O Midas da preparação física

Pat Etcheberry, maior nome da preparação física de tênis no mundo, esteve no Brasil e contou um pouco de seu segredo

Rodrigo Linhares em 6 de Novembro de 2008 às 13:04

Por trás de um grande tenista há sempre um grande técnico. Talvez. É mais certo que haja um grande preparador físico. E isso graças basicamente a uma única pessoa: Pat Etcheberry. O chileno, radicado nos Estados Unidos, é o maior nome do condicionamento físico de tênis (e outros esportes como golfe, basquete e futebol americano) e por suas mãos já passaram inúmeras estrelas, como Pete Sampras, Andre Agassi, Monica Seles, Martina Hingis, Justine Henin só para citar poucos exemplos. Desde o início de 2008, ele cuida da preparação de outra número um, Jelena Jankovic, entrevistada desta edição.

Etche, como é conhecido por seus atletas, disputou provas de atletismo nas Olimpíadas de Tóquio, em 1968. No fim de sua carreira profissional, começou a se especializar na preparação física de atletas das mais diversas modalidades. No entanto, é no tênis que ele tem os resultados mais impressionantes. O preparador detém um recorde incrível de mais de 90 Grand Slams conquistados por tenistas enquanto trabalhavam com ele.

Em visita ao Brasil, no 4º Simpósio Internacional de Tênis, Etcheberry deu instruções práticas e teóricas em duas palestras. As apresentações do chileno também foram recheadas com uma bem humorada participação de voluntários que tentavam fazer os exercícios propostos. A Revista TÊNIS estava lá e falou com exclusividade com este mestre da preparação física.

Qual porcentagem do sucesso de um tenista depende da sua parte física?
Hoje, cada vez mais jogadores estão trabalhando a preparação física. O condicionamento tem importância vital. Mas, quando trabalho com um jogador, penso em como vamos trabalhar como uma equipe. Vou trabalhar a parte física, o treinador a parte técnica e toda a equipe tem que estar envolvida na preparação para ter sucesso. É minha responsabilidade deixar o jogador saudável. Mas também trabalho na forma correta de o atleta chegar à bola, pois, às vezes, ele tem uma ótima técnica de forehand, mas, se não for rápido o bastante para chegar bem na bola, não vai adiantar. Então, o preparador físico e o técnico têm que trabalhar juntos.

Você acredita que existe alguma relação entre um jogador ter uma boa preparação física e ter uma boa preparação mental?
Certamente. Se você está muito bem preparado no aspecto físico, isso não só lhe torna mais forte mentalmente como também coloca a pressão no seu adversário. Ele sabe que a parte física não vai ser um problema para você e, se você ganha o primeiro set, ele pensa: “Oh, oh, vai ser uma longa partida”. E ele sabe que você está mais preparado para isso do que ele.

Existem muitas diferenças entre o condicionamento físico para o tênis e para outras modalidades?
Em primeiro lugar, tênis é um esporte individual. Se você se cansar na quadra, não pode pedir substituição e colocar outra pessoa no seu lugar. Ao mesmo tempo, você tem que ser forte e também tem que ser muito rápido a cada 20, 25 segundos. Então, exige esta habilidade de jogar muitos pontos em um período curto de tempo e é assim que você tem que treinar: exercícios curtos e intensos.

É possível conciliar o trabalho de força e de agilidade de um tenista?
Sim. Se você olhar os jogadores top, eles são todos fortes. Então, você tem que analisar a sua massa para não perder agilidade na quadra. Este ano, Nadal está menor do que era antes e jogando melhor. Você sempre pode encontrar o que deve ser feito com seu jogador para torná-lo melhor.

Hoje, quem é o melhor jogador na parte física? Por quê?
Nadal é bom, mas acho que as pessoas subestimam Federer. Ele é melhor nisso do que as pessoas pensam. O modo como ele se movimenta na quadra é muito suave. Ele me lembra muito, fisicamente, o Sampras.

