AO 2010: "Ballboy" é mais um representante brasileiro em Melbourne

Sonhando em ser profissional, Jorge Cotrim é o único representante sul-americano entre os boleiros do Australian Open

José Eduardo Aguiar, Direto De Melbourne em 19 de Janeiro de 2010 às 03:32

A roupa rosa, embora confortável e com proteção ao sol, não agradou o garoto
Entregar uma bolinha a Roger Federer, oferecer uma toalha a Rafael Nadal, estar a menos de um metro de Maria Sharapova. Esse é o grande sonho de um "Ballboy" (boleiro, no Brasil). Em Melbourne, onde vive há quatro anos com os pais, o goiano Jorge Cotrim é o único representante brasileiro entre os mais de 200 garotos que trabalham dia e noite para que as grandes estrelas possam jogar com tranquilidade o primeiro Grand Slam da temporada.

Um dos melhores juvenis do ranking nacional australiano (atualmente figura na 45ª colocação), Jorge, prestes a completar seus 16 anos, já tem muitas histórias para contar. No Brasil, chegou a morar em Goiânia, Belo Horizonte, Belém e Brasília, seguindo os passos do pai - Cesar Cotrim, profissional do meio de telecomunicações. E foi justamente da capital Federal que o menino, então com 12 anos, rumou para o outro lado do mundo para viver aqui, na Austrália.

Se a vida lhe fez tomar vários destinos, pelo menos uma paixão Jorge sempre levou consigo por todos os lugares que passou: o tênis. Ainda com nove anos, começou a dar suas primeiras raquetadas, inspirado, claro, em Gustavo Kuerten. Porém, não seria o brasileiro o maior inspirador para o "Ballboy". Com fala mansa, típica do centro-oeste do País, o menino não esconde a admiração por Roger Federer.

"No começo, meu ídolo era o Guga, mas logo comecei a admirar o Federer. Ele é meu grande ídolo", confessa o goiano. E foi inspirado no suíço que Jorge procurou, assim que chegou a Melbourne - de onde veio do Brasil acompanhado dos pais, Cesar e Sivone - um lugar para aprimorar o tênis que havia começado a praticar há três anos, assistindo às partidas de fim de semana do pai.

Amante de tênis, Cesar logo trouxe o filho para conhecer as instalações do Melbourne Park, complexo onde é realizado o Australian Open. "Aqui eles têm toda uma estrutura para os garotos. Eles treinam com técnicos que foram ex-tenistas, que passaram depois por uma seleção rigorosa de qualidade. São dois treinadores por quadra, nutricionista, fisioterapeuta. É uma estrutura realmente de primeiro mundo", conta o goiano de 46 anos, sempre disposto a ajudar a carreira do filho.

Com direito a foto após a partida, Jorge aproveitou folga para torcer por Hocevar
Foram 12 meses treinando duro nas quadras do Grand Slam australiano, mas a distância de casa fez a família repensar a rotina do garoto. Então, Jorge mudou para uma escola especializada de tênis - mais próxima do bairro onde moram -, onde concilia o esporte e os estudos. E foi justamente lá que surgiu a ideia de virar um dos boleiros do importante torneio. "Um amigo meu australiano me contou sobre o processo de seleção, que a gente podia se inscrever pela Internet. Eu entrei, fiz dois testes e passei", lembra o menino, que já está em seu segundo Australian Open.

O trabalho não é nada fácil. São oito horas diárias em baixo do forte sol do verão australiano. Porém, nada que desanime o brasileiro. "A chance de estar diante de alguns de meus ídolos compensa qualquer coisa. Ano passado cheguei a trabalhar no jogo do (Gael) Monfils e outro do (David) Nalbandian, que na época era um dos meus tenistas preferidos", relembra Jorge. Porém, se engana quem pensa que o garoto já se dá por satisfeito. "Eu quero mesmo é pegar um jogo do Federer ou do Nadal, na Rod Laver. Isso seria um grande sonho".

Para isso, porém, o goiano terá que trabalhar duro. Os garotos são avaliados diariamente, em notas de 1 a 5. "Eles olham se a gente está rolando a bola direitinho, se não estamos se atrapalhando no posicionamento, se estamos fazendo tudo como combinado", revela o boleiro. "Conforme a gente vai sendo bem avaliado, podemos ser chamados para os grandes jogos, onde só vão os garotos que estiverem realmente trabalhando muito bem".

Ao lado do pai, o garoto aproveita outra de suas raras folgas durante o torneio
Se preencher todos os requisitos, se for bem avaliado nos "jogos menores", os garotos finalmente são chamados para uma quadra maior, para jogos de tenistas de grande expressão. A recompensa, além de poder estar diante dos ídolos, não é financeira, mas vem através de algumas regalias. Os garotos recebem 20 dólares australianos diários para alimentação, 80 dólares de transporte para as duas semanas de torneio e mais uma série de brindes dos patrocinadores oficiais do evento - que vão desde tênis, roupas, meias e até raquetes.

Em 2010, Jorge espera finalmente poder encontrar seu grande ídolo, Roger Federer. Enquanto isso, porém, aproveita para acompanhar os tenistas brasileiros. "Durante minhas horas de folga, tento acompanhar as partidas do pessoal. Vi alguns jogos do Hocevar no quali e tentarei ver o Bellucci e o Daniel esta semana", conta Jorge.

Único menino de fora do eixo Ásia-Oceania entre os "Ballboys" do Australian Open 2010, o goiano - que completa 16 anos nesta quarta-feira - se considera mais um representante do Brasil no primeiro Grand Slam da temporada. Assim, o País - que já contava com Thomaz Bellucci, Marcos Daniel, Ricardo Hocevar, Marcelo Melo, Bruno Soares e André Sá - agora ganha mais um nome para a seleta equipe: Jorge Cotrim. "Quem sabe um dia não possa estar do outro lado, jogando nestas quadras enquanto outros garotos entregam bola para mim", sonha o garoto.

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