Com 19 torneios realizados no País durante 2010, o tênis feminino brasileiro tem a chance de dar a volta por cima
Arnaldo Grizzo em 21 de Outubro de 2010 às 07:58
EM 2004, a Confederação Brasileira de Tênis (CBT) resolveu se voltar para os torneios profissionais masculinos. Usando verba de seu principal patrocinador, incentivou a promoção de Futures pelo País para tentar alavancar nossos tenistas no ranking da ATP. Na época, a entidade subsidiava as competições e, naquele ano, 20 torneios masculinos (entre Futures, Challengers e ATP) foram realizados em solo brasileiro, mais do que o dobro de anos anteriores. Qual o resultado? Muitos garotos fizeram seus primeiros pontos e começaram a figurar no ranking. E essa política continuou, o que certamente facilitou a vida de muitos jovens aspirantes ao profissionalismo.
Para se ter uma ideia, no fim de 2004, Thomaz Bellucci, o brasileiro melhor colocado na ATP atualmente, tinha meros 2 pontos no ranking. Outros nomes que hoje se aventuram em torneios maiores, como Ricardo Hocevar, Caio Zampieri, João Souza, os irmãos Daniel e Rogério Silva etc, estavam começando a pontuar naquela época e usaram (alguns ainda usam) os torneios no Brasil como trampolim para posições mais altas na lista da ATP.
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Enquanto desde 2004 os torneios masculinos pipocaram no Brasil, com média de 30 por ano, e mais jovens pontuaram (atualmente são mais de 80 brasileiros com ao menos 1 pontos), as competições femininas não acompanharam esta evolução e nossas meninas continuaram sofrendo. No entanto, ao que tudo indica, esse cenário parece destinado a mudar a partir desta temporada.
Em 2010, com apoio da CBT (que vem subsidiando os torneios, pagando taxas, árbitros e bolas) e de promotores que se valeram da boa vontade e também da Lei de Incentivo ao Esporte, devemos terminar o ano com 19 - sendo cinco Challengers e 14 Futures. Parece pouco se comparado com o circuito masculino no País - que em 2010 deve terminar com o recorde absoluto em nossa história, com 42 eventos, sendo um ATP, oito Challengers e 33 Futures -, mas já é um número interessante. Tanto que, em termos de circuito de Futures femininos, perdemos somente para Estados Unidos, Itália, Espanha, França, Turquia e Japão. No masculino, se contarmos apenas Futures, ultimamente temos perdido apenas para a Espanha em número total de eventos.
OS NÚMEROS VALEM PARA QUÊ?
A relação pode não ser tão clara, mas a verdade é que o aumento do número de torneios masculinos no Brasil ajudou, sim, a alavancar algumas carreiras, facilitando a vida de muitos jovens que certamente não teriam dinheiro para ficar viajando para o exterior em torneios Future - que mal servem para pagar as contas do tenista naquela semana em que está disputando a competição. Basta pegar o total de jogadores ranqueados e perceber que o nosso circuito de Futures montou uma base sólida. Desde 2006 temos tido mais de 80 jogadores com pelo menos 1 ponto na ATP (exceto por 2007) e cerca de 20 entre os top 500 nos últimos três anos. Assim, o desafio declarado da CBT, desde que percebeu esse fenômeno, é tentar ajudar a organizar mais Challengers, que dão mais pontos e ajudam nossos tenistas a ficar cada vez mais perto do top 100. Isso sem diminuir o número de Futures, obviamente.
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O aumentar o número de torneios femininos, aumenta-se a base de jogadoras e assim a chance de algumas delas se destacarem
Então, para ajudar o tênis feminino - que anda largado às moscas desde sempre, pois nossas últimas top 100 (há mais de 20 anos) só chegaram lá por terem se arriscado mundo afora - a CBT planeja usar a mesma tática que tem funcionado com os homens: promover o maior número possível de Futures e aumentar a base. Os torneios que foram realizados em 2010 já mostram que essa estratégia tem tudo para funcionar e várias garotas fizeram seus primeiros pontos e passaram a figurar na lista da WTA.
Para termos de comparação, desde 2000, nossa média de tenistas ranqueadas é de cerca de 20. Até o começo de outubro deste ano, já temos 28. Só para esclarecer, a WTA tem um sistema diferente da ATP - em que basta ter 1 ponto para aparecer no ranking. No circuito feminino é necessário pontuar em três competições para figurar na lista. Ou seja, o resultado quase que óbvio de aumentar o número de torneios é ter mais meninas no ranking também.
FACILIDADES
Enfim, a relação maior número de torneio x maior número de tenistas no ranking é ainda mais lógica quando conversamos com as meninas. Vivian Segnini, por exemplo, passou os últimos anos viajando para o exterior atrás de torneios para disputar e sabe a dificuldade e os custos de estar fora do Brasil. "Acho que o mais importante são os custos, que caem bastante porque as passagens ficam mais baratas e os custos de alimentação e hotel também são bem mais acessíveis do que na Europa, por exemplo. Não joguei mais torneios no Brasil, porque, felizmente, com muito esforço dei um jeito de viajar. Mas acho que gastando menos, eu fico mais tranquila para jogar", comenta Vivian.
