Coluna Fábio Oliveira

O rei do saibro também é o rei das dores no joelho

Rafael Nadal sofreu com algumas lesões durante seus 13 títulos de Roland Garros


Foto: Reprodução Twitter/Rafaholics

Vem aí Roland Garros! É impossível falar do Aberto Francês sem mencionar Rafael Nadal, campeão da Taça dos Mosqueteiros em 13 ocasiões nos últimos 16 anos.

Na “Era Open” do Grand Slam do saibro, Nadal é recordista em número de vitórias, com 100 triunfos. Mas nem só de vitórias se faz um campeão!

O touro Miura é o recordista também em número de lesões. Com um histórico de mais de 20 lesões oficialmente diagnosticadas, o espanhol é altamente reconhecido e invejado por muitos tenistas pela sua capacidade de recuperação física. Essa característica em muito tem contribuído para que ele, aos 34 anos, seja ainda apontado como favorito para conquistar o título do principal torneio da temporada de saibro.

Um infográfico aponta todos os segmentos corporais e articulações as quais Nadal se lesionou ao longo de sua carreira. Vale lembrar que Nadal nunca escondeu que sua maior preocupação sempre foram os joelhos. Pode parecer desculpas de perdedor, mas é inegável que as lesões nos joelhos sempre tiveram um papel importante nas poucas derrotas que o tenista Espanhol acumula sob a superfície de argila.

Mas as lesões nos joelhos não são uma exclusividade de Rafael Nadal. Grande parte dos jogadores do circuito profissional, incluindo Juan Martin Del Potro, Bianca Andreescu, Elina Svitolina, Stan Wawrinka e, até mesmo, Roger Federer, já sofreram com dores nos joelhos.

Sabemos que existem vários tipos de lesão no joelho, que variam de conforme a estrutura, tecido lesionado e sintomas provocados. Por esse motivo, listamos 3 lesões nos joelhos, que são frequentemente observadas no circuito profissional de tênis, mas que também são muito comuns em tenistas amadores, independente do seu nível de jogo.

  1. Tendinopatia patelar, também chamada joelho de saltador (em inglês, jumper’s knee), que é a principal inimiga de Nadal
  2. Dor patelofemoral
  3. Síndrome do trato iliotibial (também conhecida como joelho de corredor, em inglês runners’ knee)


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Tendinopatia patelar

A tendinopatia patelar é uma lesão provocada por sobrecarga excessiva do tendão patelar. Essa sobrecarga resulta em rupturas microscópicas que ocorrem logo abaixo da patela, iniciando um processo de degeneração do tendão patelar.

Geralmente, a tendinopatia patelar se caracteriza por dor aguda e bem localizada abaixo da patela. O tenista é capaz de apontar com precisão, o local exato da dor, de modo que, qualquer pressão sobre este ponto seja altamente doloroso.

Durante a prática do tênis, a dor surge principalmente ao saltar após o saque, ao fazer sprint, na mudança de direção brusca após uma corrida para alcançar a bola, e algumas vezes no deslocamento lateral com deslizamentos em que os joelhos estão fletidos. Apesar disso, vale também considerar que é muito comum a intensidade da dor ser maior logo após a prática do tênis.

Algumas condições tais como baixa flexibilidade da musculatura anterior e posterior da coxa (quadríceps e isquiotibiais, respectivamente) e desalinhamentos anatômicos na perna e nos pés (perna arqueada, pés planos etc.) podem ser fontes de sobrecarga extra ao tendão, favorecendo o surgimento da tendinopatia patelar.

Em tenistas, a tendinopatia patelar também está associada à execução excessiva de contrações musculares explosivas realizadas durante uma partida de tênis, seja para fazer um sprint, correr, ou mudar de direção bruscamente.

