Transição de sucesso

Luisa Stefani, a grande surpresa dos torneios brasileiros

ROSTOS COBERTOS DE SUOR, mas que revelam os primeiros fios de barba recém-nascidos. Roupas marcadas de laranja pelo pó de tijolo que cisma em não sair das camisetas, nem das meias. "E o pior é que sou eu quem lavo", repara a mãe na arquibancada. Meninas em pânico, com a cara embrulhada em toalhas tentando esconder (sem sucesso) o choro em meio às malditas espinhas que teimam em brotar na face. Ah, a adolescência...

Uma época de transformações na vida dos mais jovens que já se negam a serem taxados de crianças, porém que ainda não têm maturidade suficiente para encarar os desafios da vida adulta. Fase de transições em que enfrentam mudanças no corpo, no meio em que vivem, nada é fixo. Por isso, é normal vê-los rindo em altos papos na rodinha estilo "clube do Bolinha" para os garotos, enquanto que as meninas não param de opinar sobre o cabelo no "grupo Luluzinha" e, é claro, sem deixar o celular quieto um segundo.

Nesse estágio, os torneios juvenis desempenham papel importante na formação do jovem atleta e o Banana Bowl, em sua 43ª edição, e o Campeonato Internacional Juvenil de Tênis, mais conhecido como "Copa Gerdau", em seu 30º ano, estão dentro do grupo das principais competições da modalidade, sendo realizados de forma consecutiva fazendo com que a molecada de fora apronte as malas e venha para o Brasil nessa época do ano. Um pouco do melhor do tênis juvenil mundial se reúne no Brasil nessas duas semanas de jogos.

MADE IN BRASIL

Convidada da organização em São Paulo, a paulistana Luisa Stefani chamou a atenção por sua recente mudança aos Estados Unidos. A atleta de 15 anos treina há um ano e meio na academia de Saddlebrook, na Flórida, e mostrou no Clube Paineiras do Morumby, uma das sedes do Banana, um jogo totalmente diferente do das companheiras.

Agressiva na medida certa e focada em sua estratégia de jogo, com golpes limpos do fundo que fazem ligação perfeita para a rede, Luisa atropelou suas adversárias, inclusive a argentina Agostina Zamprogno, cabeça 1, que conseguiu anotar apenas dois games na final. Campeã sem perder um set, Luisa embarcou para Porto Alegre e manteve a hegemonia por sua "turnê" no Brasil.

No Rio Grande do Sul, ela sustentou a ótima forma, o sorriso em quadra e os resultados foram novamente impressionantes. Se no Banana Bowl, ela bateu facilmente na decisão a principal favorita, em Porto Alegre o cenário foi similar. A garota, que já teve contato com várias estrelas em sua academia, como John Isner e Victoria Azarenka, esteve longe de ser ameaçada e passou como quis por suas rivais nos 16 anos, incluindo aí a venezuelana Daniela Ramirez, número 1 do ranking Cosat na categoria, novamente sem levar nenhuma disputa para o terceiro set.

Luisa, consciente de que o tênis é o principal foco para a carreira, vê que a mudança para o exterior a ajudou aprimorar sua técnica, motivada principalmente pela presença de grandes profissionais no ambiente de trabalho. "Tenho treinado com jogadoras de alto nível, de diversos países do mundo. Isso tem sido importante e estou melhorando pouco a pouco", diz a brasileira, que segue o caminho de atletas promissores que foram à Flórida para construir a carreira no esporte. Maria Sharapova é um deles...

OXENTE, TCHÊ!

As praias de Salvador deixaram de ser uma rotina para José Evaldo Neto, que trocou o calor do Nordeste para o clima temperado do Rio Grande do Sul. Treinando no Instituto Gaúcho de Tênis, com Marcos Hocevar e Eduardo Frick, o baiano soube se recuperar muito bem da dura eliminação na semifinal do Banana Bowl, em São Paulo, para triunfar na "nova casa" Porto Alegre. Com um belo jogo de fundo, principalmente o forehand, o tenista de apenas 15 anos também sabe se virar muito bem na rede, graças a um serviço eficiente aliado a ótimos voleios.

Na gira Cosat, o título na etapa da Argentina e o vice no Peru ao lado do compatriota Gabriel Sidney ajudam a comprovar tal potencial nas duplas. Mas, no Sul, o brasileiro levou a melhor mesmo "mano a mano" e sobre adversários melhores ranqueados nos 16 anos. Nas quartas, bateu com autoridade o peruano Juan Rosas, cabeça 1 e vice no Banana dias antes. Na semifinal, triunfo parelho contra o argentino Federico Herrera Duran e, finalmente, o chileno Marcelo Barrios Vera foi o último obstáculo antes de comemorar o título ao lado da torcida. "Vencer esse torneio é muito especial, ainda mais que agora estou jogando quase que literalmente em casa", brincou José Evaldo que parece ter acrescentado um tempero mais forte no churrasco gaúcho.

Ainda na capital do Rio Grande do Sul, o paulistano Gabriel Decamps, assim como José Evaldo, se recuperou de derrota na semifinal em São Paulo para dar a volta por cima na "Copa Gerdau", exatamente em cima do algoz na semana anterior, o argentino Juan Bautista Otegui, principal favorito na chave dos 14 anos.