Quem corrobora a opinião dela é Roxane Vaisemberg, que aproveitou bem a série de Futures em 2010, vencendo três e fazendo final em mais três. "Esta série foi importante para mim, pois estava retomando ritmo de torneios. No ano passado, não tinha condições de viajar para fora e acabei jogando apenas 13 torneios. Estava com dificuldades financeiras mesmo com os torneios sendo aqui no Brasil. Com este circuito e apoio que estou tendo do clube Hebraica, tive oportunidade de retomar o ritmo de jogos, aumentar a quantidade de torneios, viajar acompanhada e economizar para poder talvez ano que vem viajar para os torneios maiores fora", constata Roxane.
Pode parecer insignificante para quem não está no meio, mas ter o acompanhamento dos treinadores durante uma competição pode fazer a diferença. Outro fator importante é "jogar em casa". Nesses pontos, Roxane e Vivian também concordam: "Nos torneios no Brasil fica mais viável levar um treinador, coisa que para mim é muito difícil quando os torneios são fora. E também tem o lance da cultura, a gente se sente mais em casa, a comida não é estranha, é tudo mais familiar, e isso pode ajudar dentro da quadra também", avalia Vivian.
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Nesta temporada, quantidade de torneios dobrou em relação a 2009
BOM PARA QUEM ESTÁ COMEÇANDO
Para algumas atletas, contudo, a sequência de Futures é interessante, mas não é suficiente. A atual número um do País, Ana Clara Duarte, por exemplo, resolveu fazer as malas e disputar competições mais fortes na Austrália na mesma época dos torneios brasileiros. "Eu tinha duas opções de calendário neste semestre. Com um ranking de 350 em simples, ou ficava no Brasil jogando os Futures, onde não avançaria muito mais em termos de ranking, ou arriscava vir para esse lado do mundo e jogar Challengers. E ainda bem que deu certo!", comemora Ana Clara, que venceu um torneio e fez final em outro na viagem.
No entanto, ela reconhece o valor de se jogar no País, especialmente para quem está dando os primeiros passos no profissionalismo: "Acho que esse número de torneios no Brasil ajuda muito, principalmente quem esta começando. Pode ter certeza que não tem nada melhor do que jogar em casa". Uma das jovens que estão se beneficiando é Monique Albuquerque. "Consegui melhorar meu ranking, ter menos gastos, e isso também me possibilitou jogar uma quantidade maior de torneios. Para mim, que ainda estou entrando no circuito, querendo crescer de ranking e de nível, o importante é jogar, jogar e jogar", comemora Albuquerque.
A "veterana" Maria Fernanda Alves, número um do Brasil durante boa parte dos últimos anos, também acredita que as maiores beneficiadas com os Futures brasileiros são as meninas mais novas: "Essa série de torneios está desenvolvendo e alavancando o tênis feminino brasileiro como um todo, além de ser importante para as tenistas que estão fazendo a transição de juvenil para pro ssional, podendo conquistar os primeiros pontos em casa com custo menor, sem enfrentar problemas do idioma, tendo facilidade de estar junto com o treinador, alimentação, continuidade nos treinos. Isso tudo são fatores que facilitam muito nessa fase inicial". Contudo, assim como Ana Clara, Nanda acredita que serão necessários torneios com premiação maior em 2011. "Para o próximo ano precisa ter mais torneios com premiação maior, para dar sequência na melhoria do ranking das tenistas", diz com a autoridade de quem sabe que car jogando somente Futures não leva a nada.
PERSPECTIVA PARA 2011
Em 2010, jovens promessas como Bia Maia, Carla Forte e Laura Pigossi passaram a pontuar no ranking e outras meninas mais experientes como Roxane Vaisemberg, Teliana Pereira e Nathalia Rossi conquistaram títulos e avançaram na tabela da WTA. Para 2011, a perspectiva é boa. A empresa Redoc Eventos, por exemplo, já estuda - além dos seis Futures que ajudou a realizar neste ano (com apoio da Lei de Incentivo) - organizar duas competições de US$ 25 mil de premiação. "Para 2011 aprovamos projeto através da Lei do ICMS paulista para o centro de treinamento feminino da CBT de São Paulo, que vai nos permitir viabilizar pela primeira vez o trabalho organizado e planejado dessas atletas", conta Ricardo Camargo, diretor da Redoc, junto com Otávio Della. Então, se o ritmo de competições continuar em 2011, podemos até não ter grandes expoentes em termos de ranking, mas certamente teremos uma base maior, de onde poderá surgir um nome forte no futuro.
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Previsão é de que, em 2011, o número de eventos femininos aumente
*Previsão |