Dor patelofemoral

A dor patelofemoral é causada pelo contato anormal ou excessivo da patela com o fêmur devido à uma tração lateral da patela. Essa tração lateral concentra a pressão na parte lateral da patela ao invés de permitir a distribuição da pressão por toda a patela. Essa lesão também pode ser causada por trauma direto como as quedas sobre o joelho. A característica principal dessa lesão é a dor na parte da frente do joelho que se agrava durante atividades que envolvem agachamentos, descidas em superfícies inclinadas, descidas de escadas, e pedalar. Tenistas que jogam no estilo saque-voleio são os mais prejudicados por esta lesão, principalmente quando precisam realizar um voleio baixo, que requer flexão profunda dos joelhos. Embora a continuidade da prática do tênis não leve a condições irreversíveis ou danos irreparáveis ao joelho, a recomendação inicial é evitar aquelas atividades que possam ser agressivas (causadoras de dor) e que aumentem a sobrecarga nos joelhos. Nesse sentido, é importante fazer ajustes aos treinos e, algumas vezes, ao seu estilo de jogo.

Síndrome do Trato Iliotibial

A síndrome do trato iliotibial ou joelho de corredor, também é uma lesão causada por sobrecarga excessiva. Neste caso, a estrutura sobrecarregada é uma banda larga e rígida de fibras que desce pela parte lateral da coxa, passa pelo joelho, e se insere na tíbia. Os sintomas mais comuns desta lesão são dor local, algumas vezes irradiada em direção à coxa, e inchaço na região lateral do joelho. Ambos são causados pela fricção da banda iliotibial com a parte lateral do fêmur, logo acima do joelho. Fraqueza da musculatura dos glúteos e quadril são fatores de risco importantes para o surgimento da síndrome do trato iliotibial. Um desalinhamento da pelve relacionado à essas fraquezas musculares podem tensionar ainda mais o trato iliotibial. Além disso, pernas arqueadas, pés em pronação excessiva, utilização de calçados desproporcionalmente, e corrida em superfícies irregulares também podem contribuir para o surgimento desta lesão. Todos esses fatores, geralmente, adicionam tensão à banda iliotibial e, assim, aumentam a fricção. Tenistas tendem a apresentar mais dores durante os treinos de corrida fora da quadra do que jogando tênis.


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Processo de reabilitação

O processo de reabilitação em si é sempre individualizado e, portanto, varia bastante de pessoa a pessoa. No entanto, existe uma base para o tratamento das lesões nos joelhos de um tenista. O plano de reabilitação é, geralmente, dividido em 3 fases:

  1. Restauração da função normal (neste caso, trata-se de gestos e movimentos tenísticos prejudicados pela lesão). A normalização da função deve ser buscada através do reequilíbrio muscular do quadril, coxa e perna, alongamento e fortalecimento muscular, realinhamento da patela durante atividades dinâmicas, aprimoramento da coordenação e controle motor, treino de estabilidade e equilíbrio corporal.
  2. Consolidação. Uma vez que todas as atividades da fase 1 podem ser realizadas sem dor ou desconforto, o tenista pode começar a pensar em iniciar os treinos de movimentação em quadra de forma a consolidar o trabalho realizado anteriormente. Este é o momento para se readaptar às condições impostas pelo tênis.
  3. Retorno aos treinos e jogos. Em lesões diagnosticadas como leve, não há necessidade de parar de praticar o tênis. Apenas com algumas adaptações, implementadas levando em consideração as restrições impostas pela lesão, o tenista consegue se manter jogando tênis sem agravar a lesão. No caso de lesões mais graves, o retorno aos treinos e jogos pode variar entre 6 semanas e 3 meses e, pode sim, requerer a interrupção de treinos e jogos.


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Orientações para tenistas amadores

Em todos os tipos de lesão no joelho, a dor é um importante sinal. O limiar de dor deve ser sempre respeitado de forma a não comprometer o processo de reabilitação. Neste período, o aumento da carga sobre o joelho deve ser feito de maneira gradual e, portanto, os exercícios mais intensos só devem ser retomados quando aquela dor mais intensa tiver desaparecido ou reduzida à uma dor leve.

