As oportunidades são enormes e, por isso, o número de brasileiros que vão estudar e jogar tênis nas universidades dos Estados Unidos aumenta a cada ano
TODO PAI ESPERA QUE seu filho, tão logo comece a amadurecer, escolha uma profissão e ingresse em uma universidade. O garoto chega aos 18 anos, idade crítica para qualquer adolescente devido às pressões sociais, e fica diante do dilema de sua vida: "O que fazer?" Pai, mãe, avós, tios, enfim, toda família começa a olhar para o moleque com aquele leve toque de cobrança: "O que você pretende fazer?" São poucos os que conseguem fugir dessa "coerção" sem dar uma satisfação sequer. A maioria precisa enfrentar as responsabilidades da vida adulta sem titubear.
Escolher uma carreira e passar no vestibular não é uma tarefa fácil para um jovem comum, de rotina casa-escola. Para quem acrescenta o tênis entre os seus hábitos diários, esse processo parece ainda mais penoso, mas não precisa ser. O esporte, que muitas vezes é considerado um grande empecilho aos estudos, é capaz de abrir portas, principalmente em universidades nos Estados Unidos.
Quando os tenistas se aproximam da maioridade e não podem mais jogar os torneios infanto-juvenis, eles se deparam com um conflito: decidir entre a profissionalização no esporte, ou priorizar os estudos e tentar uma nova profissão?
O jovem Rafael Cavalcante se adaptou bem e foi considerado o "calouro do ano" na segunda divisão da NCAA |
A saída que muitos encontram para conciliar essas duas opções é o intercâmbio estudantil nos Estados Unidos, um fenômeno que cresceu e ganhou mercado no Brasil nos últimos anos. Estima-se que, desde 2001, cerca de 500 tenistas deixaram o país para estudar e jogar tênis na liga universitária norte-americana, uma das mais fortes do mundo. O nível técnico da National Collegiate Athletic Association (NCAA) e o apoio que os atletas recebem são os diferenciais que fazem do país o destino mais procurado para esse tipo de intercâmbio.
O tênis universitário nos Estados Unidos é levado tão a sério que, na primeira divisão da NCAA, os torneios são transmitidos pela televisão, a premiação é em dinheiro e o melhor tenista do ranking ganha um wild card para a chave principal do US Open. Jogadores da ATP, como o norte-americano James Blake e o alemão Benjamin Becker foram campeões na liga e só se profissionalizaram depois de formados.
PASSOS
A primeira etapa antes de pensar em estudar fora é a escolha do curso. Segundo o treinador Rafael Fontes, formado em administração na Universidade de Lousiania em 2001, isso é essencial. "A primeira decisão tem que ser o curso. A partir daí você deve traçar as prioridades. Se a preferência for o tênis, deve procurar quais universidades possuem vagas para bolsistas e uma boa equipe de treinamento. Se a prioridade for o conhecimento acadêmico, a busca por uma faculdade bem conceituada no curso que irá fazer é essencial", afirma Fontes.
Depois da escolha da carreira, o tenista deve se preparar para prestar o exame Toefl (teste de inglês como língua estrangeira), que o credencia para concorrer às vagas nas universidades. Aprovado no exame, o tenista está apto a se candidatar e concorrer às bolsas. Quanto melhor for o nível técnico do jogador, mais facilidades e privilégios ele terá na procura pela faculdade. Quanto às bolsas, as mulheres levam vantagem, pois as instituições destinam o maior número das vagas masculinas aos atletas que praticam Futebol Americano, esporte universitário mais popular do país.
Para Maurício Cabrini, diretor de uma empresa responsável por enviar diversos jovens para universidades fora do País, os tenistas têm o perfil ideal para concorrer às bolsas estudantis no exterior. "Além do alto poder aquisitivo, eles geralmente possuem bom nível na língua inglesa e são extremamente dedicados à prática esportiva", diz Cabrini. Acompanhando o crescimento do número de tenistas que viajam ao exterior, algumas empresas já oferecem um treinamento específico, com ênfase não só em tênis, mas também no ensino da língua inglesa e dos costumes norte-americanos. Este é o caso do Tennis Ranch, um centro de formação de tenistas que, em parceria com agências de viagem, ajuda a preparar jovens tenistas para o desafio. Para Ricardo Pereira, um dos idealizadores do projeto, a intenção é manter o aluno focado na viagem desde cedo. "A idéia fundamental do projeto é preparar o aluno para o intercâmbio e investir primeiramente no seu amadurecimento pessoal, para deixar que ele opte pelo caminho a ser traçado depois de formado", revela Pereira.
