Capitã do Brasil na Fed Cup ressaltou união como diferencial da equipe e definiu fator casa como algo que pode ajudar no duelo frente a Alemanha de Angelique Kerber
Da redação em 4 de Dezembro de 2019 às 12:55
Foto: Daniel Kopatsch/ITF
Roberta Burzagli é a capitã do Brasil na Fed Cup, torneio entre países promovido pela ITF, a Federação Internacional de Tênis. A paulista assumiu o comando no final de 2018, substituindo Fernando Roese, que comandou as meninas entre 2016 e 2018.
Leia mais
+ Federer terá seu rosto estampado em moeda suíça
+ Retrospectiva 2019: Roland Garros teve volta de Federer, Barty brilhando e Nadal no topo
Um ano depois, os resultados da comandante do Brasil foram positivos. Ela liderou o equipe para o título no Zonal Americano, conduzindo o time que tinha Beatriz Haddad Maia, Carol Meligeni, Luisa Stefani, Gabriela Cé e Thaisa Pedretti para o playoff do Grupo Mundial, onde o país acabou derrotado pela forte equipe da Eslováquia.
Apesar do revés, o time mostrou boa evolução e viu tenistas como Meligeni e Stefani serem medalhistas nos Jogos Pan-Americano de Lima, no Peru. Em entrevista exclusiva para a Revista Tênis, Burzagli contou como foi liderar a equipe e ressaltou o talento das meninas do Brasil.
foi destaque no tênis juvenil no anos 80. Roberta jogou profissionalmente dos 15 aos 19 anos, mas parou e tempo depois se tornou técnica do quadro da ITF no Grand Slam Development Fund, onde está no cargo há 14 anos.
Como foi a experiência neste primeiro ano como capitã da Fed?
Fiquei super feliz com o convite. Faz alguns uns anos que trabalho para a ITF, na maioria das vezes com meninas estrangeiras. A Carol já esteve na equipe quando era juvenil, a Luísa Stefani também. Mas, assim, a maioria das vezes eu trabalhei com jogadoras não brasileiras. Então, fico muito feliz de passar a experiência de todos esses anos para as nossas jogadoras
Interessante ter acompanhado elas desde o juvenil e agora ver elas na equipe principal do país. Como você viu, principalmente, a questão de jogar contra a Eslováquia, que tem tenistas da elite do tênis, em um playoff de Grupo Mundial que tinha um novo ambiente e o novos desafios?
Primeiro eu queria falar que eu acho que lá em Medellín, na primeira fase, o que contou muito muito foi a união delas. Nossa união da equipe ali no momento nos ajudou a vencer países até favoritos.
A geração delas é muito unida. Uma sempre tenta ajudar a outra e isso foi o principal para termos vencido lá na Colômbia. E nós levamos essa mesma união lá para Eslováquia. Acontece que a equipe delas jogou com todas as jogadoras que ela têm, que estão em outro nível de torneios. Mas, foi uma experiência muito boa para elas e de repente na próxima fase os resultados podem ser diferentes
Como preparar a equipe para um confronto contra a Alemanha, que tem tenistas multi campeãs como a Angelique Kerber? A questão de jogar no Brasil vai ser uma das armas para motivar?
Eu acho que uma das coisas principais é esta. Vamos jogar no Brasil com a torcida do nosso lado e também já temos a experiência de um confronto como esse contra a Eslováquia. Apesar que, lógico, a equipe que vamos enfrentar é uma equipe muito forte mas em competições de país contra país entra muito a união da equipe e isso a gente tem muito forte.
Vimos essa harmonia presente nas duas etapas da Fed Cup e também no Pan, em que tivemos resultados bastante positivos. Carol e a Luísa quase pegaram a prata, Carol também ficou com o bronze no simples.
A Carol jogou muito bem. Todos os jogos que ela venceu em simples, ela se superou. Contra tenistas muito boas, que ela nunca havia ganho antes. O jogo em que perdeu na semifinal ela quase levou o primeiro set e se ela tivesse ganho acho que tudo seria diferente. Foi tudo muito bom. Entrou também a união, tínhamos um clima muito positivo lá. Mesmo as coisas negativas a gente melhorava.
Todo mundo comenta que a Carol se destaca e joga melhor quando está defendendo o Brasil. Você concorda?
É incrível mesmo. Ela cresce muito. Ela adora jogar pelo Brasil usa muito o coração, até foi premiada pela Fed Cup. E Copa Davis, Fed Cup neste tipo de torneio tudo pode acontecer.
Pode se dizer que tênis de equipe e tênis de circuito são dois esportes diferentes?
Sim e elas estão acostumadas com isso. Devido as condições financeiras é muito difícil viajar com técnico, tem que ir sempre sozinhas. Então, quando estão juntas com gente apoiando e a plateia aplaudindo em uma competição como essa é um ponto muito positivo. Elas crescem bastante.
Foto: Federico Ruiz
Foi um ano com bons resultados...
Mesmo a Gabriela Cé teve resultados ótimos, o ranking dela hoje é 222. Ela não foi para o Pan-Americano porque estava visando o calendário escolhido e teve bons jogos também. A Bia também teve, ganhou da Muguruza e entrou no TOP 100 de novo.
O que as meninas podem fazer para levar este bom momento, principalmente em competições para o circuito?
Eu acho que essa união elas também estão levando para os torneios. Porque todas estão tendo resultados positivos. A Thaísa Pedretti também, foi para a Colômbia com a gente, foi para a Eslováquia e depois fez ótimos resultados em Cancún. É uma somatória de coisas positivas que no fim elas também estão levando para os torneios.
