O sucesso do trio mineiro, com Marcelo Melo, André Sá e Bruno Soares, neste ano foi enorme. Para 2009, eles prometem mais
Rodrigo Linhares em 5 de Dezembro de 2008 às 12:11
Para muitos, 2008 ficará marcado pela aposentadoria de Gustavo Kuerten. O tricampeão de Roland Garros e ex-número um do mundo deu seu adeus definitivo e deixou muita gente órfã. Na verdade, há algum tempo os fãs brasileiros de tênis (não somente de Guga) procuravam revigorar sua torcida, já que o catarinense não andava bem das pernas. E justamente no ano em que o grande campeão decidiu que não jogaria mais, surgiu um novo alento. Um não, três.
De repente, Minas Gerais virou sinônimo de tênis no Brasil, com André Sá, Marcelo Melo e Bruno Soares. Os rapazes de Belo Horizonte tornaram-se referência e já começam a fazer história. Melo e Sá são parceiros intermitentes desde meados de 2006, mas fixos desde maio de 2007, quando decidiram, após o Challenger de Praga, que ficariam juntos. A partir daí, foram semifinalistas em Wimbledon e atingiram as quartas no US Open.
Em 2008, conquistaram o título do Brasil Open, Poertschach, New Haven, além de alcançarem a final em Queen's. No fim, terminaram o ano em nono lugar das parcerias e quase jogaram a Masters Cup. Ficaram na reserva. Por pouco não repetiram a façanha de Carlos Alberto Kirmayr e Cássio Motta, que competiram no torneio em 1984; e Jaime Oncins, que disputou o evento em 2000, ao lado do argentino Daniel Orsanic.
De Melo e Sá, todos esperavam algo nesse patamar, mas quem surpreendeu mesmo foi Bruno Soares. Após sofrer durante muito tempo com uma lesão, poucos acreditavam que ele pudesse retomar a carreira de maneira tão brilhante. O tenista de 26 anos, começou bem esta temporada. Logo na primeira semana, venceu o Aberto de São Paulo com o britânico Jamie Delgado. Em seguida, formou boa parceria com Thomaz Bellucci, vencendo o Challenger de Tunis e fazendo finais em Bogotá e Florianópolis.
Em um lance de sorte, entrou na chave de Roland Garros com o sérvio Dusan Vemic após algumas desistências e foi à semifinal. Ao lado do sérvio, ainda foi à quartas do US Open. Porém, o principal título, em Nottingham, veio junto com o experiente Kevin Ullyet, do Zimbábue, que vinha formando uma das melhores duplas do mundo nos últimos anos com o sueco Jonas Bjorkman.
Com a aposentadoria do sueco, Soares tomará seu lugar ao lado do zimbabuano de 36 anos em 2009. O contato entre os dois surgiu quando o mineiro e Vemic venceram Bjorkman e Ullyett em Roland Garros. O tenista do Zimbábue gostou do brasileiro e o convidou para jogar em alguns torneios. O entrosamento foi fácil e eles ganharam em Nottigham e foram vice em Washington.
Com o anúncio da aposentadoria de Bjorkman, Soares tomou iniciativa: "Liguei para o Kevin e falei: 'Olha, para o ano que vem quero um parceiro fixo e, como me dei bem com você tanto dentro como fora da quadra, gostaria de te convidar.
Mas fique livre para pensar'. Ele me respondeu na hora, foi ótimo".
Sendo assim, a expectativa para 2009 é grande e os três são fortes concorrentes para uma vaga na Masters Cup. Melo e Sá já aparecem no top 20 do ranking de entradas neste fim de temporada e Soares está próximo disso. Somente Kirmayr e Motta atingiram rankings melhores (Cássio em quarto e Carlos Alberto em sexto, em 1983) e Oncins esteve em 22º em 2000.
#Q#Bruno Soares (acima) e a dupla Marcelo Melo e André Sá (na página anterior) |
TRADIÇÃO NAS DUPLAS
A habilidade brasileira nas duplas não é novidade. A maior vencedora do tênis brasileiro foi a primeira a mostrar, internacionalmente, toda a capacidade dos duplistas nacionais. Maria Esther Bueno conquistou 20 torneios de Grand Slam entre 1958 e 68. Destes, 13 foram em duplas (uma mista). Em 1960, ela se tornou a primeira mulher a completar o Grand Slam em parcerias. Ganhou o Aberto da Austrália, ao lado da britânica Christine Truman, e faturou Roland Garros, Wimbledon e US Open com a norte-americana Darlene Hard.
