Circuito Universitário: começo ou fim do sonho de ser profissional?

Cada vez que uma promessa do tênis nacional segue para disputar a liga universitária norte-americana, a pergunta ressurge: "Ele desistiu de ser profissional?"

José Eduardo Aguiar em 23 de Março de 2009 às 05:41

Tornar-se profissional, ganhar dinheiro, ser reconhecido e viver uma vida toda ligada do tênis. Sem dúvida, este é o sonho de qualquer garoto que está dando seus primeiros passos nas quadras. Quando adolescentes, os que ainda continuam levando o esporte a sério adotam esse discurso de tentar a vida no tênis. Mas, em um país sem tradição na modalidade, como o Brasil, existe uma fase de suas vidas que é considerada fundamental neste processo. Quando o jovem chega aos 17, 18 anos, é preciso tomar algumas decisões que vão além das responsabilidades da época da infância. Vale a pena largar os estudos para tentar seguir a carreira de tenista profissional? Ou será que dá para conciliar cursinho, faculdade, e mesmo assim ainda achar tempo para os treinamentos de alto nível?

Sem muitas opções no cenário nacional, algumas das maiores revelações do País começam a mirar o tênis universitário norte-americano. Apesar de criticados por alguns especialistas, principalmente técnicos, os garotos dizem não se arrepender da opção escolhida neste momento de muitas incertezas em suas vidas. Para entender melhor como funcionam os treinamentos e a vida nas faculdades norte-americanas, a Revista TÊNIS foi atrás de pessoas que vivem o dia-a-dia desta liga tão procurada pelos europeus, mas que ainda enfrenta certo preconceito por boa parte dos sulamericanos.

Será que a ida para os Estados Unidos é realmente uma boa opção para os jovens que ainda sonham em se tornar profissionais? Ou, como afirmam alguns técnicos brasileiros - e esta foi uma das principais polêmicas do começo de 2009, quando a jovem revelação Henrique Cunha decidiu ir para a universidade na terra do Tio Sam e sua decisão foi amplamente questionada, especialmente por Chico Costa, capitão brasileiro da Copa Davis -, ela deve ser usada apenas como um "plano B" caso as coisas não estejam indo bem aqui no Brasil?

Henrique Cunha

Objetivos e mentalidade

Não é novidade que a falta de investimento é a principal dificuldade dos tenistas brasileiros. E não é de hoje que o tênis universitário nos Estados Unidos é usado como uma saída quando a situação aqui no Brasil fica insustentável (financeiramente) para os jovens jogadores. Porém, ao contrário de antigamente, quando esta mudança era considerada apenas uma alternativa ao tênis profissional, hoje em dia, o pensamento dos atletas começa a seguir outra tendência. "No Brasil, não há uma cultura de usar o tênis universitário como preparação e amadurecimento para o tênis profissional. Isso está começando a mudar agora, de um ano para cá", afirma Felipe Fonseca, diretor de uma empresa responsável por mandar vários desses jovens para fora do País.

Basta ver a diferença entre o discurso de jogadores que estão indo agora para essas universidades e aqueles que optaram por este caminho há alguns anos. "Quando achei que meus objetivos no tênis passaram a ser mais sonhos do que realidade, mudei o foco para os estudos sem a menor tristeza", afirma Bruno Rosa, que surgiu como uma das principais promessas do tênis brasileiro, mas que em 2006 seguiu para a Rice University, em Houston, Texas.

André Stábile

Enquanto o catarinense afirma ter tomado esta atitude quando já havia desistido do profissionalismo, o jovem André Stábile revela estar indo para os Estados Unidos com outro objetivo: "Senti que precisava amadurecer mais para enfrentar o tênis profissional. Sempre me cobrei muito e isso não estava me fazendo bem". Stábile, destaque no tênis juvenil, viajará em agosto para a Texas Tech, uma das vinte melhores do ranking norte-americano. Quando chegar lá, se juntará a Vitor Manzini e Raony Carvalho, formando o trio de promessas brasileiras no forte time da primeira divisão da NCAA (Associação Atlética Nacional Universitária - principal liga universitária nos EUA).

Raony Carvalho

Enquanto os tenistas sul-americanos ainda relutam em optar pelo tênis universitário norte-americano, os europeus já seguem este caminho há muito tempo. "A mentalidade brasileira, muitas vezes, vê o tênis universitário como um cemitério de jogadores e muitos atletas com potencial acabam vindo para cá quando já desistiram do profissional", afirma Marcelo Ferreira, técnico brasileiro que trabalha na equipe da Texas Tech. "Já os europeus e norte-americanos vêem a oportunidade de jogar tênis universitário como um atalho para o profissionalismo", compara Ferreira.

Como é o treinamento?

Uma universidade exige muita dedicação dos alunos. Os que começam a trabalhar antes de se formar são obrigados a conciliar o tempo entre os estudos e a profissão, o que exige muito esforço e paciência. No tênis, não é diferente. Porém, uma dúvida que ainda mexe com a cabeça dos jovens brasileiros que pensam em ir aos Estados Unidos é: "Como os estudantes acham tempo para treinar?"

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Não são todas as universidades que oferecem um treinamento com a qualidade que estes meninos encontram no Brasil. "Aqui tem de tudo. É igual 'self service'. Você escolhe o estilo de vida que você quer levar", conta Bruno Seves, atleta da Universidade da Carolina do Sul, escolhido o melhor jogador de 2008 pela segunda divisão da NCAA. Já Daniel Yamamoto, atleta da Universidade de Indiana, revela: "Eu conheço algumas escolas aonde o treino é bem puxado e difícil. Mas, na minha faculdade, o treino nem se compara com o que eu tinha no Brasil", afirma o garoto que treinava com Carlos Alberto Kirmayr.