VIDA DE ESTUDANTE
Com 18 anos, Rafael Cavalcante deixou para trás o conforto de casa para estudar nos Estados Unidos. Cursando administração no West Virginia Wesleyan College desde o início de 2007, ele divide um pequeno quarto com outro estudante, tem que lavar sua roupa, estudar muito e cuidar da alimentação, mas já começou a colher os primeiros frutos de seu esforço. Com apenas sete derrotas em 37 partidas na temporada, Cavalcante foi eleito o "calouro do ano" da universidade, logo em sua primeira temporada na segunda divisão da NCAA.
Depois de formado, Luiz Carvalho arrumou emprego na ATP |
"Foi difícil me adaptar e conciliar as lições com os treinos, mas vale a pena. Consegui a bolsa de estudos e posso fazer o que mais gosto: treinar e jogar tênis. Se ficasse no Brasil, com certeza teria que estudar muito e não teria tempo para jogar", revelou o tenista, que aponta a qualidade da comida como um dos pontos negativos na viagem. "É bem difícil manter uma alimentação saudável aqui. Os americanos comem muito fast food e não existem muitas opções além desta. Até no refeitório da faculdade, onde os atletas se alimentam, a qualidade da comida é ruim".
A experiência de morar sozinho em um país diferente é muito rica e a maioria não se arrepende da escolha. Para Luiz Carvalho, que se formou em comunicação e integrou a equipe de tênis da universidade de Mississipi, a oportunidade de conhecer pessoas de vários lugares foi única. "A equipe se torna a sua família nos Estados Unidos.
DIFICULDADES E FUTURO
Mas o intercâmbio pode não ser o melhor caminho para alguns. O dia-a-dia na universidade envolve uma rotina dura de aulas em um período e treinos em outro. Se o atleta não obtiver boas notas, fica impedido de atuar pela faculdade. Para evitar que isso ocorra, aulas de reforço são oferecidas para os alunos com dificuldades. Fora isso, problemas de adaptação ao clima, de compreender e se expressar na língua inglesa e a distância dos familiares e amigos às vezes podem frustrar os candidatos.
"Muitos vão para qualquer lugar só pelos contatos que os professores aqui do Brasil possuem e acabam se arrependendo. Eles se iludem com a viagem e se decepcionam ao perceber que não era aquilo tudo que esperavam", revela Rafael Fontes, que encaminha jovens talentos ao tênis universitário norte-americano e já viu muito tenista se dar mal na escolha.
Aos 18 anos, a tenista Juliana Elia não suportou a rotina do Flagler College, na Flórida, decidiu abandonar o curso de comunicação e retornou para o Brasil após apenas seis meses. "A obrigação com o tênis era muito forte. Na temporada, tinha que treinar todos os dias, até nos finais de semana", conta a tenista, que, devido à má qualidade da alimentação, engordou cerca de oito quilos no período em que viveu nos Estados Unidos. Hoje, com 21 anos, Juliana não se arrepende da escolha que fez: "Foi uma experiência boa, mas senti muito a falta da minha família e decidi priorizar os estudos no Brasil".
O norte-americano James Blake foi campeão universitário antes de ingressar no circuito profissional |
Depois de formado, diversas opções surgem para o tenista. Os Estados Unidos é um país de oportunidades e não é difícil encontrar um bom emprego e até conseguir o green card após a formatura. Para quem persiste na profissionalização no tênis, vários Futures e Challenger são realizados no país e podem servir como porta de entrada para os primeiros pontos no ranking da ATP.
Na pior das hipóteses, o jovem pode retornar ao Brasil com uma série de diferenciais no currículo em relação a seus concorrentes no mercado de trabalho. Além da experiência sóciocultural, os conhecimentos adquiridos no exterior e o domínio da língua inglesa facilitam na procura de uma vaga nas empresas.
Publicado em 28 de Maio de 2007 às 11:15