Maria Esther Bueno |
Na esteira de Maria Esther, o Brasil teve uma dupla de extremo sucesso na Copa Davis: Thomaz Koch e Edison Mandarino. Durante a década de 60 e início de 70, eles disputaram 32 partidas pela competição entre países, perdendo apenas nove. Entre as maiores vitórias, bateram os romenos Ilie Nastase e Ion Tirac, os tchecos Jan Kodes e Jan Kukal, os iugoslavos Niki Pilic e Boro Jovanovic, os espanhois Juan Gisbert e Jose Luis Arilla, os chilenos Jaime Fillol e Patricio Cornejo, entre outros. Em 1975, Koch ainda venceria Roland Garros em duplas mistas, com a italiana Fiorella Bonicelli.
Depois do sucesso de Koch e Mandarino dois jovens, que acompanharam as vitórias brasileiras na Davis, acabaram por se tornar excelentes duplistas na década de 80. Carlos Alberto Kirmayr, com apenas 1,72 m, compensava a pouca altura com incrível rapidez e agilidade nos voleios. Cássio Motta, seu parceiro, dez anos mais novo, se destacava pela firmeza das devoluções, com uma direita poderosa.
Mesmo com a diferença de idade, a união das habilidades gerou frutos que os levou ao Masters em 1984 e, um ano antes, ao top 10. Como seus antecessores, Kirmayr e Motta também obtiveram vitórias sobre parcerias de grande expressão como Tim e Tom Gullikson, Sandy Mayer e Ferdi Taygan, Andres Gomez e Ricardo Ycaza, Heinz Gunthardt e Balazs Taroczy etc.
Carlos Alberto Kimayr e Cássio Motta |
Motta ainda foi finalista de duplas mistas no Aberto Francês com Cláudia Monteiro, em 1982, mesmo ano em que atingiu as semifinais do mesmo evento ao lado do britânico John Feaver. Dez anos depois, ele voltaria à semi em Paris, mas com o argentino Pablo Albano.
Depois disso, o principal nome das duplas no Brasil foi Jaime Oncins. Habilidoso, Jaiminho fez sucesso ao lado do argentino Daniel Orsanic, com quem disputou o Masters em 2000.
No mesmo ano, foi à semifinal de Roland Garros. Em 2001, atingiu a final mista ao lado da argentina Paola Suarez. Oncins se deu bem jogando com outros parceiros, como Luiz Mattar, Andres Gomez e, especialmente, Gustavo Kuerten, com quem garantiu diversas vitórias brasileiras na Davis.
#Q#MINEIROS FALAM
Agora, seguindo esta longeva tradição de bons duplistas, surgem André Sá, Marcelo Melo e Bruno Soares, de Minas Gerais. Para você conhecer melhor esses mineiros, a Revista TÊNIS bolou algumas perguntas para os três. Além disso, cada um deles montou o parceiro dos sonhos com atletas que disputam o circuito profissional.
MARCELO MELO
Qual o segredo dos mineiros para ter tanto sucesso nas duplas atualmente?
Acho que é uma coincidência grande. Mas, desde pequenos, temos prazer em jogar duplas e sempre o fizemos nos torneios. Isto certamente ajudou em nosso desempenho atual.
No tênis, confiança ganha jogo. Como vocês agem quando percebem que a confiança do parceiro está indo embora?
É muito difícil administrar isso dentro de quadra. Procuramos conversar sobre o andamento do jogo entre os pontos e as viradas de lado, assim podemos ajudar um ao outro. O principal é sempre estarmos positivos.
Qual de vocês fica mais atento à tática da dupla adversária?
Sempre montamos as táticas juntos. Algumas vezes, conheço mais os adversários, outras vezes, o André é quem conhece melhor. Baseados nisto, montamos as estratégias.
Qual é a dupla mais "gente boa" do circuito? Por quê?
Seria injusto falar de uma dupla mais "gente boa", pois têm varias duplas de que somos próximos, como os israelenses Jonathan Erlich e Andy Ram e os Bryans.
Qual o melhor duplista que você já viu jogar?
Daniel Nestor.
Os irmãos Bryan são estrelas do circuito, aparecem em destaque no site da ATP. A valorização dos duplistas no Brasil, mesmo com a tradição de grandes nomes no passado, ainda é pequena?
Ainda é pequena, mas por falta de resultados. Desde a nossa semifinal de Wimbledon, em 2007, o destaque para as duplas melhorou. Acredito que nossos resultados estão ajudando a chamar a atenção para este tipo de jogo. Acho que, aos poucos, estamos conseguindo nosso espaço, uma prova disso é que hoje podemos ver vários jogos de duplas transmitidos pela televisão.
Quais as principais vantagens e desvantagens que você leva nos jogos por ser um dos tenistas mais altos do circuito?