BAIXINHA INDOMÁVEL

Quando parecia que o Brasil passaria em branco no Banana Bowl, na volta do torneio a São Paulo depois de cinco anos (o Paineiras do Morumby abrigou as categorias 14 e 16 anos), coube à baixinha Thaísa Pedretti dar o primeiro título para a torcida brasileira (Luisa Stefani ganharia nos 16 anos logo em seguida). Para quem nunca acompanhou de perto a disciplinada tenista, com seus meros 1,53 m, é difícil imaginar que, ao empunhar a raquete, irá fazer tanto estrago. Com 13 anos, a menina de São Bernardo do Campo precisou se locomover pouco para trabalhar comparada às outras colegas. Atleta do Instituto Tênis, em Alphaville, Thaísa já vinha de excelentes resultados na gira Cosat, com títulos no Equador e Paraguai, além do vice-campeonato na etapa do Chile. Em casa, ela era favorita para a chave dos 14 anos, mesmo com adversárias de respeito. Na final, a colombiana Emiliana Arango veio com uma tática de paciência e até no saque a menina se propôs a sacar por baixo (por conta de um problema no ombro).

Thaísa ainda vive um período de oscilações, em que parece se perder num choro comedido à beira da quadra, mas compensa com garra e um jogo bem vistoso para frente. Na decisão em São Paulo, teve que contornar uma situação delicada de um set abaixo e desvantagem no tiebreak da segunda parcial para vencer com folga no terceiro set.

No Rio Grande do Sul, ela voltou a encontrar Arango, agora na semifinal, e o triunfo veio dessa vez em dois sets. Na final, precisou novamente se superar para virar contra a mexicana Jose Maria Portillo, grande surpresa da chave e responsável por tirar a colombiana Sofia Munera, melhor da categoria, na semifinal. Nas duplas, a paulista fez dobradinha e acabou em primeiro lugar com a paraguaia Ariana Stagni. E a boa campanha no saibro, motivada pelo ídolo David Ferrer, também especialista no piso, rendeu à paulista o posto de segunda melhor tenista da idade após os dois torneios em solo brasileiro.

SALDO E DÉFICIT

Na categoria mais tradicional das duas competições nacionais, nenhum brasileiro levantou o caneco e, tanto em Itajaí quanto em Porto Alegre, os estrangeiros levaram a melhor nos 18 anos em simples. No Banana Bowl, Johan Sebastien Tatlot se tornou o terceiro jogador da França a abocanhar o troféu, juntando-se a Paul Henri Mathieu em 1999 e Mathias Bourgue em 2001. O paulista Marcelo Zormann, melhor brasileiro no ranking da ITF, chegou até a empolgar ao vencer o campeão de 2012, o norte-americano Spencer Papa, nas oitavas, mas parou na rodada seguinte frente ao francês Maxime Hamou. Desde Eduardo Oncins, em 1981, os meninos do Brasil não conquistam nenhum título do torneio criado por Alcides Procópio.

Entre as mulheres, nenhuma das nove representantes avançou mais do que a segunda rodada e a taça foi parar nas mãos da norte-americana Louise Chirico, de apenas 16 anos e que faturou o primeiro torneio ITF da categoria. Mesmo sem a fama de especialistas nos pisos mais lentos, os Estados Unidos somam o sexto troféu no feminino - Meilen Tu, Lilia Osterloh (duas vezes), Sarah Taylor e Beatrice Capra foram as demais campeãs.

Na "Gerdau", o italiano Gianluigi Quinzi, segundo do ranking mundial da ITF e principal favorito na chave, ficou com o título entre os garotos ao vencer o americano Stefan Kozlov. Se Zormann foi o grande destaque em Itajaí, Rafael Matos, que treina na capital gaúcha, foi o brasileiro que mais chegou longe no evento e também caiu nas quartas contra o campeão de dias antes, o francês Tatlot.

Já na chave feminina, a russa Varvara Flink estragou a festa dos gaúchos ao bater Beatriz Haddad Maia na decisão em três sets. Foi a segunda vez que a atleta de Larri Passos amarga o vice em Porto Alegre e o Brasil acumula mais um ano sem título nos 18 anos feminino - a última a ficar no lugar mais alto do pódio foi a gaúcha Miriam D'Agostini em 1996.

Se o desempenho não foi satisfatório no individual, as duplas renderam o melhor para o Brasil nessas duas semanas na categoria. Em Itajaí, Bia e Ingrid Martins mostraram ótimo entrosamento e ficaram com o vice-campeonato. Na semifinal, bateram a dupla de Carolina Meligeni Alves, sobrinha de Fernando Meligeni e que disputa a primeira temporada nos 18 anos. Foi a primeira vez que duas brasileiras chegaram à final da modalidade desde 1997 quando Joana Cortez e Simone Jardim também obtiveram o segundo lugar no Banana Bowl.

Em Porto Alegre, Bia e Ingrid novamente bateram na trave no match tiebreak, enquanto que o local Orlando Luz, de apenas 15 anos e que já vem disputando torneios da categoria, e Zormann, atleta treinado por Edvaldo Oliveira em São José do Rio Preto, surpreenderam os principais cabeçasde- chave desde a primeira rodada para abocanharem a taça na primeira atuação conjunta na modalidade.

Bia Maia ficou com o vice em simples na Gerdau novamente

Laura Wayerbacher venceu nos 12 anos em São Paulo e Porto Alegre. Já Gabriel Decamps (à direita) ficou com o título dos 14 na Gerdau