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A primeira brasileira a romper o top 100 em 23 anos, Teliana Pereira busca metas ainda maiores e pode incentivar um rumo promissor para o tênis feminino


Teliana Pereira
“Tenho que ter paciência e trabalhar por objetivos. Nesse ano, quero fechar no top 100, no próximo entre as 70 melhores e assim ir construindo um caminho”

PARA AQUELES QUE ESPERARAM mais de duas décadas, vale anotar: foram necessários 8.505 dias para que uma nova brasileira ousasse figurar novamente na primeira página do ranking da WTA. Desde a semana do dia 16 de abril de 1990, quando Andrea “Dadá” Vieira esteve em 95º lugar, o País afundou em um período de esquecimento nas simples, e somente os homens, liderados por Gustavo Kuerten, representaram-nos em grandes torneios e figuraram no top 100 no ranking.

Porém, desde o começo deste ano, a pernambucana Teliana Pereira mostrou que seria a grande candidata a mudar esse cenário. Em fevereiro, ela chegou à semifinal do WTA de Bogotá após sair do qualifying e, desde então, beirou a faixa das 120 primeiras. Em grande parte do primeiro semestre, a tenista de 25 anos arriscou um lugar nas competições de primeira linha e esteve a uma vitória de entrar na chave principal de Roland Garros.

Com dois títulos em torneios intermediários na França, e após as quedas das rivais próximas na classificação, Teliana ocupou exatamente a 100ª posição no histórico dia 29 de julho de 2013 – sendo a única do País no top 100, já que Thomaz Bellucci, havia caído de produção semanas antes.

É verdade que a jogadora, que treina em Curitiba, perdeu algumas posições sete dias depois, mas o jejum brasileiro já estava enterrado. Ela já fazia parte do pelotão de elite brasileiro junto com Cláudia Monteiro, Gisele Miró, Patrícia Medrado e Niege Dias –outras que foram além do número 100 no circuito individual. Ainda assim, Teliana, humildemente, não mostra tanta euforia por ter alcançado o que centenas de brasileiras buscaram nos últimos 23 anos. Pelo contrário, ela mantém o foco no trabalho. “Não posso atropelar etapas, porque estou no caminho certo”, observa.

Teliana Pereira
“As meninas mais novas deveriam se inspirar no exemplo de garra, humildade e perseverança da Teliana”, diz João Zwetsch

ÁRDUO CAMINHO

Na lista de abril de 1990, em que “Dadá” marcou presença no top 100, o Brasil contava 30 jogadoras no ranking da entidade. Para completar, tínhamos seis (incluindo “Dadá”) entre as 200 melhores – Niege Dias, Cláudia Chabalgoity, Luciana Tella, Luciana Corsato e Gisele Miró completavam o time. Vinte e três anos mais tarde, Teliana recolocou a bandeira do Brasil na lista, porém sem nenhuma compatriota junto do grupo das 250 melhores. Pior: o número de representantes no circuito profissional caiu pela metade de lá para cá. Ora, com maior apoio da Confederação Brasileira de Tênis (CBT) e de um novo calendário do tênis feminino, que oferece às jovens a oportunidade de somar seus primeiros pontos em vários torneios dentro do Brasil, onde está o problema para tamanha redução de brasileiras em atividade?

César Kist, diretor do Departamento de Capacitação da CBT, crê que o principal fator para a dificuldade das brasileiras em alavancar a carreira no tênis vem da própria cultura e estrutura familiar em nosso País. “A maioria das jogadoras não sonha em seguir carreira profissional. Sem essa motivação, que serve de combustível para ganhar torneios, fica difícil continuar. Além disso, as meninas que têm condição de bancar um treinamento de alta qualidade são de classe média-alta e os pais, geralmente, não desejam que elas sigam esse rumo, o que se torna mais uma barreira”, explica.

Por sua vez, Joana Cortez, que seguiu a carreira profissional de 1995 até 2008, afirma que a rotina diária de uma atleta, com viagens desgastantes ao exterior, é o que mais afasta as brasileiras do desafio. “Vida de atleta não é fácil. Além da necessidade de ter investimento financeiro para manter uma estrutura de treinamento, a menina tem que passar longos períodos na Europa e Estados Unidos, onde ocorrem os principais eventos. Algumas batem na trave, outras desanimam e desistem cedo por falta de apoio”. Dadá Vieira concorda com Joana e lembra que a “sensibilidade em deixar a família fala mais alto com a mulher do que com o homem”.

