Coluna Dr. Fábio Oliveira

Tendinopatia do punho: Saiba mais sobre a lesão de Thiem e Del Potro

A pequena lesão que pode acabar com toda uma temporada


Divulgação/Dominic Thiem

“Ambos os casos (Del Potro e Dominic Thiem), nos mostram com clareza, porque a tendinopatia de punho deve ser levada muito à sério.”

-- Dr. Fábio Carlos Lucas de Oliveira

No cenário tenístico atual, é possível observar que cada vez mais cedo, ensina-se a importância do top-spin na construção de um jogo efetivo. No entanto, não se pode esquecer que golpes que geram uma grande quantidade de top spin, mas com uma baixa qualidade técnica, expõe o tenista a lesões no punho.

Existem vários tipos de lesões no punho. No entanto, grande parte destas lesões acometem o tendão, e por esse motivo são referidas como “tendinopatia do punho” (em inglês, wrist tendinopathy).

Apesar dos estudos científicos terem apresentado números relativamente tímidos para a ocorrência de lesões no punho ao nível profissional e elite (cerca de 7% no circuito WTA e, aproximadamente, 7% no ITF World Tour), a ocorrência dessa lesão é uma grande dor de cabeça para um tenista profissional.

Um dos casos mais emblemáticos desta lesão no circuito profissional de tênis, é o de Juan Martin Del Potro. Entre várias paradas e retomadas, o argentino ficou mais de 9 meses fora do circuito por conta de uma tendinopatia no punho (não confunda com o período afastado por lesões no joelho). Del Potro retornou ao circuito em grande forma, mas voltou a ter uma tendinopatia no punho, que o afastou por cerca de 2 anos. 


Mais recentemente, Dominic Thiem se afastou de diversas competições devido à uma tendinopatia no punho (além de questões psicológicas alegadas pelo próprio jogador). O afastamento das competições ficou evidente quando Thiem abandonou seu jogo contra Adrian Mannarino, ainda no primeiro set, quando vencia por 5-2.  Na sequência, precisou se afastar por 9 meses. 

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Mas os prejuízos causados pela tendinopatia do punho não são exclusividades de Del Potro e Thiem. Vários tenistas profissionais, de ambos os sexos, têm se afastado das competições devido à esta lesão. Os casos de Delpo e Thiem chamam mais a atenção por se tratar de jogadores que figuravam no top10 do ranking mundial. Ambos os casos, nos mostram com clareza, porque a tendinopatia de punho deve ser levada muito à sério.

Como ocorre a tendinopatia do punho?

A tendinopatia do punho é uma lesão causada por “uso excessivo” do tendão extensor ulnar do carpo, localizado na região ulnar do punho. “Movimentos repetitivos” também contribuem para o surgimento dessa lesão, que ocorre frequentemente no lado não-dominante do jogador que usa backhand com 2 mãos. Mas isso não significa que jogadores que utilizam backhand com 1 mão, jamais desenvolverão essa lesão.

Independentemente do nível de jogo, em grande parte dos casos, essa lesão se apresenta inicialmente como um desconforto leve e que parece temporário. Os sinais e sintomas começam de forma quase insignificante, porém a intensidade vai aumentando. Geralmente, quando o tenista percebe a lesão, outras estruturas já estão afetadas e déficits mais sérios já podem ser claramente observados durante uma avaliação clínica.


A tendinopatia do punho está associada às altas cargas de tensão que são absorvidas pelos tendões do punho durante o impacto da bola na raquete. A repetição excessiva desse evento resulta em estiramento e micro rupturas desses tendões e, assim, o processo inflamatório se inicia. Os erros técnicos também podem contribuir para o surgimento dessa lesão, porém esse aspecto é mais observado nos tenistas amadores.

Sintomas e déficits observados nos tenistas

Os sintomas mais comuns da tendinopatia do punho são dor à palpação e à movimentação. Geralmente, ambos os movimentos de flexão e extensão de punho são dolorosos. O local da lesão (a inserção do tendão extensor ulnar do carpo) se apresenta mais quente devido à inflamação e algumas vezes, acompanhado de um pequeno inchaço. O tenista pode relatar dormência e formigamento caso o nervo radial esteja envolvido na lesão.

Já os principais déficits causados por essa tendinopatia são: redução da amplitude de movimento e limitação da função, principalmente no âmbito esportivo.

Os golpes do tênis mais comprometidos são o saque, forehand e o voleio, principalmente em forehand (quando o lado dominante está afetado).

No que se refere ao tratamento, a recuperação da tendinopatia do punho é lenta. A sua recuperação pode levar 6 semanas ou mais, dependendo da gravidade e o estágio da lesão aquando do seu diagnóstico. A continuidade das atividades e/ou movimentos lesivos para as estruturas do punho, têm um importante papel no tempo total de tratamento.


Cuidados iniciais

Tão logo uma tendinopatia do punho é diagnosticada, 2 medidas básicas devem ser tomadas o mais rápido possível para garantir uma boa recuperação. Essas medidas têm impacto direto no desenvolvimento do processo reabilitativo.

  1. Estabilização da articulação. Manter o punho estabilizado é prioridade! A utilização de uma órtese ou bandagem imobilizadora para o punho é altamente recomendável de forma a permitir que os ligamentos e tendões se regenerem.

  2. Alterações/adaptações nas atividades esportivas. Em se tratando de jogadores profissionais, uma parada completa nas atividades esportivas pode ser um pouco mais complicada. Cada caso deve ser analisado individualmente. Para tenistas amadores, uma pausa na prática do tênis é altamente recomendada. Caso o jogador bata uma bolinha durante o período de recuperação, é recomendável que o seu jogo se limite à golpes que não sejam dolorosos (por exemplo, o backhand de uma mão). Dependendo da localização da inflamação, o saque também pode ser executado.

