O que eles querem agora?

Guga e Larri, a dupla mais vitoriosa do tênis brasileiro, está reunida de novo. Mas o que eles podem almejar ainda?

Odir Cunha em 31 de Outubro de 2006 às 07:09

DEPOIS DE 18 MESES afastado do seu técnico e mentor, período no qual disputou 13 partidas e perdeu 10, Gustavo Kuerten alegou que "queria algo novo" e voltou a ser treinado por Larri Passos, de quem foi o pupilo por 12 anos, com quem conquistou 20 títulos e ganhou mais de 14 milhões e meio de dólares só em prêmios. Larri, como um pai que vê o retorno do filho pródigo, ficou feliz, claro, mas advertiu: "Preciso saber se tenho uma Ferrari nas mãos, ou um Gordini".

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O fisioterapeuta argentino Nilton Petrone, também conhecido como Filé, famoso por recuperar o atacante Ronaldo "Fenômeno" para a Copa de 2002, acha que Guga está mais para um bólido, pois não tem mais nenhum problema clínico no quadril. "Ao contrário do Ronaldo, o Guga não se deixa abater e enfrentou muito bem o período de preparação", analisou Filé.

Para se tratar com Filé, Guga morou meses no Rio, onde treinava com o técnico Hernán Gumy e o preparador físico Fernando Cão, ambos também argentinos. Corria na praia, fazia sessões de esteira e piscina e batia bola em quadra. Aproveitou a estada no Rio para se submeter a uma cirurgia espírita com o médium Gilberto Arruda no Lar de Frei Luiz, em Jacarepaguá.

Mas nada parecia animar o tricampeão de Roland Garros, que finalmente percebeu na ausência de Larri a falta de motivação. "Foi legal trabalhar com o Hernán, mas eu queria uma mudança, uma coisa diferente no meu próprio dia-a-dia. Acho que até em função de ficar todo esse tempo sem jogar, estou buscando algo que me traga uma nova motivação", disse Guga, radiante, ao lado do novo velho técnico.

"Talvez ele precisasse desse tempo separado. Fizemos um primeiro turno e ganhamos. Agora vamos tentar vencer no segundo", afirmou Larri, que dirigiu o tenista em 540 partidas, com 356 vitórias, três títulos de Grand Slam, um Masters e a liderança do ranking mundial.

Mas hoje os tempos são outros. Técnico e jogador sabem disso. Guga tem 30 anos (completados em 10 de setemnbro), vem de duas cirurgias no quadril. É impossível repetir os resultados de outrora. Boas vitórias contra jogadores de renome e um ou outro título já merecerão grandes comemorações. O acordo também não prevê a mesma exclusividade de antes Larri só estará ao lado de Guga nos grandes torneios

Hoje o técnico tem outros interesses. Ele treina a austríaca Tamira Paszek, de 15 anos. Em setembro Tamira entrou para a lista das tenistas mais jovens do mundo a conquistar um título profissional WTA. Foi campeã em Portoroz, na Eslovênia. No tênis feminino, ela fica atrás apenas da norte-americana Tracy Austin, levantou uma taça com apenas 14 anos, em 1997.

Em Wimbledon, o saque poderoso e uma das melhores esquerdas dos anos 90. Isso pode voltar?


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LARRI: ESCALAR UMA MONTANHA

O gaúcho Larri Passos gosta de criar frases para motivar seus atletas. Para este revival com Guga, ele criou uma: "Força, vigor e energia, uma bola a mais todo dia. Esse é o lema. Quando ele acordar e sentir, disser 'estou louco, estou pronto para começar de novo', nós já estaremos tendo sucesso. É ele que vai dizer quando estiver pronto."

Da Áustria , onde treinava Tamira Paszek, Larri nos respondeu três perguntas básicas. Primeira: Você levou o Guga a número um do mundo. Agora , qual é a meta?

"Antes de falar de metas, eu tenho que falar de duas palavras: a primeira é a convicção. A convicção significa o momento quando está se tocando na bola, se deslocando, tudo tem de estar perfeito! Depois, o objetivo de acordar de manhã depois de três, quatro horas de treino do dia anterior e dizer: 'Como es tou feliz, aí vem mais um dia de treino!!! , aí vem a meta..." Quando, depois de cinco sets jogados, perdendo ou ganhando, ele vem para mim e diz : ' Vamos dar uma soltada lá na quadra'. Como o Guga está clínica e fisicamente ?

"Clinicamente lógico que depois de todo este tempo está perfeito. Fisicamente digamos que temos que subir uma montanha de 7.748 metros. Estamos a 1.500 metros. Espero que quando ele estiver no topo da montanha ainda possa fazer uns piques de 100 metros. Agora é subir cada metro com a certeza de que não vai haver falta de ar no meio do caminho".

Em que se baseará o treinamento com o Guga? Será diferente do de antes?