Bruno Rosa

Se o objetivo é realmente seguir como profissional, é importante fazer uma boa pesquisa para saber como funciona o treinamento em cada universidade. "Tem muitas faculdades em que a qualidade do treinamento é muito boa, não só na quadra como também fora dela. Temos filmagens, análises de vídeos, psicólogo, massagista, fisioterapia e muitos outros fatores que influenciam a performance do tenista", garante Josh Goffi, brasileiro crescido nos Estados Unidos e que disputou a Copa Davis pelo Brasil em 2004. Goffi, especialista em duplas, atualmente faz parte da equipe de treinadores da Duke University, na Carolina do Norte.

Filho de dono de academia em São Paulo, Luiz Carvalho é mais um exemplo de tenista que optou por fazer faculdade lá fora. Na época, já via a viagem como uma oportunidade para conseguir um bom emprego fora do País. Hoje trabalhando na ATP (Associação dos Tenistas Profissionais), Carvalho acredita que a diferença econômica entre os dois países também é um fator que ajuda a vida dos atletas: "Os norte-americanos são muito profissionais e estão anos luz à frente dos brasileiros", conta e lembra como funcionava o esquema em sua época: "Eram dois técnicos, seis quadras cobertas, encordoador, massagista, fisioterapeuta, assessor de imprensa, assistente geral".

Liga = medalha olímpica?

Diego Cubas

Embora conte hoje com 13 tenistas entre os 200 melhores do mundo no masculino e 11 atletas entre as 200 melhores nas duplas femininas, o tênis universitário norte-americano ainda está muito aquém do sucesso de outras modalidades pelo menos em termos de resultados. Nenhum outro lugar do mundo revelou tantos medalhistas olímpicos em Pequim (e por que não em tantas outras Olimpíadas) como a liga universitária norte-americana.

Atletismo, natação, basquete. Todos estes esportes contam com um vasto grupo de atletas entre os melhores do planeta em suas modalidades. É uma verdadeira indústria de campeões. Porém, no tênis, este quadro ainda não está tão evoluído. "A grande diferença para o tênis é que os fenômenos começam a ganhar dinheiro muito rápido quando entram no circuito. Então, eles pulam a universidade", conta Felipe Fonseca. "Um tenista profissional bem sucedido, por exemplo, já faz muito dinheiro nos cinco anos em que atletas de outras modalidades ainda estão estudando", afirma Bruno Rosa.

Enquanto no tênis um atleta fenomenal já pode ganhar milhões de dólares com 17 anos, nos outros esportes eles ainda precisam de muito tempo para atingir este mesmo patamar. "Ou eles estudam e treinam para ganhar uma bolsa e usufruir da infra-estrutura da faculdade, ou param de uma vez", afirma Luiz Carvalho. Fonseca resume bem: "Se o jovem sabe que joga bem, mas ainda não está seguro de tentar a vida no circuito, a universidade é uma boa opção, pois não dá tempo de tentar o profissionalismo e depois tentar a faculdade, mas o contrário sim". Casos como James Blake e Jesse Levine, por exemplo, ficaram menos de dois anos na universidade. Após conseguirem bons resultados na liga e/ou no circuito, deixaram os estudos e partiram para a vida de profissional.

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Qual o futuro então?

A ida de algumas revelações do tênis brasileiro para os Estados Unidos tem revoltado alguns especialistas no Brasil. Seguindo o exemplo de Bruno Rosa, Raony Carvalho, Diego Cubas, Jennifer Widjaja, entre outros tantas promessas de nosso tênis, o jovem Henrique Cunha foi mais um a optar pelo tênis universitário norte-americano, justamente no momento em que todos depositavam no garoto de Jaú esperanças para liderar uma nova geração do tênis brasileiro.

Jenifer Widjaja

Sua ida para as quadras norteamericanas reascendeu a discussão no País. Junto com a polêmica, foi levantada uma questão muito importante nos bastidores da modalidade: "Será que dá para fazer uma faculdade no exterior e ainda continuar a carreira como tenista profissional?" Quem vive ou viveu de perto o dia-a-dia dos treinamentos nos Estados Unidos garante que sim. "Nosso objetivo é lapidar o jogo desses jovens e desenvolver o tênis de todos eles para que possam voltar ao circuito mais preparados e mais amadurecidos", garante o treinador Marcelo Ferreira. "Só depende do jogador querer se tornar profissional depois de terminar a faculdade", reforça Luiz Carvalho.

Aos 29 anos, Rodrigo Grilli está formado pela Universidade da Califórnia - a mesma em que Henrique Cunha estudará - e garante que o treinamento é totalmente propício para um tenista que quer seguir como profissional. "Você só tem a melhorar lá. Tem toda estrutura para ser um pro quando se formar, desde que se dedique e nunca perca o foco", afirmou o paulista, atual número 493 no ranking da ATP.

É exatamente com este pensamento que André Stábile promete viajar para este novo desafio. "É do interesse da universidade que um atleta seu se dê bem no profissional, pois isso é a melhor propaganda para ela", conta o garoto. Questionado se está fazendo a melhor opção, Stábile responde: "Não tenho dúvida. Terei um diploma de curso superior em uma universidade norte-americana, que é muito respeitada. Além disso, terei a oportunidade de treinar com bons jogadores, fazer jogos de alto nível e seguir jogando profissionalmente".

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