Por um lugar ao sol

O que nos faz ir para a quadra? O que nos compele a disputar jogos? A tentar sempre vencer? O status quo do tênis

Elson Longo em 27 de Setembro de 2010 às 14:42

 

TEMPO LIVRE. Algo tão raro nos dias de hoje, que tornou-se o novo regente dos parâmetros do status social moderno. Segundo as últimas definições da sociologia do capital, ter dinheiro já não basta: a somatória de renda financeira e tempo livre é o que edifica um maior status. Se alguns podem fazer compras ou jogar golfe, serão poucos entre eles que poderão fazê-lo numa tarde de um dia de semana.

Mas se tempo livre virou sinônimo de status, o que levariam pessoas a investi-lo em partidas de tênis? Atividade física, competitividade, criatividade, expressão, paixão? Todos bons candidatos, mas nenhum comparável ao elemento "prazer". Dentre as muitas facetas em que este se revela , aquelas associadas a êxito e sucesso são as mais sedutoras: o prazer de ganhar!

Vencer no tênis é indescritível. Paradoxalmente, perder também. Sentimentos tão contraditórios presentes no mesmo palco. Nas mãos da trajetória da bola, alguém vai desfrutar, no fim do jogo, de boas emoções. E não se pode dizer o mesmo da outra parte. Há diferentes intensidades de reação quanto a isso obviamente. Desde sair gritando de alegria, até quebrar a raquete, passando por uma quase indiferença. Porém, uma coisa é certa: ganhar é bem melhor que perder.


THE WINNER TAKES IT ALL

Contudo, vencer implica bem mais que meras emoções. Em cada "micro mundo", onde alguém realiza seus jogos e torneios, haverá uma sutil hierarquia baseada na estratificação correlata ao nível de jogo de cada um. Naquele ambiente, sempre haverá um respeito e carisma atrelados ao quanto se joga. Traduzindo: os melhores jogadores encontrarão parceiros para jogar mais facilmente, serão mais conhecidos e serão, inclusive, formadores de opinião nos assuntos inerentes à modalidade. A sociabilidade daquele grupo será, de forma desapercebida, fortemente influenciada pelo nível de habilidade de seus integrantes.

Fica claro porque tantos tenistas sociais procuram aulas para melhorar seu jogo, subir no ranking ou ir bem no torneio interno. Vencer se torna ainda mais prazeroso quando se está imbuído em um contexto maior, que é suscetível a esses resultados. Vivemos em um mundo competitivo, estratificado e hierárquico: seria ingenuidade acreditarmos que não haveria uma intuitiva reprodução comportamental desses elementos em nossos muitos cenários.


QUEM EU SOU EM QUADRA?

Por mais que tais envolvimentos sejam relativos, de intensidade inerente a cada personalidade, é senso comum haver bastidores por trás de cada jogo. Há sempre algo mais envolvido. Aqueles profissionais de sucesso são vertiginosamente atraídos por conhecerem sua própria vulnerabilidade ao acumularem algumas derrotas. Quem traz algumas frustrações do viver pode experimentar trunfos revitalizantes no fim do dia. Buscando o que está além de si próprio, as lições da quadra guiam seus seguidores a se descobrirem. A intrigante sensação de surpreender-se consigo mesmo.

Vemos que a teia tecida envolve de forma dualista: enquanto o indivíduo busca um melhor reconhecimento perante seus elementos de convívio, é posto em constante contato com seus múltiplos personagens. Na frequente alternância entre as antíteses do eu interior e do externo, essas duas realidades vão se miscigenando, envolvendo o praticante. Já longe de casa, cada um pode se reinventar como bem quiser.

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Vencer no tênis é indescritível. Paradoxalmente, perder também


JOGANDO CONTRA O OUTRO E CONTRA SI
Com tantas coisas em jogo, muitas vezes se faz de tudo, menos jogar. Tênis é uma atividade de forte cunho psicológico. Não se deve dar as costas a isso quando se entra em quadra. Sempre há dois caminhos ao golpear a bola: para acertar ou para não errar. No primeiro caso, busca-se o sucesso; no segundo, evitase o fracasso. A sutil diferença de jogar para ganhar ou para não perder. Quem procurar acertar, está mais próximo de seu melhor rendimento; quem evita o erro, foge de seus golpes. Parece simples fazer a escolha certa, mas tudo depende do quanto está em jogo.

A interpretação subjetiva de cada partida, de cada momento do confronto, pode lhe levar de um lado a outro desses extremos. Muitos nem percebem essas diferenças e são presas fáceis do processo. Os mais experientes ainda podem manter-se do melhor lado através de rotinas e rituais desenvolvidos ou treinados. Independentemente do final da estória, o interessante é notar que há uma luta entre duas criaturas separadas por uma rede e outra batalha dentro de cada um...


AUTOCONHECIMENTO

Com o tempo, aprendemos a nos perdoar após erros bobos. Não tentamos demasiadamente quando já sabemos que não estamos no nosso melhor dia. Ousamos inventar coisas novas. Lembramos que do outro lado tem alguém que também tem capacidades e que pode fazer algo realmente interessante, e que aplaudi-lo é o melhor para nós mesmos. Sorrimos para a sorte e até fazemos o mesmo para o azar, afinal, já entendemos que tem tanta coisa além de nós que não é sensato encontrar mais um inimigo. Lamentamos provocações, entendendo que são importantes para nos fazer lembrar de algumas que já fizemos e nos arrependemos. Sabemos que temos que ir com calma, que descansar nas viradas acaba sendo a parte mais inteligente do jogo. De uma vez por todas, entendemos que a toalha é nosso único amigo ali, e que ela sempre vai nos dar uma ideia um pouco melhor do que aquilo que estamos pensando no momento. Já não dizemos que pararemos de jogar depois de derrotas duras, pois sabemos que, no dia seguinte, estaremos de volta. Definitivamente, aprendemos o quanto é difícil lidar com uma bola alta e já não temos vergonha de executá-la. Fugimos dos erros do corredor que apenas revelam nossa ansiedade. Guardamos nossas melhores jogadas para os pontos que realmente importam, sabendo que eles são tão poucos e raros.

Sempre haverá um respeito e carisma atrelados ao quanto se joga. Traduzindo: os melhores jogadores encontrarão parceiros para jogar mais facilmente, serão mais conhecidos e serão, inclusive, formadores de opinião nos assuntos inerentes à modalidade


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Finalmente, criamos o hábito de apreciar e elogiar nossas melhores jogadas, afinal, se não o fizermos, quem fará por nós? Aceitamos que, na maioria das vezes, perdemos para nós mesmos e, por isso, damos um pouco mais de oportunidade de o nosso adversário jogar. Atingimos a compreensão de que duplas é um jogo com duas pessoas de cada lado, sendo que uma delas está do nosso lado. Valorizamos ter um bom fisioterapeuta, pois é ele que nos dará longevidade nessa atividade. Já ficou claro que não há nada mais difícil do que manter o nível quando se vence com tranquilidade, e nada mais perigoso do que alguém que está atrás do marcador. Com o tempo, damonos a oportunidade de acreditar naquilo que estamos propostos a fazer por ser, no mínimo, a melhor forma de perder caso tudo dê errado.

Assim, faremos muitos amigos, mas, no fundo, aqueles que nos acompanharam desde o começo estarão conosco além dos limites da quadra. E, muitas vezes, dentre eles, estará nosso professor de tênis. Nosso professor de tênis...

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