Postura de campeão

Durante Roland Garros, Larri Passos revelou alguns dos seus "truques psicológicos" para moldar seus jogadores a fim de transformá-los em vencedores. E pasmem - com Guga não foi diferente

Matheus Martins Fontes em 22 de Junho de 2012 às 08:01

CONSTRUIR UM JOGADOR, vê-lo crescer de fase em fase para auxiliá-lo a enfrentar as dificuldades que uma carreira profissional demanda não é para qualquer um. Exige empenho, dedicação, sofrimento e, apesar de algumas exceções, raramente traz resultados satisfatórios. No tênis, as chances despencam drasticamente. O gaúcho Larri Passos é um desses poucos felizardos que acompanhou na íntegra a trajetória de um fenômeno que mudou a forma de jogar no saibro, principalmente se o assunto em pauta for Roland Garros.

Passados 15 anos desde o primeiro título de Gustavo Kuerten em Paris e quatro desde sua aposentadoria no mesmo palco, Larri estava de volta à Cidade-Luz em 2012. Longe dos centros glamorosos do complexo - Philippe Chatrier e Suzanne Lenglen -, o treinador fez questão de marcar território nas quadras secundárias. "Correr atrás da molecada" passou a ser seu novo dilema ao lado dos jovens Thiago Monteiro e Beatriz Haddad Maia.

"Bate a mão nessa bola!", "Vai ver a marca lá", "Que tênis bonito!" foram algumas das expressões mais ouvidas nas modestas arquibancadas em Porte d'Auteuil. Os mais curiosos olharam e lá estava o bigodudo turrão, compenetrado, fechado, todo cheio de gestos, a maioria apontando para a cabeça. Assim, exatamente como acontecia com Guga.

Ao longo da chave juvenil, Larri acompanhou de perto os pupilos, às vezes em quadras complementares, em horários simultâneos, sob chuva, sol, frio, mas sempre com a mesma postura positiva. Após a classificação de Bia para a inédita decisão de duplas no juvenil, o técnico não aguentou. Foi pura emoção. "O que eu tenho trabalhado com essa menina foi coroado com esse resultado aqui", resumiu Larri, que admitiu ver sua comandada jogar uma competição pela primeira vez.

Mas o que exatamente é trabalhado na jogadora de 16 anos? E com Monteiro? Como mexer com a confiança de uma atleta que tem potencial, mas que ainda precisa daquele detalhe para aguentar um circuito ultracompetitivo? Fomos atrás dos métodos do gaúcho.

Em um bate-papo com a Revista TÊNIS, Larri expôs sua "fórmula" à beira da quadra em seis passos que ele garante serem fundamentais para moldar a disciplina do atleta. E fez questão de se basear na rotina aplicada com Bia no dia do jogo que a fez entrar para a história do tênis feminino do Brasil. Precisa de mais? Confira!

"Não tem nada de diferente com a época do Guga. Uma das coisas que procuro passar para a Bia é a alegria"

 

Rotina de um campeão

1. Pós-jogo:

"Na recuperação após uma partida, eu devo conversar sobre os momentos que ela teve no jogo. Recapitular o que ela melhorou e frisar alguns momentos-chave para que aconteça a evolução instantânea."

2. Passar o "bastão":

"Quando estamos na sala dos jogadores, peço para conversar com ela. Olho bem para ela e digo: 'Bia, hoje vai ser solidez e agressividade. Escreve essa frase. Sólida hoje'. Então, todos os dias sento-me com ela, com o Monteiro também, e explico."

3. Ficar na quadra:

"Acabou o jogo, seja de duplas ou simples, eu já alugo uma quadra para a Bia ajustar o golpe que não funcionou direito na partida. Assim, ela vai pensar: 'Pô, agora já peguei o jeito, estou com a confiança de volta!'"

4. Neurolinguística:

"Hoje de manhã, ela chegou aqui e ficou 1h10m treinando na quadra com dois marmanjos do outro lado. Depois, no final, ficou fazendo devolução de saque e aproximação à rede, algumas jogadas importantes visando a partida de hoje."

5. Tirar o seu melhor...

"Hoje, no match-point, ela foi para a paralela. Acabou errando um pouquinho, mas era a bola para pegar pesado, eu falava isso lá de trás. A Bia tem esse dom de pegar pesado e não posso falar para ela só colocar a bola na quadra. Isso é positivismo. É buscar o que o jogador mais gosta de fazer. Há um ano e meio, ela jogava diferente. Ela pegava pesado, tinha talento, mas faltava exatamente essa consistência."

6. ...Com alegria:

"Não tem nada de diferente com a época do Guga. Uma das coisas que procuro passar para a Bia é a alegria. Ela estava lá do outro lado e eu apontava que a adversária jogaria com o primeiro saque. E gesticulava [neste momento, Larri fazia o sinal de número um]. A Bia falava: 'O que?' Aí eu não aguentava e gritava: 'Bia, a menina vai jogar com o primeiro saque!' E ela dava risada. A ideia é fazê-la rir das coisas. Quando ela erra uma bola, automaticamente olha para mim e vê que deveria ter feito aquela bola diferente. 'Tudo bem, tudo bem', eu digo. Quando o Guga olhava para mim depois de um erro, ele já pensava: 'Fiz uma cagada, né?' E eu falo para ela, assim como eu dizia a ele: 'Xinga na hora, corrige na hora, esquece, vai lá para trás, concentra e vai para a bola. Essa é a sua bola, é o seu momento!'"

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