É altamente recomendável que o tenista busque o auxílio de um fisioterapeuta para que essas e outras medidas adequadas sejam implementadas o mais rápido possível.

 

O tratamento

O tratamento pode variar de acordo com o quadro clínico de cada paciente. Ainda assim, a literatura científica recomenda que o tratamento para a tendinopatia do punho seja totalmente baseado em exercícios, uma vez que essas são as melhores evidências para o tratamento desta lesão, principalmente no que se refere ao desenvolvimento de força muscular do antebraço.

Seguindo esta lógica, o processo de recuperação é organizado em 3 fases interligadas por uma progressão gradual.

Fase 1: Normalização da função e estabilização
Fase 2: Retorno aos treinos
Fase 3: Retorno aos jogos

Na fase 1, o objetivo é a normalização da função. Para atingir esse objetivo, as atividades reabilitativas focar no desenvolvimento de força dos músculos que são responsáveis pela estabilização do punho, e na eliminação da dor durante os movimentos.

Na fase 2, o objetivo é implementar, gradualmente, as cargas impostas especificamente durante uma partida de tênis. Compartilho abaixo a estratégia que eu utilizo para o aumento gradual da carga de treino:

  1. Mini-tennis. O atleta é orientado a começar o treino de ambos os golpes, forehand e backhand, da metade da quadra, de forma bem leve, sem força.

  2. Baseline. Golpes do fundo da quadra só com forehand, slice backhand, ou backhand de uma mão. É importante que o jogador não tenha pressa para voltar a utilizar o backhand de 2 mãos, pois este golpe pode ter sido o causador da tendinopatia. Por esse motivo, este golpe deve ser evitado até o final da fase.

  3. Quadra de saibro. O jogador é orientado a treinar em quadras mais lentas, que permite mais tempo para realizar um golpe com a técnica adequada.

  4. Voleios. Os voleios são implementados gradualmente, sempre com o punho estabilizado com bandagem rígida ou órtese. Esses treinos devem ser feitos em sessões curtas de treino.

  5. Baseline. Conseguir realizar os 4 pontos anteriores sem grandes dificuldades (dor e/ou desconforto) pode servir de referência para que o tenista comece a treinar qualquer tipo de backhand do fundo da quadra. No entanto, atenção especial deve ser dada ao “timing” do golpe. Backhand cruzado, com ângulo muito aberto, deve ser evitado até a recuperação total da lesão, pois este golpe gera muita tensão no punho, e favorece o impacto que gera a tendinopatia.

  6. O saque e o smash são os últimos golpes a serem reinseridos no treino.

 

Por fim, na fase 3, o foco é um retorno seguro aos treinos, às partidas e às competições. Quando todas as etapas da fase 2 puderem ser realizadas consecutivamente, sem dor, incômodo e/ou desconforto, o tenista poderá voltar a fazer treinos simulando jogos. Caso o tenista seja capaz de realizar todas as etapas anteriores por 1 semana, sem quaisquer queixas, este poderá tentar fazer um jogo completo.

É muito importante que o jogador e seu treinador estejam atentos ao “timing” e à técnica dos golpes. O bom timing facilita a realização de uma técnica correta, fluida, e com o mínimo de esforço.

As informações apresentadas acima possuem apenas caráter informativo. Portanto, não substituem, em nenhuma hipótese, a avaliação e tratamento realizados por um fisioterapeuta especializado em lesões esportivas.

Em caso de dúvidas, entre em contato com o autor através de um dos meios de comunicações disponíveis abaixo.

No próximo artigo, apresentaremos dicas para prevenir lesões nos treinos de backhand e como evitar a reincidência de uma tendinopatia do punho. Não perca!

 

O que diz a ciência?

A literatura científica tem apresentado números relativamente tímidos para a ocorrência de lesões no punho ao nível profissional e elite (cerca de 7% no nível elite feminino – WTA e, aproximadamente, 5% de todas as lesões no circuito profissional e junior da International Tennis Federation (ITF), incluindo ambos os sexos).

No nível universitário, as lesões na mão e punho correspondem à aproximadamente 10% de todas as lesões no sexo masculino e, aproximadamente, 6% no feminino.

No nível amador, o índice de lesões no punho aumentam consideravelmente em comparação com o nível profissional e elite.

Mais recentemente, uma análise epidemiológica publicada em 2021 revelou que as lesões no punho e mão representam cerca de 18% de todas as lesões dos tenistas amadores.  

Referências:

  1. Dakic JG, Smith B, Gosling CM, Perraton LG. Musculoskeletal injury profiles in professional. Women’s Tennis Association players. Br J Sports Med 2018; 52:723–729.
  2. Chung KC, Lark ME. Upper extremity injuries in tennis players: diagnosis, treatment, and management. Hand Clin 2017; 33(1):175-186.
  3. Correia JP.  Injury surveillance and pattern of medical complaints at ITF junior and pro circuit tennis tournaments. J Med Sci Tennis. 2020; 25(1):26-37.
  4. Kaiser P, Stock K, Benedikt S, Ellenbecker T, Kastenberger T, Schmidle G, Arora R. Acute Tennis Injuries in the Recreational Tennis Player. Orthop J Sports Med. 2021; 9(1):1-7. 
  5. Lynall RC, Kerr ZY, Djoko A, Pluim BM, Hainline B, Dompier TP. Epidemiology of National Collegiate Athletic Association men’s and women’s tennis injuries, 2009/2010–2014/2015. Br J Sports Med 2016; 50:1211–1216.


Dr. Fábio Oliveira

Fisioterapeuta no circuito profissional ATP • PhD em Reabilitação
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Fábio Oliveira

Publicado em 30 de Maio de 2022 às 00:00


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