"Procuro respeitar a fisiologia do esforço, tanto na quadra como na parte física fora da quadra. Com o Guga já com 30 anos, não será diferente: as resposta s serão dadas pelo corpo dele, pelas fibras de le. Não existe uma máquina que tu coloca o atleta dentro e diz: 'Me dá força agora, me dá resistência agora , me dá velocidade!'. As respostas são dadas pelas unidades motoras, pelas fibras musculares , pelos músculos! Testes são feitos para ver estes níveis e o atleta vai te dando as respostas para o aumento de trabalho. Não é simples , requer muito e muito trabalho. Nos últimos dois anos já havíamos adaptado muitas coisas. Se ele voltou a confiar no meu trabalho, é porque estava dando certo. Se o consciente dele estiver sempre a fim, com certeza o trabalho será um sucesso! Agora, o tempo é o dono de todas as respostas! "

GUGA: "O LARRI ME MOTIVA"

No anúncio do reencontro da dupla, em uma loja de sua grife em Florianópolis, Guga admitiu que pensou em Larri porque se sente mais seguro ao lado do técnico, que o conhece melhor do que ninguém no tênis. Larri, na verdade, substituiu a imagem paterna de Aldo, falecido quando Guga ainda era uma criança.

"O Larri é a pessoa que mais me conhece, em quem eu mais tenho con fiança e que sempre me fez jogar tênis muito feliz. No período em que estive parado em função da minha bursite, passei por um momento de auto-avaliação e comecei a pensar no Larri. Ele sempre esteve de portas abertas para me receber. Depois que voltei da Davis, liguei pra ele, fui até lá falar com ele, e fomos direto para a quadra. Sabia que se ele tivesse condições, faria de tudo para me ver jogando novamente bem e feliz"

Guga admitiu, em outras palavras, que o distanciamento o ensinou a valorizar mais o técnico: "Às vezes a gente não percebe as coisas que têm em volta, até que fica sem. O que eu tive certeza é que a melhor pessoa para me motivar e buscar um auto-rendimento, extrair o meu melhor, é o Larri".

Porém, Guga não quer mais estabelecer metas de conquista. Sabe que dependerá das reações do seu corpo que, ele aprendeu, são imprevisíveis: "O meu corpo vai dar a resposta. O ideal é tirar qualquer meta e torneio da cabeça. A meta pessoal é voltar a competir entre os melhores. Tenho esse direito de acreditar na força que existe dentro de mim. É ter calma , paciência e acreditar no trabalho. O que mais me deixa confiante é saber que estarei fazendo o melhor para chegar lá."

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Criador e criatura juntos de novo. Para provar que a felicidade pode ser tão importante como títulos de Grand Slam

TODOS NA TORCIDA

A volta da dupla foi saudada foi entusiasmo pelo staff do tenista e seus fâs. Paulo Carvalho, o Carvalhinho, empresário do tenista e do técnico, diz que ambos estão transmitindo "felicidade, motivação e muita confiança mútua":

"A notícia do reencontro profissional de Guga e Larri foi muito bem recebida pelo mercado e pelas pessoas liga das ou não ao tênis. A mídia recebeu hiper bem este retorno. O mercado entende que o Guga é um ídolo e que sua imagem é extremamente forte devido ao que conquistou para o esporte do Brasil, pela maneira despojada de encarar a vida e os obstáculos que ela traz e , é claro, graças a seu gigantesco carisma. Por outro lado, a dupla Guga/Larri gera muita credibilidade e aceitação".

A jornalista Diana Gabanyi, assessora de imprensa do tenista, confessa que se emocionou ao ver o reencontro do criador e da criatura: "Fiquei feliz e emocionada. Além da energia especial que só eles juntos têm, era algo que o Guga queria e o Larri incorporou na hora . Após tantos anos acompanhando os dois, deu uma sensação de recomeço". A mesma sensação parece ter aflorado nos fãs de Guga pelo mundo afora. No site oficial do maior ídolo do tênis brasileiro, Catherine Marion , de Carnoux en Provence, França, escreveu : "So great to hear about that ! You are the winning combination! You have prove it so many times! Lari (sic) is the best of the best for you, Guga, there is no word to explain your relationship and you both know it well. Hope to see you and Lari (sic) very soon on courts!".

Mas a escalada será dura. Guga não faz uma partida de simples desde 21 de fevereiro deste ano, quando perdeu para André Ghem na primeira rodada do Brasil Open, na Costa do Sauípe. Em setembro fez parceria com André Sá no jogo de duplas contra a Suécia, pela Copa Davis. Começou sacando bem, com o nos bons tempos, mas caiu um pouco nos sets seguintes e perdeu a partida em quatro sets.

A ausência das quadras despencou seu ranking para abaixo de 1.10 0, o que torna sua volta ao topo bem mais problemática do que a do recém-aposentado Andre Agassi, por exemplo, que caiu para número 142 e teve de jogar apenas dois torneios Challenger, ganhando um e indo à final do outro.

Sem vitórias, os patrocinadores também sumiram. Guga mantém contratos de publicidade com Head, Sandálias Rider e Grendene. O único patrocinador, entretanto, é sua própria grife, a Guga Kuerten. Tirando o invejável saldo bancário, é como se começasse do zero. Com a diferença de que agora voltar a jogar bem e sair feliz da quadra já terá o mesmo sabor para ele e Larri de uma conquista de um Grand Slam.

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