Falando da Luísa, ela está vindo em uma sequência muito boa jogando em duplas. Acredita que ela pode ir longe nesta categoria?
Eu acho que ela pode ir muito longe. O top 100 é pouco para ela. Entre as 50 com certeza ela vai chegar e além disso também. Ela está gostando bastante dessa parceria (a americana Hayley Carter) e quem sabe continue por mais tempo. É importante achar uma parceira que jogue sempre junto.
A Carol teve uma semana muito boa aqui no Future de São Paulo, onde foi campeã após vitória sobre a Thaisa Pedretti. O quão importante é ter um resultado bom defendendo o país e logo em seguida vir jogar aqui? Qual a falta que torneios Futures e Challengers fazem para a ajudar na transição dos tenistas e até ter torneios para a torcida local ver as jogadoras.
É difícil, não tendo torneios aqui você precisa viajar e isso significa gastar bastante dinheiro porque precisa ir para Europa e passar um tempo lá jogando. Sempre sozinha, sem técnico. E é diferente né? Muitas vezes você está na Europa jogando e as pessoas não conseguem acompanhar seus resultados, você só fica seguindo.
Vamos dizer, se elas estão em São Paulo o pessoal vem assistir. Tem a torcida e eles assistem de perto as meninas jogando. Então, é muito importante para elas e para os patrocinadores delas terem o público assistindo. É muito legal. Isso é o que as europeias têm que a gente não tem. Às vezes você tá na sua casa em Praga e vai jogar em outro país, uma hora e meia de distância você pode voltar para casa. Sua família pode ir assistir. Seus amigos podem ir assistir.
É importante que elas estejam unidas. Por exemplo, vai na Europa jogar um torneio a Carol e a Gabriela Cé. Uma acaba virando treinadora da outra também. É importante a união que elas têm hoje, por causa disso.
Eu já fui, no passado, técnica auxiliar com o Penizza e a gente já teve muita equipe difícil. Nem se falavam. Nos outros países sei que tem muitas jogadoras que não se falam uma com a outra. Para o treinador, isto é, muito díficil. Como você vai aquecer antes de um jogo? Como vai por uma para torcer para a outra? Porque às vezes uma quer que a outra perca. Na nossa equipe não existe isso. Só positividade. Tem de ser ressaltado. A união não fica só entre elas, a comissão técnica também é muito amiga das meninas. O Paulo que é o físico, o Penizza, a gente é muito amigo.
Foto: Divulgação
Você disse que as meninas já tinham esta união de fora. Mas com toda a sua experiência, você fez algo para isso crescer ou deixou acontecer?
Acho que a festa que teve lá na Colômbia foi muito especial. Realmente não sei explicar o que eu ou o que fulano fez. Acho que tenho a experiência já há 15 anos de como lidar com meninas, o que não é fácil. Um grupo de meninos é muito mais tranquilo, mas acho que lá na Colômbia foi muito legal. Elas levaram violão, tocaram e fizeram música para a gente da comissão no técnica. Mas não sei pontuar o que eu ou Peniza fizemos. É uma coisa inexplicável que fica no ar e vai lidando com as situações
Todas as meninas falaram que o clima era uma coisa que pesava muito antes da sua chegada. Elas gostaram muito de você estar lá, claro que Fernandão também tem méritos. Mas, sua presença lá também pelo fato de ser uma mulher foi algo que deu uma liga e ajudou a dar certo.
Fico contente que elas gostem da minha presença. Só quero o bem delas, em todos os sentidos. E estou aqui assistindo elas, faz parte do meu trabalho essa presença. Então, no meio dos meus compromissos, dou um jeito de estar presente.
Você já tem alguns nomes no radar. Pretende manter a equipe que esteve em 2019, ou acha que vai colocar nomes novos?
Acho que ainda é cedo para dizer, ainda faltam alguns meses. Mas o que eu posso afirmar é que eu e o Peniza vamos priorizar a união do grupo. Acho esse um dos fatores principais.
Em outros países as tenistas conseguem jogar em casa e treinar também. Entre as brasileiras, a Carol está em Buenos Aires e a Luísa nos EUA. O quanto que a rotina de treino no próprio país faz a diferença?
Também ajuda. Quando você está em casa, vai para o treino e está no seu habitat. Elas estão fora, longe da família, por mais que onde elas estejam tenha gente que as apoiem como os amigos, etc. Mas é diferente. Sua base acaba sendo outra e você tem sua base com a sua família.
Mas, é difícil a gente mora em um país grande. Carol é de campinas, Luísa de São Paulo, mas os pais estão no méxico. Lá fora tem mais gente para treinar, bater bola. É um desgaste emocional que elas têm treinando e poderiam ter jogando. Mas, elas estão acostumadas a viajar, por exemplo.
Estar longe afeta essa questão emocional para o circuito?
Tem gente que esse fator influencia mais e gente que influencia menos. A Luísa está super acostumada e isso pega menos do que para outras. A Gabi Cé mora em São José dos Campos. Ainda mais para mulher e menina que o emocional grita mais do que os homens, então, não é fácil. Tem a questão também que os meninos têm a academia Tennis Route, com tenistas profissionais. No Brasil a gente não tem um centro [para o tênis feminino].
Então não é muito fácil ter um grupo de mulheres. Como eu disse, trabalho há 15 anos com diversas meninas de diversas culturas e se você tem 3 meninas juntas, vai ter dois grupos com certeza. Por isso eu digo que a coisa principal deste grupo de hoje é que elas são unidas. Uma ajuda a outra porque não é fácil ter um grupo de meninas saudável.