pois isso é um sinal para a comunidade esportiva mundial de que esta é uma grande cidade e chamam a atenção para si. Então, espero por isso. Pois o esporte é tão popular no Brasil. Assim que os governantes ficarem mais ambiciosos em sediar grandes competições internacionais, eles verão que o tênis é verdadeiramente um dos poucos esportes internacionais que pode trazer uma publicidade e uma notoriedade positiva para o Brasil e isso talvez acarrete alguns investimentos.

Ron Angle/TPL
"Foi bom para o tênis feminino haver tanta discussão sobre o fenômeno Anna Kournikova. Todo mundo percebeu os perigos de ter as jogadoras percebidas como celebridades primeiro e, depois, atletas. Mas Kournikova também abriu oportunidades. Ela foi a primeira a mostrar o que uma atleta poderia alcançar em uma perspectiva de marketing"

Antes, no Brasil Open, havia o torneio feminino junto com o masculino. Atualmente, nem mesmo os eventos femininos internacionais são televisionados ao vivo no País. Isso preocupa a WTA?
Certamente que gostaríamos de ver maior cobertura televisiva dos nossos eventos e espero que isso se desenvolva com o aparecimento de estrelas, que causam mais fascínio. Mas infelizmente é usual que o interesse das televisões aumente ou caia, em países sem uma tenista nacional. Mas, minha esperança – até que o Brasil tenha uma estrela – é que o poder das estrelas (Maria Sharapova, Venus e Serena Williams, Ana Ivanovic) crie mais desejo para que o público as veja na tevê. E acho que está ficando cada vez mais difícil, em todos os esportes, obter tempo de tevê. Então vamos tomar isso em nossas próprias mãos um pouco. A tecnologia vai ajudar a fazer nosso esporte mais acessível para os fãs no Brasil, on-line. Vamos criar um canal digital de tênis. No futuro, os fãs não precisarão contar com a tevê para lhes dizer quando vão poder assistir ao tênis feminino. As estações de tevê são intermediárias entre o esporte e o público e acreditamos que há um bom publico no Brasil que acompanharia mais tênis feminino se pudesse tê-lo. Mas a tevê não dá o que eles precisam. Então, terão via internet. Obviamente que queremos trabalhar com os canais de tevê, dar a eles direitos de transmissão ao vivo e exclusivos, esta é a nossa primeira prioridade, mas, no futuro, os canais que não quiserem pagar, faremos disponíveis para os fãs de qualquer maneira pela internet e banda larga. Vamos lançar um pouco disso em 2008 e, em 2009, acredito que floresceremos um canal de tênis em banda larga.

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O Brasil já teve Guga e Maria Esther Bueno, dois números um. Como você vê o mercado brasileiro hoje?
O Brasil é um grande mercado, importante mundialmente em nível de fãs. É um mercado interessante para os nossos parceiros regionais focarem no futuro. Também reconhecemos que é uma cultura voltada para as estrelas, porque tiveram o número um do mundo entre homens e mulheres, isso estraga um pouco a sede pelo tênis. Então é um mercado difícil. É um desafio levantá-lo e, novamente, não nos concentramos em fazer muita promoção aí, porque estivemos muito focados nos mercados que estão tão sedentos.

"Em esportes individuais como tênis, os atletas são as estrelas do show. Nesse mundo de celebridades em que vivemos, acho que não basta apenas ser um grande atleta"

Como podemos desenvolver o tênis aqui então?
Obviamente que ter jogadoras top é o ponto-chave para criar interesse e isso é um dos trabalhos da Confederação Brasileira. Não estou familiarizado com o que eles estão fazendo, mas o que os governos e as cidades podem fazer é investir em construção de estruturas e promover alguns torneios. Isso vai ajudar a criar interesse e oportunidades para as tenistas brasileiras. Então isso pode vir tanto do lado das jogadoras ou dos governos, que podem decidir se tenis é uma prioridade, investir em grandes eventos para semear interesse. Essas são as chaves.

Atualmente as mulheres ganham o mesmo que os homens nos Grand Slams, mas a cobertura da mídia é a mesma?
Sim, no mundo é muito similar. Em alguns lugares, onde há um grande entusiasmo pelo tênis feminino, a exposição em mídia é maior que a dos homens. O tênis, feminino e masculino, está muito bem atualmente. Estivemos em campanha pela equiparação dos prêmios por muito tempo e 2007 é um ano histórico, pois temos premiação igual nos quatro Grand Slams pela primeira vez. Em 2009, teremos prêmios iguais nos quatro maiores eventos depois dos Grand Slams. Em 2008, o nosso Masters vai se equiparar ao Masters masculino. Então, o tênis feminino está crescendo muito rapidamente. Temos mais dinheiro de patrocinadores do que os homens. E há vários indicadores de que o tênis feminino está equiparado com o masculino e, em alguns mercados, mais forte. Mas isso é um fenômeno recente. Isso veio acontecendo durante os anos, mas ocorreu um grande salto nos últimos anos. De alguma maneira isso também segue a tendência de que no mundo estão aparecendo mais e mais oportunidades para as mulheres. O tênis feminino está liderando o esporte feminino globalmente. Não há outro esporte profissional em que as mulheres ganhem tanto dinheiro. Como líder, temos visto um crescimento talvez mais rápido do que os outros. Esta é uma época muito excitante para o desenvolvimento de oportunidades para as mulheres no mundo em geral.