Posso dizer que as vantagens servem para a dupla, pois posso cobrir mais a quadra com meu tamanho, ajudando muito o André. A desvantagem é que, por ser tão grande, sou um pouco mais lento. Mas, como André é muito rápido, acaba me compensando.
Qual o segredo dos tenistas de Minas Gerais nas duplas?
Não tem segredo, nossa amizade de muitos anos ajuda muito.
No tênis, confiança ganha jogo. Como vocês agem quando percebem que a confiança do parceiro está acabando?
Quando a confiança está indo embora, você tem que tentar ficar positivo. É isso que tento passar para o Marcelo e ele para mim.
Quem fica mais atento à tática da dupla adversária?
Até pouco tempo, eu vinha fazendo mais isto, porque tenho mais experiência no circuito. Mas, como o Marcelo amadureceu muito e está conhecendo melhor todos os jogadores, podemos decidir juntos o que fazer.
Qual é a dupla mais "gente boa"? Por quê?
Acho os Bryans muito legais. Eles jogam com uma energia de dar inveja. Fora da quadra, eles gostam muito de música, como eu.
Qual o melhor duplista que você já presenciou jogando?
Todd Woodbridge
A valorização dos duplistas no Brasil ainda é pequena?
Como o brasileiro gosta de resultados, se eu e o Marcelo ou o Bruno conseguirmos chegar a uma final de Grand Slam, o reconhecimento das duplas vai subir muito. Torço para que isso aconteça.
Quais os principais aprendizados que você tirou da época que esteve nos Estados Unidos treinando com Nick Bollettieri?
A principal coisa que aprendi lá fora foi a me virar sozinho. No tênis, isto é muito importante dentro e fora das quadras. Lá dentro, você está sozinho e tem que tomar decisões rápidas para virar uma partida. E fora dela, você passa muito tempo sozinho, tendo que tomar suas decisões sem ajuda.
#Q#Qual o segredo do segredo dos mineiros nas duplas?
Acho que é um pouco da cultura de Belo Horizonte. Nós todos fomos criados em clubes de tênis, onde, geralmente, as pessoas vão jogar duplas. Com isso, acho que desenvolvemos uma habilidade a mais para a modalidade.
Você já ganhou títulos de duplas com vários parceiros diferentes. O que lhe ajuda a conseguir se adaptar aos companheiros de forma rápida?
O mais importante é saber como seu parceiro joga e como ele se sente confortável jogando. Se você consegue enxergar isso bem, acaba conseguindo ser melhor taticamente e aumenta suas chances de vitória. Se você vai jogar com parceiros diferentes, não adianta impor a sua tática, e sim, a que mais combina com você e seu parceiro.
Você costuma discutir taticamente uma partida com seu parceiro antes do jogo ou vai muito de improviso?
Sempre. A cada jogo, não importa o parceiro, sentamos e falamos sobre o jogo, sobre os adversários, sobre a nossa tática e outras coisas. O pré-jogo é tão importante quanto o jogo.
Qual o melhor duplista que já viu jogar?
O mais completo da atualidade, para mim, é o Daniel Nestor.
Você já fez dupla com um tenista que admirava muito e pensou: "Não posso decepcionar este cara!"?
Na primeira vez que joguei com o Kevin Ullyett senti mais ou menos isso: a responsabilidade de corresponder ao nível de tênis que ele está acostumado a jogar. Mas, com o tempo, isso vai passando e as coisas se tornam naturais.
Quais suas metas para a carreira e para a próxima temporada?
Para a carreira, é jogar tênis tanto quanto conseguir. Esse é o esporte que amo e o que me deixa feliz. Para a próxima temporada, firmei parceria com o Ullyett. Tenho como meta chegar entre os dez primeiros do mundo e jogar a Masters Cup.
Você ainda pensa em jogar simples?
Não, estou 100% focado na dupla e é isso que espero fazer até o final.
PARCEIRO DOS SONHOS
MARCELO MELO
Saque: Andy Roddick
Devolução: Roger Federer
Voleio: Daniel Nestor
Direita: Fernando Gonzalez
Esquerda: Rafael Nadal
Concentração: Mario Ancic
Coração: Rafael Nadal
ANDRÉ SÁ
Saque: Andy Roddick
Devolução: Jonas Bjorkman
Voleio: Daniel Nestor
Direita: Roger Federer
Esquerda: David Nalbandian
Concentração: Rafael Nadal
Coração: Rafael Nadal
BRUNO SOARES
Saque: Andy Roddick
Devolução: David Nalbandian
Voleio: Kevin Ullyett
Direita: Roger Federer
Esquerda: Jonas Bjorkman
Concentração: Mario Ancic
Coração: Rafael Nadal