Na presença de dor no joelho constante, é altamente recomendável uma mudança nas atividades em quadra, o que algumas vezes inclui reduzir o volume de treinos em quadra e/ou jogos. Adicionalmente, apesar de começarem a surgir algumas divergências sobre a sua utilização (pelo acrônimo Peace & Love) o gelo ainda é um aliado no combate à inflamação, além de ser um dos métodos preferidos dos tenistas profissionais para redução da dor aguda.

Buscar o auxílio de um fisioterapeuta é uma medida indispensável sempre que o tenista sente um incômodo ou tenha dores nos joelhos até fora de quadra.

De uma forma bem resumida, as minhas recomendações para tenistas amadores com dores nos joelhos, são:

  1. Inicialmente, evite todas as atividades que aumentam a tensão no joelho, tais como os sprints, saltos, voleios baixos, saque-voleio. Essas atividades podem ser retomadas gradualmente quando houver remissão da dor intensa.
  2. É recomendável que o retorno aos treinos em quadra seja realizado de maneira gradual no que se refere à volume e intensidade. Controlar a carga e respeitar o seu limite, principalmente em relação à dor, é realmente necessário.
  3. Retome os treinos inicialmente em quadras de saibro e evite os pisos duros. O pico de tensão sobre os joelhos é maior em superfícies que não permitem deslizamentos, tais como os pisos duros, em comparação àquelas em que possível deslizar para alcançar a bola.
  4. Adapte o programa de treino a atividades que requeiram uma movimentação limitada à 2m2 até o processo de recuperação estar finalizado com sucesso. Assim, o “footwork” pode continuar a ser desenvolvido sem expor os joelhos a cargas e tensões excessivas.
  5. Se a adaptação aos treinos for bem sucedida, o tenista pode acrescentar mais exercícios dinâmicos (tennis drills) em uma distância maior.
  6. Competidores, devem retornar aos torneios apenas quando conseguirem fazer um jogo-treino completo sem incômodos.

Prevenção de reincidências

Por mais clichê que seja, é importante relembrar que um tenista precisa se preparar fisicamente para as demandas do seu nível de jogo. Tal preparação inclui muito alongamento e fortalecimento muscular, principalmente para tronco e membros inferiores. Ainda assim, nem sempre é possível prevenir a recorrência de uma lesão no joelho. No entanto, algumas práticas podem reduzir esta possibilidade. Vamos a elas:

A realização de uma boa rotina de aquecimento pré-treinos e jogos, incluindo alongamento, mobilização articular e mobilidade corporal geral é indispensável para prevenir a reincidência de lesões nos joelhos do tenista. A intensidade do aquecimento pré-jogo deve aumentar de forma gradual, permitindo que o seu corpo se ajuste às condições climáticas, ao ambiente, à superfície, à bola e aos golpes do seu oponente.

É importante estar em boa forma física e evitar treinos quando estiver cansado. A fadiga deteriora as condições físicas e reduz a força muscular, favorecendo a ocorrência de falhas musculares, o que pode resultar em lesão.

A utilização de calçados adequados para a superfície e ajustados ao tamanho do seu pé também é essencial na prevenção de reincidências.

Pedalar regularmente com baixa resistência e sob superfícies planas, também é uma boa atividade para manter o bom funcionamento dos joelhos. No entanto, deve-se assegurar que o selim não está muito alto, nem muito recuado.

Em casos de alterações ou desalinhamentos anatômicos importantes, um especialista deve ser consultado para avaliar a necessidade de utilização de uma órtese.

Finalmente, as bandagens rígidas são sempre recomendáveis e aumentam a autoconfiança.

Se você ama jogar tênis, tenha todas essas dicas e informações em mente. Elas poderão te ajudara evitar ou se livrar das dores nos joelhos.

Em caso de dúvidas, entre em contato com o autor através de um dos meios de comunicações disponíveis abaixo.

 

Dr. Fábio Carlos Lucas de Oliveira
Fisioterapeuta na ATP Tour • PhD em Reabilitação
E-mail | LinkedIn | Instagram @fabiofisiosports

por Fábio Oliveira

Publicado em 29 de Maio de 2021 às 23:06


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