Quais as causas principais disso?
Acho que a abertura de oportunidades para as mulheres ao redor do mundo. Países e cidades desejosos por mostrar casos de mulheres em posição de liderança e mostrar que estão abertos a ter mulheres nas mesmas posições que os homens. E, também, o poder de nossas estrelas é fenomenal. O interesse de patrocinadores e televisões em nossas atletas é ótimo.

fotos:Ron Angle/TPL
"Gostaríamos de desenvolver a América Latina, mas acho que a situação econômica e o interesse não têm estado no nível da Ásia e do Oriente Médio, Índia. Então, não faz sentido agora. É provavelmente um processo mais a longo prazo"

Você trabalhou na ATP. Como isso te ajudou? É mais fácil lidar com mulheres do que com homens?
Meus 13 anos na ATP foram de enorme utilidade, pois as estruturas são muito similares. Quando vim para a WTA, estava fresco, com novas idéias. Apesar de o esporte ser um negócio único, há muitas diferenças em prioridades e assuntos. Então, minha experiência com o jogo masculino foi muito útil. Fui capaz de aplicar muita coisa do masculino no feminino, mas fazendo coisas de maneira que fossem singulares e apropriadas para as mulheres. Por outro lado, achei as jogadoras mais fáceis de trabalhar do que os jogadores, quando se trata de marketing e promoção. Os homens estão menos abertos a mudanças, menos dispostos a tentar coisas novas que as mulheres. Nos homens, se está tudo bem, eles não tentarão coisas novas. As mulheres estavam mais abertas às minhas idéias.

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Como você lida com a competição que existe entre o tênis masculino e feminino?
Se implodíssemos as instituições do tênis e começássemos de novo, provavelmente teríamos o tênis feminino e masculino como um só, pois acho que estamos promovendo o tênis e a nossa competição não é com o tênis masculino, é com o futebol, com a Fórmula 1. O tênis feminino é forte o suficiente agora e merecemos a nossa parte justa do dinheiro dos patrocinadores, em exposição de mídia. Meu desafio é tomar parte do mercado de outros esportes. Ao invés de competir, estou tentando colaborar, tanto quanto possível, para apresentar o esporte de uma maneira coesa e minimizar as diferenças entre homens e mulheres. E, por causa dos meus 13 anos na ATP, criei um relacionamento ímpar, habilidade de criar uma relação próxima e fazer progressos mútuos.

Ron Angle/TPL
"Quando o Brasil voltar suas atenções para ser uma das principais capitais do esporte mundial, sediando as Olimpíadas ou a Copa do Mundo, os governantes nacionais, municipais, vão perceber que, como outros países estão fazendo, sediar um grande evento de tênis internacional ajuda a construir a sua credibilidade e o credencia como um centro para outras grandes competições esportivas."

Etienne de Villiers tem tentando várias mudanças em regras para dinamizar o tênis. Você introduziu os técnicos na quadra. Está pensando em algo mais?
Tenho muito respeito pelas regras do tênis. Elas estão aí por muito tempo. Tênis é um grande jogo. O esporte, por si só, é um grande esporte. Não acho que precisemos mudar as regras fundamentais do tênis, entretanto, na apresentação do esporte, na embalagem, há espaço para tornar o esporte mais amigável para os fãs e mais interessante. O técnico na quadra foi uma resposta para a televisão – que queria saber o que o técnico estava pensando, o que está dizendo para a atleta, qual a estratégia – para tornar mais interessante para os fãs que estão assistindo pela tevê. Com esse tipo de motivação – de fazer o esporte mais interessante para os fãs – então sou a favor de tentar coisas e experimentar. Nem tudo vai dar certo. Você vai tentar coisas que vão dar certo, outras não, mas essa é a única maneira de evoluir.

"Acho que muito vem do governo. O que vemos por aí, na Ásia, é que, nestes países, o governo está investindo para trazer esportes internacionais para lá"

 

PERFIL
Larry Scott

Nascimento
21 de novembro de 1964

Currículo
Tenista profissional de 1986 a 1989
Melhor ranking 210º em simples e 69º em duplas (um título de duplas em Newport e uma final em Nancy)

Formação
Formado em Harvard com bacharelado em artes e em história européia

Família
Reside em St. Petersburg, Flórida, Estados Unidos com a esposa Cybylle e três filhos, Alexander (sete anos), Sebastien (cinco) e Alannah (quatro)

Arnaldo Grizzo

Publicado em 13 de Dezembro de 2007 às 12:30


Perfil/Entrevista

Artigo publicado nesta revista