Nosso valor

O US Open 2013 comprovou a real importância das duplas do Brasil com o vice de Bruno Soares. E no individual, Serena Williams e Rafael Nadal não deixam dúvidas de quem dá as cartas no circuito

Por Matheus Martins Fontes em 22 de Setembro de 2013 às 00:00

AO CHEGAR EM CASA, em plena segunda-feira à noite, você sintoniza no canal para acompanhar aquele último jogo da rodada. Mal deu tempo de ver a programação, então você já presume que irá acompanhar uma partida de simples do grande favorito. No entanto, a surpresa por ver um jogaço entre quatro marmanjos no horário nobre é o que marca seu restante de dia.

Por vários dias, ao longo das duas semanas, a programação dos principais estádios do US Open foi recheada de jogos de duplas. Os organizadores, talvez, tivessem em mente a real possibilidade de os locais Bob e Mike Bryan faturarem novo caneco de Grand Slam, completando a coleção de quatro taças em 2013. Seria a cereja do bolo para eles que tanto lutaram (e ainda o fazem muito bem!) por uma maior promoção da modalidade.

No fim, os Bryan acabaram derrotados na semi, mas o “legado” deixado foi aproveitado pelo tênis brasileiro. Fomos premiados com transmissões ao vivo das partidas de Bruno Soares e Marcelo Melo na maioria de seus compromissos, inclusive a semifinal histórica entre os dois e, posteriormente, a decisão com Soares em quadra. Os torcedores brasileiros comprovaram que o País, agora com as duplas, voltou ao lugar de destaque e a ascensão deve ser registrada, assim como foi a de Guga em simples.

O US Open 2013 também, é claro, não poderia deixar de lado a onipresente relevância de seus heróis no individual. É dessa forma que podemos classificar o nível que Rafael Nadal e Serena Williams deixaram o tênis. Para os fregueses Novak Djokovic e Victoria Azarenka, só resta mais trabalho, porque incomoda demais verem seus adversários aumentarem ainda mais o domínio e não poderem acompanhar.

Mudança de realidade

Começo da tarde de um domingo. Na tela, Bruno Soares na final do US Open pelo segundo ano seguido, já que, em 2012, tinha abocanhado o título nas duplas mistas. O estudante Luis Morais, que começou a acompanhar o tênis por influência de Gustavo Kuerten, estava a postos para acompanhar a decisão do mineiro. Para ele e inúmeros brasileiros, o esporte passou a ser conhecido graças ao catarinense, com suas três conquistas em Paris. “Quando o Guga foi campeão de Roland Garros, causou um alvoroço no Brasil, tipo: ‘Nossa, o que é tênis? Temos um novo Ayrton Senna!’ Porque logo depois da morte do Senna, houve uma euforia para cima do Guga, mas nada foi feito para alavancar o tênis. Com ele se aposentando, ninguém veio depois para puxar o carro”, opina o jovem de 22 anos.

Desde 2007, todavia, os duplistas brasileiros conseguiram ótimos resultados, com títulos, vitórias em Copa Davis e, ainda assim, as derrotas de Thomaz Bellucci soavam mais importantes do que vitórias de Bruno Soares, Marcelo Melo ou André Sá. Por isso, quando Soares chegou ao título inédito de Grand Slam no ano passado, o mais leigo torcedor teve maior conhecimento da modalidade.

Nadal conquistou seu 13º título de Grand Slam na carreira

O país acordou

Em 2013, a dupla do mineiro com o austríaco Alexander Peya apareceu como a segunda melhor do mundo antes do US Open e ambos já somavam, juntos, cinco títulos na conta. Em Nova York, eles confirmaram o favoritismo nas primeiras rodadas e chegaram à semifinal, em que o mineiro enfrentou o ex-parceiro Marcelo Melo em semifinal inédita entre brasileiros num Grand Slam. No tira-teima, Peya e Soares levaram a melhor e jogaram a decisão contra Leander Paes e Radek Stepanek, algozes dos irmãos Bryan na outra semifinal.

