Instrução Mental

Não criemos pânico

Tente encontrar seus próprios caminhos para não “travar” na hora “H”


VOCÊ ESTÁ TODO EMPOLGADO PARA jogar um torneio. Faz a inscrição e espera ansioso pelo sorteio da chave de sua categoria. Só que no momento que observa seu caminho rumo ao título... Não, ele não! Aquele adversário contra quem você “treme na base”, que parece sempre trazer o seu pior, está do mesmo lado da chave. E, por mais que você torça, seu inconsciente não engana: “Vou ter que enfrentá-lo”, lamenta já em tom de derrota.

Sem dúvida, você já deve ter sentido na pele como é “travar” numa partida ou, certamente, observou esse fenômeno acontecer com algum adversário ou parceiro.

Na origem da palavra, “travar” deriva os seguintes significados: prender, fazer parar, tolher, impedir os movimentos, frear. Travar no momento decisivo de fechar um set, contra um adversário de nível superior (ou inferior), ou mesmo diante de um torneio importante, geralmente provoca reações desastrosas em quadra, sensações de impotência, raiva e terrível frustração.

Quem já se deparou com essa situação sabe que não é tão simples quanto parece reverter o panorama. Os tenistas, quando travam, veem-se com a sensação de total falta de controle, relatam saber o que deveriam fazer dentro de quadra, entretanto, por mais que queiram, seus corpos não reagem aos seus comandos.

Maior desafio

Travar descreve uma ação que ocorre no corpo e na cabeça do atleta geralmente quando ele está em uma situação estressante, avaliadora e/ou ameaçadora. Nosso corpo, junto com nosso cérebro, é uma máquina perfeita que sempre funciona em direção ao bem-estar geral, ao equilíbrio geral (homeostase) e, principalmente, à sobrevivência. Por instinto, esquivamo-nos e fugimos de situações que provocam dor e desconforto, e, em contrapartida, acabamos nos aproximando de cenários que nos geram prazer e conforto.

Ainda hoje carregamos reações que foram selecionadas ao longo da evolução humana para a sobrevivência de nossa espécie. Uma delas é a de luta ou fuga, as quais colocavam nossos ancestrais preparados para lutar ou para fugir o mais rápido possível dos seus predadores. Essas reações acontecem diante de uma situação percebida como ameaçadora e possível causadora de danos físicos e, nos dias de hoje, é ampliada a situações de danos morais ou emocionais como vergonha, decepção e frustração.

O cérebro reage em busca do bem-estar e equilíbrio, e comanda o corpo de forma a nos proteger das situações de perigo – que geram o medo real ou antecipado de algo que pode nos acontecer, fator conhecido como ansiedade.

Diante de situações ameaçadoras (mesmo apenas psicológicas), nosso corpo tende a reagir de forma reflexa e inata para se defender e isso pode fazer com que o atleta “trave”

Reações

Especialmente diante do medo e da ansiedade, não é a parte racional, ou córtex pré-frontal, que está sob o comando das nossas ações, mas o Sistema Nervoso Autônomo (SNA), responsável pelas funções vitais do organismo, através de uma reação reflexa e inata.

Quando essa reação é desencadeada, não é mais você quem está no comando, mas seu instinto animal de sobrevivência. Seu corpo entra em estado de emergência e se reorganiza para se defender de possíveis danos. Por isso, ele também provoca uma contração muscular, formando uma couraça para se proteger de possíveis ferimentos, bem como o aumento da frequência cardíaca e respiratória (e a consequente liberação de adrenalina e cortisol na corrente sanguínea para garantir energia) e a reação de forma rápida e eficiente em face do perigo, deixando também o sistema imunológico em alerta para que não haja inflamação em caso de ferimento.

Essa couraça, que protege nosso corpo em situações de sobrevivência somada à descarga de substâncias, é outro fator que causa o fenômeno “travar”. O tenista travado está em situação de alarme e emergência, defendendo-se de uma possível ameaça que, na verdade, está dentro da sua mente. Não é, nesse caso, uma ameaça real de vida.

Sem travar em quadra

Enquanto o atleta, amador ou profissional, estiver avaliando uma situação de jogo como ameaçadora, seu corpo vai funcionar de maneira reflexa, ora se defendendo, ora freando como se estivesse diante de um predador. Como, então, diminuir a probabilidade de travar nos jogos?

A seguir, damos algumas dicas simples para ajudar a controlar a ansiedade diante dos seus maiores medos:

1) Identifique o que é um estímulo ameaçador para você dentro ou fora do jogo (perder para alguém mais fraco, sentir-se um fracassado, perder a aprovação do seu técnico, passar vergonha, não corresponder às expectativas dos outros ou às suas próprias).

2) Questione as suas ameaças. Por que você se incomoda tanto com elas? Quais os reais prejuízos que elas trazem a você?

3) Encare a ameaça como um desafio a ser superado. Nosso organismo se protege e, diante dos desafios, colocamo-nos em prontidão de enfrentamento.

4) Avalie os benefícios e prazeres que o tênis lhe proporciona. Eles devem ser maiores que as ameaças.

5) Antes do seu jogo e durante seus treinos, lembre-se dos benefícios e prazeres, e não das ameaças. Assim, você não entra em quadra em estado de emergência.

6) Estabeleça como foco de atenção aquilo que é relevante e controlável. Concentrar-se no que está fora do seu controle aumenta a percepção de ameaça.

7) Esteja, no momento presente, atento ao que você está realizando, ponto a ponto, e não ao que poderá acontecer se você errar ou perder.

8) Curta o desafio de jogar uma partida de tênis. Sentir prazer durante o jogo lhe mantém no presente e afasta a percepção de ameaça, fortalecendo a sensação do desafio e, consequentemente, o desejo do duelo.

Carla di Pierro é psicóloga do esporte.
carla@carladipierro.com.br

Por Carla Di Pierro

Publicado em 5 de Julho de 2014 às 00:00


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