O PARÂMETRO

Todas essas particularidades das adolescentes brasileiras geram dificuldade no comprometimento com o esporte de alto nível. Por isso, ter Teliana como parâmetro serve como incentivo para as mais jovens, que ainda pensam em viver do esporte. “Enquanto não tem ninguém ali, parece que é uma coisa impossível de alcançar. Mas quando você vê alguém treinando do seu lado, lutando junto no circuito e conseguindo, você começa a acreditar que também pode”, afirma Dadá, que chegou a ser 76ª do mundo.

O espírito de união entre as mulheres brasileiras foi algo notável há duas décadas, segundo conta a ex-top 100. E ela, tenista a ser observada pelas mais novatas, procurou dar o exemplo na época. “Quando fui top 100, eu ajudava muito as outras meninas nos torneios. Se a fulana estava jogando um qualifying de um torneio, ficava junto comigo no quarto, porque já estava pago, coisas assim de parceria. Então é bem legal dar uma força para quem está subindo”, aconselha.

João Zwetsch, capitão do Brasil na Copa Davis, reforça o argumento de Dadá e aponta que a realidade difícil de Teliana, vinda de uma família humilde no sertão nordestino e que sofreu com lesões na carreira, auxilia as jogadoras mais novas para lidarem de forma mais profissional com a carreira. “Essa conquista dela mostra mais uma vez que, com trabalho sério, determinação e apoio, pode-se chegar longe. As meninas mais novas deveriam se inspirar no exemplo de garra, humildade e perseverança da Teliana”, opina o treinador.

Teliana Pereira
Teliana e Dadá, as duas últimas brasileiras top 100

MUDANÇA DE PAPEIS? CALMA LÁ!

Mesmo antes de Teliana alcançar a meta das 100 primeiras do ranking, o cenário do tênis feminino do Brasil, por mais centralizado nas atuações da pernambucana, já era bem mais promissor do que o dos homens, onde o circuito é muito mais competitivo e acirrado, principalmente entre os top 300.

Com ranking melhor do que o de Bellucci, Teliana se tornou o principal nome do tênis brasileiro em simples na temporada. A última vez que uma mulher havia carregado o “carro-chefe” da modalidade foi Niege Dias em novembro de 1988, quando obteve o 32º posto (Niege foi a melhor brasileira ranqueada em simples, em 31º, posto alcançado em dezembro de 88), desbancando o paulistano Luiz Mattar, então 35º e número 1 entre os homens.

Mas termos apenas Teliana, uma estreante, dentro ou próxima do top 100 significa que a nova safra do tênis feminino supera a do masculino? “Não podemos confundir as coisas. A queda de Bellucci para fora do top 100 foi totalmente ocasional”, afirma o jornalista José Nilton Dalcim, editor do site TenisBrasil. Ele lembra, também, que o pupilo de Daniel Orsanic esteve afastado do circuito se recuperando de uma lesão abdominal.

César Kist acrescenta que é equivocado avaliar a nova geração feminina apenas pelos resultados de Teliana, já que há um volume bem maior de homens brasileiros no tênis. “Mesmo com a ascensão da Teliana, ainda acredito que o masculino tenha maior potencial, sem falar dos duplistas, em que temos seis nomes entre o top 100. Diria que é uma questão de tempo para o Thomaz também voltar ao top 50, pois ele tem potencial de sobra para jogar nessa faixa”.

ROTINAS DE TRABALHO

Mas se por um lado há poucas tenistas brasileiras se arriscando na carreira, por outro as melhores atravessam um ótimo momento. Além de Teliana, Paula Gonçalves está próxima de furar a barreira do top 250, Beatriz Haddad Maia já está dentro das 300 melhores com apenas 17 anos, além de Laura Pigossi, 19 anos, que está entre as 400 do mundo. E o espírito de equipe, evidente na época de Dadá, incentiva nossa atual número 1 a seguir almejando mais conquistas daqui para frente. Teliana admite ter nível para brigar por um lugar ainda mais alto na lista da WTA, mas que o trabalho deve ser planejado em metas. “Posso alcançar muito mais do que já consegui. Eu melhorei em todos os aspectos do jogo, na quadra, na parte física, tecnicamente e, principalmente, no aspecto mental por estar jogando os torneios maiores. Mas tenho que ter paciência e trabalhar por objetivos. Nesse ano, quero fechar no top 100, no próximo entre as 70 melhores e assim ir construindo um caminho”, explicou Teliana.

Por Matheus Martins Fontes

Publicado em 23 de Agosto de 2013 às 00:00


Perfil/Entrevista Teliana Pereira ranking WTA top 100 Roland Garros

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