Após Melo em Wimbledon, o Brasil alcançou uma final de duplas pelo segundo Major seguido. Nem Guga conseguiu isso nas simples, e, por isso, naquele domingo, Luís Morais e tantos outros enxergaram em Soares alguém por quem torcer. Um tenista que, desde quando focou sua carreira nas duplas, sempre pregou o respeito pela modalidade. E que, naquela decisão, “jogou por dois”, já que Peya sofrera uma distensão nas costas no fim da semifinal. Assim, eles pouco puderam fazer diante de Paes e Stepanek, que ficaram com a vitória e o título. O vice-campeonato, no entanto, não é algo para se lamentar. Morais crê que a ascensão do brasileiro ajudou a criar um debate sobre as duplas no País. “O vice do Bruno é mais importante do que o título, porque evita uma pressão igual a que cai hoje sobre o Bellucci, ainda por causa do Guga. Esse resultado incentiva o esporte, os jogadores que vêm da base, para termos mais ‘Brunos’, ‘Marcelos’, ‘Andrés’ e cria discussões na mídia especializada e em programas de esportes em geral. Isso só faz com que o esporte do Brasil cresça”.

Com o resultado em Nova York, Soares e Peya asseguraram passaporte para o ATP Finals de Londres, e Melo, com a semifinal em Nova York, tem também boas chances de jogar na Inglaterra com o croata Ivan Dodig.

Satisfeito, Soares exalta a grande exposição da modalidade durante o torneio e se diz honrado pela audiência da nova geração que acompanha as duplas por sua influência. “Essas pessoas são exemplos da transformação que está acontecendo no Brasil, onde todos começam a se interessar mais pelas duplas. É um reconhecimento de todo trabalho que estamos fazendo, várias finais de Grand Slam nos últimos dois anos. E a transmissão de nossos jogos agora, fazendo com que mais pessoas conheçam as duplas e torçam para nós, prova que o retorno é positivo”.

Marcelo Melo (foto) e Bruno Soares se enfrentaram na semi

Disputa de egos

Já faz tempo que Rafael Nadal e Novak Djokovic jogam um tênis diferenciado. Na última década, ficávamos impressionados com toda técnica e categoria de Roger Federer no auge. E, mesmo naqueles dias pouco inspirados, ficava nítido que, não importasse a façanha do adversário, ele se safaria com a jogada perfeita. Hoje, Nadal e Djokovic dominam o tênis não pela beleza plástica, mas pela consistência. A resistência em não desistirem até que o outro acuse o golpe é o que elevou o tênis a um nível estratosférico em comparação aos demais. Afinal, quem em sã consciência acredita que pode jogar em nível tão alto contra esses super homens? Stanislas Wawrinka e Richard Gasquet, duas surpresas do torneio, bem que tentaram. Dispararam lindos backhands de uma mão, desafiaram seus limites, mas viram que a diferença é ainda bem grande para ser superada. Nadal e Djokovic viraram o tênis do avesso e a final foi, além de inevitável, nova prova da superioridade dos dois (veja matéria).

Nocaute

Derrotado na final, Djoko pode perder a liderança do ranking para Nadal

Até a final, Nadal só havia perdido seu serviço uma única vez nos seis jogos anteriores e vinha invicto no piso duro. No outro “corner”, Djokovic queria vingança das derrotas em Montreal e Paris, apoiado no surpreendente triunfo em Monte Carlo. Mesmo envolvido totalmente pelo rival na primeira parcial, o sérvio correu atrás, empatou o jogo e parecia encaminhado a levar o bi em Nova York. Mas, em um deslize, fraquejou e o espanhol nunca mais perdeu o controle.

Engessado ao saibro no começo de sua carreira, Rafa provou que evolui a cada jogo nas quadras mais velozes, por isso aliou, ao poderoso forehand, outros instrumentos valiosos como o backhand mais agressivo, as surpreendentes subidas à rede e, é claro, o saque eficiente. O rótulo de saibreiro já é apenas um dos vários adjetivos cabíveis ao espanhol, que estudou diariamente para se tornar mais objetivo. Acabou que completou o verão (norte-americano) perfeito, com títulos em Montreal, Cincinnati e o segundo em Flushing Meadows. Nem Roger Federer e Pete Sampras conseguiram a tríplice coroa na América do Norte e os dois já são avistados pelo espanhol, que chega ao 13° título desse porte, um atrás de Sampras e quatro do suíço. E ainda há muito chão pela frente. Se Djokovic é um alvo vencível no “ringue”, no ranking o sérvio está ainda mais vulnerável com muitos pontos por defender. De degrau em degrau, Nadal, que só soma pontos até o fim do ano (pois ficou afastado desde Wimbledon 2012), prova que o céu é o seu verdadeiro limite.


