Novela
Mesmo sendo ficção, novela contribui para a disseminação do esporte
UMA MENINA DE APENAS 17 ANOS é apontada como a grande promessa do tênis feminino brasileiro. Apesar da pouca idade, a atleta possui uma treinadora exclusiva, que a acompanha em todos os jogos, sempre em estádios lotados, e nunca antes das 18 horas, com transmissão para todo o Brasil. Esta é Ana Fonseca, interpretada pela atriz Fernanda Vasconcellos na telenovela "A Vida da Gente", exibida pela Rede Globo.
Embora a trama apresente aspectos distantes daqueles que nossas tenistas encontram na carreira, a iniciativa é bem-vinda para as atletas, público e organizadores dos eventos disputados no Brasil. "O brasileiro não apenas assiste, mas vive a novela. Com isso, mais gente vai se interessar pelo tênis, que estava esquecido desde a saída do Guga (que se aposentou em 2008)", afirma Maria Fernanda Alves, atual 370a do ranking, e que por muitos anos foi a número um do País na lista da WTA.
O resultado da exposição do tênis em canal aberto, mesmo que na ficção já começa a ser notado. "Sempre andei muito tranquilo no meu prédio, agora todo mundo vem puxar conversa sobre tênis depois de ter visto os primeiros capítulos da novela", diz Dácio Campos, comentarista do canal SporTV, que "atuou" fazendo seu próprio papel, comentando o jogo de Ana Fonseca.
Nos clubes e academias, as mulheres também têm voltado a se interessar pelo esporte, especialmente depois que a atriz que interpreta a tenista admitiu em entrevistas que devido ao tênis conseguiu "ficar mais sequinha", com pernas torneadas e cintura mais fina, além de um melhor preparo físico. "Na semana seguinte, sempre aparecem 5 ou 6 novas alunas na escolinha do clube", comenta Ricardo Camargo, um dos promotores do principal circuito de tênis feminino realizado no Brasil.
Fernanda Vasconcellos também admitiu ter se aproximado mais do marido, o ator Henri Castelli, que, para lhe apoiar, foi com ela para a quadra e pegou gosto pelo esporte. "A gente espera que o público se anime a venha conhecer o esporte e não ficar só vendo pela TV", diz Marina Danzini, jovem tenista, que está dando seus primeiros passos rumo à profissionalização do esporte.
Atriz diz que tênis ajudou a "secar" gordurinhas e tornear as pernas
Vinte aces? "Vigésimo ace de Ana Fonseca!" A situação descrita pelo narrador Eusébio Rezende ainda no primeiro capítulo da novela não costuma fazer parte do roteiro de uma partida de tênis feminino. "O scout da Ana Fonseca me inspirou a treinar mais e melhorar o meu saque", brinca a tenista Carla Forte que, com os mesmos 17 anos da personagem do folhetim televisivo, não se recorda de ter repetido a estatística, que é tarefa complicada até mesmo para grandes sacadoras do circuito feminino, casos das irmãs Venus e Serena Williams, da russa Nadia Petrova, da alemã Sabine Lisicki ou da canadense Rebecca Marino. Na atual temporada, a única a atingir essa marca foi a britânica Naomi Broady, de 21 anos, 1,89m e 209ª do ranking da WTA. Broady anotou vinte pontos de saque na partida contra juvenil a francesa Caroline Garcia, válida pela primeira rodada do torneio de Birmingham, em quadras de grama. |
Juliana Gonçalves "jogou contra Ana Fonseca" |
Verdade ou mentira?
"Esta exposição na tevê aberta, mesmo que na ficção, mostra para as meninas mais jovens que existe a possibilidade de se ter uma carreira como tenista profissional", aponta Camargo. Com um calendário de 22 torneios por ano, sendo 19 deles com premiação de US$ 10 mil e três de US$ 25 mil, o circuito nacional é uma porta de entrada para o tênis profissional e tem como objetivo incentivar as jogadoras iniciantes a somar os primeiros pontos no ranking da WTA.
A expectativa, segundo Camargo, é de que, em cinco anos, o Brasil tenha duas atletas no top 100 e outras quatro entre as 200 melhores do mundo. Um dos motivos para apostar nesse quadro é o processo de envelhecimento do tênis feminino. Diferentemente das duas últimas décadas, quando tenistas ainda adolescentes surgiam vencendo grandes torneios, o cenário atual tem exibido casos como os de Samantha Stosur, Francesca Schiavone e Na Li, que ergueram o primeiro troféu de Grand Slam aos 27, 28 e 29 anos respectivamente.
Apesar de algumas situações da novela não serem reais, alguns dramas da personagem acontecem com qualquer tenista
"Antes, se a menina que chegava aos 18 ou 19 anos e ainda não despontava, dizia-se que não daria em nada. Hoje, existem muitas jogadoras que atingem o melhor momento na carreira mais tarde", garante o promotor, projetando o desenvolvimento de tenistas da geração de Vivian Segnini, Ana Clara Duarte e Roxane Vaisemberg, todas hoje com 22 anos. "Não podemos abandonar jogadoras com ranking melhor. Por isso, o foco para o ano que vem é promover eventos com premiação maior", garante o ex-tenista profissional.
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Verdade ou mentira?
Se a "realidade" apresentada na novela não bate com a da vida real em todos os aspectos - viajar ao lado do treinador é regalia apenas para as melhores do ranking e estádios lotados também, além isso, mesmo as principais tenistas do mundo não fazem 20 aces em uma partida (veja box) -, alguns dramas psicológicos são, sim, muito reais, como, por exemplo, a vida, muitas vezes, solitária e sem amigos que leva a impasses como os da personagem Ana Fonseca, que não sabe se vai se dedicar ao tênis ou "ter uma vida normal como todo adolescente", com namorados, festas, escola etc.
Como toda "tenista real", Ana Fonseca também sente a pressão dos pais - e, às vezes, do treinador também - por ganhar as partidas e treinar mais. Como qualquer menina que quer tentar se profissionalizar nesse esporte, ela sofre o dilema de ter de que optar por uma vida profissional muito cedo, o que vai requerer uma conduta espartana pouco comum para pessoas dessa idade.
Então, se a novela, às vezes, "mente" ao mostrar uma realidade glamorosa e vitoriosa do tênis em algumas cenas de torneios, ela traz à tona uma verdade dolorida do esporte que é o drama psicológico pelo qual qualquer atleta passa, seja mulher, seja homem, na tentativa de ser um tenista profissional.
Dias de estrela Mas, para a carioca Juliana Gonçalves, de 17 anos, a experiência foi além das brincadeiras entre amigos. Escolhida para ser a adversária da protagonista da trama em uma das cenas, Juliana teve de reproduzir alguns dos movimentos que faz em quadra, já que as sequências de jogo foram produzidas por computação gráfica. Chamada de "artista de novela" por suas colegas, Juliana deixou claro que a carreira de atriz já faz parte do passado. "Gostei muito de participar da cena, mas o que quero mesmo é jogar tênis". |
Mãe, tenista e sucesso. é possível? Kim Clijsters e Lindsay Davenport se destacam na história recente do tênis feminino entre as atletas que conseguiram retornar às quadras em alto nível depois de se tornarem mães. Jogadora experiente, Nanda Alves recomenda que a carreira deve ser priorizada, mas afirma conhecer tenistas que tiveram de deixar as quadras, mesmo que temporariamente, por conta dos filhos. "Para a mulher é muito complicado, porque não se trata apenas de uma questão familiar. O corpo muda durante os períodos de gestação e amamentação, e isso pode afetar a condição física da atleta." |
Publicado em 21 de Outubro de 2011 às 10:36