E no feminino? Jankovic é a mais preparada?
Acho que ainda não, mas, no ano que vem, ela será. Ela fez um compromisso de melhorar sua técnica e, no ano que vem, vai atingir um nível ainda mais alto.

#Q#

Quais as principais diferenças do trabalho com homens e mulheres na parte física?
Todos os jogadores são diferentes, homens e mulheres. Em um ano, comecei um trabalho, em março, com três jogadores ao mesmo tempo. Um, depois de três dias, falou que ia para casa e voltaria no final da semana. Nunca mais voltou. Este era o mais talentoso dos três. Os outros eram Jim Courier e Sampras. E no final de agosto, começo de setembro, Pete venceu o seu primeiro US Open. Falei: “Vamos checar o trabalho que foi feito”. Pete gastou 75% do seu tempo, de março a agosto, na academia. Ficando mais forte. Ao mesmo tempo, Courier gastou 26% do seu tempo na academia. Pete era muito fraco, tinha que ser mais forte. Eventualmente, com um jogador perfeito, trabalharia 33% no condicionamento, 33% com a movimentação e 33% com a força. Então, você adapta isso de acordo com a necessidade do jogador.

E você acredita que exista um biótipo ideal para os tenistas?
Justine Henin e Serena Williams. Há muita diferença. Às vezes, as pessoas ficam falando: “Queria ser mais alto, ser mais isso...”. Existem muitas pessoas talentosas, mas que não realizam as coisas porque não querem se sacrificar e não trabalham duro o suficiente para chegar lá. A determinação e o espírito de luta que você vê em alguns jogadores são mais importantes. Courier e Thomas Muster nunca foram os jogadores com mais facilidade de aprimorar a parte física, mas eram animais em quadra e nos treinos, pois sabiam que isto iria fazer a diferença. Então, sem desculpas. Desculpas não trazem resultados.

Qual a idade ideal para se iniciar o trabalho na parte física?
O mais cedo possível. Você pode adaptar o treino para a idade do menino ou da menina. Também depende do desenvolvimento de cada um. Mas quanto mais cedo você fizer exercícios de coordenação, movimentação, é melhor, porque muitas habilidades são desenvolvidas quando se é mais novo.

"Sempre trabalho no ponto fraco. Se um jogador tem um ótimo saque, você pode melhorar cerca de 0,5% deste golpe. Mas, se o backhand é ruim, você pode melhorálo em 5 ou 10%. Então, se você trabalha nas deficiências, pode fazer delas uma arma"

 

Você sempre diz que gosta de trabalhar nas fragilidades de seus atletas. Os jogadores reagem bem a isso?
Sempre trabalho no ponto fraco. Se um jogador tem um ótimo saque, você pode melhorar cerca de 0,5% deste golpe. Mas, se o backhand é ruim, você pode melhorá-lo em 5 ou 10%. Então, se você trabalha nas deficiências, pode fazer delas uma arma. Os jogadores têm que estar prontos para treinar as dificuldades. Quando começo o trabalho com um tenista, pergunto para ele o quão bom ele quer ser. Então, digo o que teremos que fazer para alcançar este objetivo. Se quiser fazer, ótimo. Se não, procuro outra pessoa para chegar lá.

Qual a importância do trabalho pós-jogo?
Ele é importante mental e fisicamente. Em Roland Garros, quando Courier ganhava e nós saíamos para caminhar logo em seguida, as pessoas pensavam que estávamos fazendo aquilo para nos exibir. Atualmente, todos os jogadores ficam uns 30, 45 minutos se recuperando. Quando se joga uma partida, seu corpo fica com uma hiperatividade. Você precisa relaxar para depois deitar na cama e ter uma boa noite de sono, para poder jogar uma boa partida no dia seguinte. Além disso, é muito importante que você pense sobre a partida, quais foram as decisões certas e erradas.

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