Como equilibrar técnica e brincadeira nas aulas para crianças?

Saiba como treinar um pequeno tenista sem tirar a diversão de dentro das quadras

Suzana Silva em 17 de Junho de 2016 às 11:16

Professores, é o seguinte: para vencermos a batalha entre os esportes e os jogos eletrônicos, temos de ser cada vez mais competentes na arte de ensinar. Se nos anos 1970 e 1980 as aulas visavam apenas aprimorar o gesto motor através de exaustivas repetições por períodos que podiam durar meses, atualmente o professor precisa criar desafios novos continuamente para manter uma criança envolvida e motivada a continuar praticando o tênis.

Nos anos 70, as possibilidades de lazer eram reduzidas. Poder frequentar um clube era um luxo e, de certa forma, ainda é, mas havia a rua para brincar de futebol, de carrinho de rolimã, de amarelinha e de empinar pipas. As crianças brincavam horas seguidas na rua, e quem podia ficava horas seguidas nas quadras de seu clube. Por tentativa e erro, e muitas repetições nas aulas e no paredão, íamos aprendendo o jogo e curtindo a vida na companhia dos amigos.

Atualmente a realidade das grandes cidades enclausurou as crianças, que não brincam mais nas ruas por questões de segurança. Sem brincar, as crianças demoram mais para se desenvolver no aprendizado das habilidades motoras e no desenvolvimento de suas capacidades físicas. As crianças de hoje não têm tônus muscular nem para sentar mantendo uma postura ereta. Imaginem para correr atrás da bolinha.

O professor recebe, então, crianças com pouco tônus muscular, com pouca experiência nos jogos com bola – e, portanto, com pouco timing antecipatório e diminuta visão periférica – e extremamente sensíveis aos comentários dos colegas sobre suas dificuldades psicomotoras. Se no conforto do seu quarto a criança pode jogar o videogame favorito, tranquila, segura, livre dos comentários maldosos dos colegas e das reclamações de professores despreparados, está montado o quadro para o abandono do esporte por completo.

Meio termo

Precisamos fazer com que elas brinquem mais. Mas, oferecer brincadeiras legais na quadra de tênis e tornar a aula divertida não é suficiente. A criança precisa aprender e melhorar, evoluir técnica e taticamente. O desafio do professor é acertar na medida, ou seja, transformar o comportamento motor da criança na direção de golpes biomecanicamente eficientes, num ambiente lúdico, cativante e seguro, tanto emocional como fisicamente.

Podemos imaginar dois extremos: numa ponta está o professor “recreador”, que possui um repertório incrível de brincadeiras e de jogos com bola e raquete, é alegre, carismático e carinhoso com as crianças; na outra está o professor “tecnicista”, que procura aperfeiçoar cada detalhe técnico dos golpes da criança através de muitas repetições e de feedback constante sobre o movimento desejado. Queremos estar no meio dessa faixa contínua, ofertando atividades que sejam divertidas, ao mesmo tempo em que proporcionam melhoras.

Como fazer isso?

As crianças amam desafios e jogos. De acordo com o programa francês de ensino de tênis para crianças – o Club Junior –, as crianças querem numa aula de tênis: jogar pontos, pular e correr, ter desafios individuais e em equipes, e fazer novos amigos. Fica claro que as aulas em grupo são a melhor maneira de proporcionarmos isso, pois é com outras crianças que os jogos irão acontecer de maneira mais natural. Numa aula individual, um professor hábil também pode criar exercícios e jogos, mas não é a mesma coisa.

Tendo um planejamento ordenado de golpes a ensinar, o professor trará um tema principal diferente para trabalhar a cada uma ou duas aulas. Nesse tema, o professor observará aspectos técnicos mínimos que precisam ser respeitados por cada aluno para que a tarefa proposta dentro do tema possa efetivamente acontecer. Dando um exemplo bem simples:

FAIXA ETÁRIA: 6 a 8 anos, quadras vermelhas.
TEMA: rebater um golpe de fundo de quadra pelo lado dominante por cima da rede e cruzado (forehand).

Aspectos técnicos que podemos observar:

Exemplos de atividades divertidas que trabalham a técnica:


1.
Para trabalhar a percepção da direção da trajetória da bola com os alunos, podemos fazer um jogo de aquecimento usando dois arcos de cores diferentes, uma bolinha vermelha e um coninho. A criança 1 é a lançadora e fica de um lado da rede lançando ao arco que está na quadra da criança 2, que é a receptora. A criança 2 deve gritar, antes da bola da criança 1 passar da rede, a cor do arco no qual a bola irá quicar. A criança 2 marca pontos quando acerta a cor do arco e quando consegue encaçapar a bola no coninho que está segurando. A cada quatro pontos, trocam de posições.


2.
Para trabalhar o deslocamento e a formação de uma boa base para executar o golpe, podemos realizar um drill no qual a criança deve saltar um obstáculo baixo (disquinhos ou um elástico preso em duas cadeiras) com a posição de expectativa, depois correr na direção de uma faixinha colocada na quadra e se posicionar em cima dela como se estivesse subindo num skate, em seguida executar o golpe. Para transformar esse exercício num jogo, damos um ponto para a posição de expectativa, um ponto para a execução do golpe de cima da faixinha sem perder o equilíbrio e um ponto caso a bola vá por cima da rede.


3.
No golpe propriamente dito, podemos incluir um alvo compatível com o nível da turma (nesta faixa etária, marcar uma área alvo com faixinhas é a melhor pedida) e ver quem acerta mais vezes o alvo num período de, digamos, 2 minutos. Para acertar um alvo, as crianças começam a alinhar e a firmar seu ponto de contato. Mas o professor precisa ter em mente quais critérios esse ponto de contato irá observar e cobrar durante seus feedbacks: contato ao lado do corpo, na altura da cintura da criança, com o pulso firme.

Sempre ficar de olho

Cada conteúdo possui um critério (padrão desejável de execução) que deve ser enfatizado durante toda a aula com feedback constante. O que é uma boa base para rebater um backhand? Qual o ponto de contato ideal para um voleio forehand? Como deve atuar o braço lançador no saque? E a empunhadura mais adequada para um bom smash?

Os critérios evoluem conforme a idade e a experiência do aluno, ou seja, os critérios que cobramos de uma criança no saque, por exemplo, não são os mesmos que cobramos de um tenista avançado. Não pediremos que uma criança realize um saque com salto e chute da perna de trás, mas observaremos atentamente que ela se posicione de lado para a rede e não mexa os pés durante a execução do saque no início do aprendizado.

Os Cursos de Capacitação são imprescindíveis para aumentar o conhecimento técnico dos professores e para firmar bem quais são esses critérios, que evoluem constantemente graças às melhoras dos equipamentos e da qualidade física dos atletas. Graças aos cursos, nenhuma atividade na quadra de tênis será dada sem propósito: todas elas levarão a um aumento de repertório motor dos pequenos, para que os golpes maduros possam florescer. E, ao mesmo tempo, conhecer e se aproximar do mundo lúdico e pleno de aventuras da criança é a chave para um programa de tênis infantil ter sucesso.

Professores que querem cativar a meninada para o tênis devem levar a diversão muito a sério. Mas sem perder a técnica de vista jamais.

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