ABC da recuperação

Entenda a importância de dedicar tempo à recuperação após treinos, jogos e lesões e, assim, melhorar seu desempenho


POR QUE se discute tanto a questão do calendário? Qual a relação entre quantidade de torneios e a incidência de lesões? Tão importante quanto a definição do calendário anual e o planejamento de seus treinos, a recuperação é fundamental no mecanismo de adaptação do organismo às sobrecargas e na melhora do desempenho e rendimento esportivo. Os avanços científicos e tecnológicos têm papel importante nas mudanças do estilo do jogo de tênis. Novos métodos de avaliação e treinamento contribuem para o melhor desempenho físico dos atletas, que buscam incansavelmente mais força, resistência, potência e velocidade em seus movimentos.

Entretanto, pouco se discute sobre a importância da recuperação como parte do planejamento diário, semanal e mesmo anual. Na maioria das vezes, as orientações limitam-se às horas de sono, ao período de descanso semanal (day off) e às férias. O processo de recuperação é multifatorial: aspectos nutricionais, psicológicos, mentais e emocionais são exemplos de tópicos que devem ser considerados na recuperação do tenista após treino, jogos ou lesões. A recuperação pode ser definida como o processo de retorno às condições de base para suportar uma nova carga de esforço, seja físico, seja mental.


FATORES INTERNOS E EXTERNOS
O tipo de piso, estilo do jogador e o ambiente também são fatores que interferem na percepção da fadiga e na escolha da técnica de recuperação. Um jogo prolongado em um dia de calor intenso pode levar à desidratação e hipertermia. Nessas condições, o volume sanguíneo torna-se menor, a sobrecarga do sistema nervoso acentua-se resultando em fadiga precoce, perda de força, velocidade, agilidade e coordenação, além da necessidade de maior tempo de recuperação. Alguns fatores que influenciam a recuperação do jogador são conhecidos:
- fatores internos: condicionamento físico, condições nutricionais e hidratação;
- fatores externos: intensidade e tempo de jogo ou treino, condições ambientais, tipos de piso, equipamentos utilizados.

A) CONDICIONAMENTO FÍSICO:
Um dos pontos mais frequentemente observados são os casos de dor muscular após um treino intenso, jogo prolongado ou durante a fase de correção do gesto esportivo. A ocorrência de dor muscular nesses casos é esperada e, portanto, intervenções de recuperação devem fazer parte do programa do jogador.

Fotos: Ron C. Angle
A recuperação pode ser definida como o processo de retorno às condições de base para suportar uma nova carga de esforço, seja físico, seja mental

As lesões ocorrem mais comumente na fase de treino de potência muscular, quando os músculos são exigidos ao extremo, resultando em microlesões e, em longo prazo, em adaptação gradual do corpo àquele nível de trabalho. Logo, os exercícios envolvidos para o desenvolvimento dessa qualidade física não devem ser realizados diariamente, muito menos sem o preparo prévio, ou seja, sem as condições adequadas de força e resistência muscular, bem como o domínio sobre a técnica do movimento. Recomenda-se um intervalo de 48 a 72 horas entre as sessões de exercícios excêntricos para evitar a ocorrência de lesões.

B) ASPECTOS NUTRICIONAIS:
A reserva de glicogênio muscular para a produção de energia é a base para o bom desempenho físico, pois é a principal fonte energética no metabolismo anaeróbico, predominante na prática do tênis. A falta de reserva é responsável pela sensação de fadiga, perda de desempenho e predisposição às lesões.
A avaliação nutricional auxilia na identificação de suas necessidades alimentares e nas alterações que ocorrem ao longo da temporada ou mesmo após um período de treino ou jogo. Às vésperas da competição ou treino mais intenso, aumente a proporção de carboidratos em seu cardápio. Estudos mostram que o melhor período para reposição de carboidratos são os 30 minutos seguintes à prática de atividade física.

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C) HIDRATAÇÃO:
A desidratação afeta não somente a parte física – com sensação de fraqueza e desequilíbrio –, mas altera a capacidade de atenção e concentração e pode provocar dor de cabeça e tontura. A sede não é um bom parâmetro para indicar o grau de desidratação. Esse alerta do organismo para a reposição hídrica ocorre quando já aconteceu a perda de aproximadamente um litro e meio de líquido corporal. Assim, a hidratação deve começar até três horas antes da prática esportiva. A capacidade de reidratação durante o jogo não supera a velocidade de perda de líquidos. Dessa forma, os cuidados devem continuar mesmo após o final do esforço físico.