No ano passado, Serena venceu dois Grand Slams e repetiu a dose em 2013

Repetição

Quando perdeu a final para Victoria Azarenka no Premier de Cincinnati, Serena Williams admitiu que estava aliviada porque entraria “menos” pressionada no US Open. Antes de a chave ser sorteada, a ausência de Maria Sharapova já sinalizava qual seria o desfecho duas semanas depois – Serena e “Vika” deveriam reeditar a decisão de um ano antes. E não que Sharapova na disputa mudaria muita coisa, afinal as duas primeiras do ranking mostram a cada torneio a grande diferença para as demais. A americana atropelou, como sempre, suas adversárias antes do encontro com a rival, com direito a bicicleta nas quartas e outro pneu na semifinal. Azarenka, por sua vez, só foi ameaçada contra Alize Cornet e Ana Ivanovic. Depois disso, confirmou sem problemas e Nova York, assim como foi no masculino, via um duelo entre as grandes favoritas na decisão.

Dona da casa

Já está claro para todas as jogadoras que Serena joga um tênis agressivo e que muitas delas se inspiram na americana. Azarenka é uma delas e tem consciência de que, não bastasse isso, a adversária trabalha arduamente para aprimorar ainda mais sua hegemonia. Portanto, não há margem para erros, como em 2012 quando desperdiçou a chance de sacar para o título do US Open. A persistência foi notável na bielorrussa desde o começo da decisão, mas ainda assim Serena, sem fazer muito, abria vantagem. É como acontece na maioria dos seus jogos. Facilmente ela dispara no marcador. A americana chegou a passar um susto no segundo set quando sacou duas vezes para vencer e foi quebrada por Azarenka, que, vitoriosa no tiebreak, forçou nova parcial. A bielorrussa tinha aprendido a lição de que para superar seus limites deveria se manter focada a todo momento, mas diante de Serena, seu “espelho”, Vika fraquejou e não impôs resistência quando precisou. Serena, assim, passa nova impressão às suas alunas: se já virou clichê afirmar que intimida as outras, é impressionante ver que, conforme a idade passa, ela se mantém faminta por mais. Em 2013, abocanhou dois Grand Slams, chegando a 17 na conta. Se o céu é o limite para Rafa, até onde Serena pode chegar?


Azarenka, vice novamente


Wawrinka, o melhor suíço no torneio

Gasquet fez semifinal
RESULTADOS
SIMPLES
Rafael Nadal (ESP) v. Novak Djokovic (SRB) 6/2, 3/6, 6/4 e 6/1
Serena Williams (USA) v. Victoria Azarenka (BLR) 7/5, 6/7(6) e 6/1
DUPLAS
Leander Paes (IND) e Radek Stepanek (CZE) v. Alexander Peya (AUT) e Bruno Soares (BRA) 6/1 e 6/3
Andrea Hlavackova e Lucie Hradecka (CZE) v. Ashleigh Barty e Casey Dellacqua (AUS) 6/7(4), 6/1 e 6/4
Andrea Hlavackova (CZE) e Max Mirnyi (BLR) v. Abigail Spears (USA) e Santiago Gonzalez (MEX) 7/6(5) e 6/3
JUVENIS
Borna Coric (CRO) v. Thanasi Kokkinakis (AUS) 3/6, 6/3 e 6/1
Ana Konjuh (CRO) v. Tornado Alicia Black (USA) 3/6, 6/4 e 7/6(6)
Kamil Majchrzak (POL) e Martin Redlicki (USA) v. Quentin Halys (FRA) e Frederico Ferreira Silva (POR) 6/3 e 6/4
Barbora Krejcikova e Katerina Siniakova (CZE) v. Belinda Bencic (SUI) e Sara Sorribes Tormo (ESP) 6/3 e 6/4
Torneio Bruno Soares US Open Bob e Mike Bryan Grand Slam Guga Alexander Peya Rafael Nadal Novak Djokovic Victoria Azarenka

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