DURANTE A COMPETIÇÃO
Quando há mais de um jogo por dia, procure otimizar sua recuperação entre os jogos. Um banho frio de 10 minutos ajuda na recuperação muscular e tem efeito semelhante aos banhos de imersão. Uma série de alongamento global pode ser realizada com o objetivo de recuperar o comprimento das fibras musculares.

Cada exercício deve ser feito por 10 segundos. Os exercícios com elástico, com menor número de repetições, são realizados para reativar a musculatura. Os cuidados de hidratação e alimentação devem seguir as recomendações anteriores. Caso não haja tempo para uma refeição e tempo de digestão, a reposição de carboidratos pode ser feita com bebidas repositoras.




A PREVENÇÃO AUXILIAR A RECUPERAÇÃO
A atuação na prevenção de lesões também pode ser considerada como intervenção visando a boa recuperação do atleta uma vez que evita o uso inadequado do sistema músculo-esquelético. Dois pontos frequentemente abordados são a estabilização do core e da escápula.

A estabilização lombopélvica (core) tem sido mais divulgada e praticada nos últimos anos. O fortalecimento da musculatura que sustenta o peso corporal é de extrema importância quando se pensa em cadeia cinética. Este conceito refere-se à contração coordenada e sequencial de músculos para desenvolver determinado movimento. A cadeia cinética do saque, por exemplo, envolve desde a contração dos músculos da perna até os músculos do antebraço, passando pelos quadris, coluna, ombro e braço. O jogador que apresenta déficit de força dos músculos do quadril e tronco exigirá até 80% a mais do ombro para obter os mesmos resultados.

Fotos: Ron C. Angle

Os ombros do tenista tendem a ser assimétricos. A escápula do lado dominante tende a se afastar do tronco em função da exigência predominante dos músculos da porção anterior do ombro. Os músculos trapézio, serrátil anterior e rombóides são os que mais demonstram desgaste após um jogo. O trabalho regular de estabilização da escápula permite a recuperação precoce dos músculos que atuam sobre o ombro, bem como reduzem a ocorrência de lesões.

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O treino de flexibilidade deve ser realizado pelo menos uma vez por semana. O tipo de contração muscular conhecido como excêntrica é o principal responsável pela perda gradual e adaptativa do movimento articular. Tenistas costumam apresentam menor grau de movimento das articulações do ombro, quadris e coluna. Essa característica contribui para a ocorrência de lesões por sobrecarga ou quando o movimento ocorre fora dos padrões como, por exemplo, modificação técnica de um golpe.

O músculo demora até três dias para voltar ao seu comprimento normal após uma contração excêntrica. Daí se percebe a importância da recuperação muscular com treinos específicos de flexibilidade.

Dicas

- Quanto mais novo, maior a necessidade de sono – durma de 7 a 10 horas por noite;

- Faça refeições no mesmo horário, pois também é um processo de adaptação corporal;

- Tire um dia de descanso semanal, quando se deve evitar qualquer atividade relacionada ao esporte, permitindo o descanso mental;

- Utilize técnicas como hidroterapia, massagem e acupuntura;

- Avalie e controle o nível de seu condicionamento físico, nutricional e hidratação;

- Avalie com antecedência as condições de viagem (instalações do local do torneio, clima, tipo de alimentação, infraestrutura);

- Busque suporte na equipe multiprofissional (médico, preparador físico, fisioterapeuta, psicólogo, nutricionista, fisiologista).

Fotos: Ron C. Angle

TRABALHO MULTIDISCIPLINAR
O trabalho da equipe multidisciplinar é cada vez mais difundido e tem seu valor na integração das informações e planejamento global das atividades do tenista. Ajustes no calendário de competições e na intensidade, volume e frequência do treinamento são necessários conforme o comportamento do tenista frente aos desafios do dia-a-dia ou competição. O desequilíbrio entre a quantidade do esforço e qualidade de recuperação pode resultar na síndrome de “overtraining”, condição clínica pouco lembrada ou diagnosticada quando o atleta apresenta queda no seu rendimento. Para obter o melhor rendimento, não basta treinar muito. A recuperação adequada é fundamental para o desenvolvimento das qualidades físicas e mentais do tenista.

Colaborou com o artigo o médico, Gilbert Bang

Ricardo Takahashi

Publicado em 19 de Abril de 2010 às 11:40


Preparação Física/Fisioterapia

Artigo publicado nesta revista