Thomaz bellucci

Thomaz Bellucci

Jovem de 21 anos alcançou o top 100 no ano passado e quer se estabelecer entre os melhores em 2009 e sabe que tem jogo para isso


Nos últimos anos, muitos jovens são apresentados como promessas do tênis brasileiro. Um deles é Thomaz Bellucci, jovem nascido em Tietê, pequena cidade do interior de São Paulo. Com 21 anos recém completados (em 30 de dezembro), o canhoto foi um dos tenistas que mais ganhou posições em 2008 para alcançar o top 100. De 183º no começo da temporada, ele terminou em 85º. Com belas campanhas em Challengers e boas experiências em torneios maiores, o garoto estabelece como meta se firmar entre os melhores do mundo em 2009.

A tarefa não é simples, mas ele, que já passou por duas cirurgias no joelho e as superou, não tem medo. Seguro do que quer, garante: "Minha meta é jogar em competições de alto nível durante muito tempo". Para isso, precisa, pelo menos, se manter entre os 100 primeiros.

Em 2008, Bellucci foi a grande sensação do nosso tênis. Longilíneo, com físico interessante para o esporte, o jovem possui um jogo agressivo de fundo, com bons golpes, saque consistente e trabalho de rede eficaz, mas que pode ser melhorado. Para Rafael Nadal - contra quem jogou na estreia de Roland Garros 2008 (era também a primeira vez do jovem na chave principal de um Grand Slam) - o brasileiro tem futuro, mas precisa melhorar sua movimentação. O tieteense concorda com a avaliação do espanhol, mas garante que precisa desenvolver outros pontos também.

Tímido, simples e geralmente de poucas palavras, o canhoto parece ter aprendido várias coisas na temporada passada, dentro e fora das quadras. Uma delas: como se expressar melhor. Se antes suas entrevistas eram sempre enxutas e pouco expressivas, agora ele tende a explanar mais seus pensamentos sem tanto medo. Sobre a troca polêmica de técnico no fim de 2008 (deixou Leonardo Azevedo para trabalhar com João Zwetch), ele se diz tranqüilo: "É coisa do passado. Fiz a escolha certa". Nessa entrevista, o garoto fala de suas experiências e expõe sua determinação de ser um jogador top.

De onde vem a relação com o tênis? Comecei a jogar de pequeno, com oito, nove anos, por causa dos meus pais, que jogavam socialmente, quase todos os dias. Comecei no clube Ipê, no Ibirapuera. Treinei no Wilton Carvalho, no Marcelo Meyer, em várias academias. O Carlão (Albano) foi um dos primeiros professores. Treinavam minha irmã e eu.

Em 2000 e 2001 você tinha 12, 13 anos. Uma época de formação. Qual a influência do Guga na sua decisão de jogar tênis? Acho que diretamente não houve. Nunca fui um fã do Guga. Nunca me espelhei nele, mas sempre gostava de ver jogos dele. Lógico que me incentivou um pouquinho. Vê-lo jogando é sempre legal.

Quem foi seu primeiro ídolo? Quem eu gostava de ver era o Sampras.

O que fez com que optasse pela carreira no tênis? Acho que foi aos poucos. Estudava de manhã e treinava à tarde. Aí, teve uma época em que gostava muito de jogar tênis e não gostava muito de ir pra escola. Daí, meus pais falaram: "Melhor você se dedicar a alguma coisa". Achei melhor treinar e acabei abandonando os estudos. Quando deixei os estudos um pouco de lado, comecei a levar a sério o tênis, como uma profissão. Isso com 14 anos, mais ou menos.

Você começou bem a primeira temporada de 18 anos, era apontado como um grande juvenil, e se machucou... No final do primeiro ano de 18, tive a lesão no joelho e operei. Foi 2004. Foram seis meses para voltar. Foi uma lesão porque cresci muito rápido, um trauma que acabou ocasionando isso.

Mas a lesão não lhe deixou inseguro em continuar na carreira? Machuquei e depois de duas semanas já estava operando. Então não deu tempo de ficar pensando. Operei e em janeiro já estava fazendo fisioterapia. E fui voltando aos poucos. Demorei a voltar porque a gente achou melhor segurar para eu treinar bastante, para pegar ritmo de jogo.

Você foi bem na volta e no fim de 2006 operou de novo... Essa segunda foi mais rápida ainda. Fiquei um mês e meio parado. Operei e, no outro dia, já estava andando. Foi uma operação de ajuste, bem simples. Na época, sentia dor ainda. Podia seguir jogando, mas a gente achou melhor liquidar isso para não ter esse incômodo. Então, preferi operar. Nunca passou pela cabeça parar de jogar por causa da lesão.

#Q#

Aí você voltou em 2007, jogando na Itália. Os resultados lá... Foram péssimos. No meio da gira, me desvinculei do Giovanni (Ballarin, técnico dele na época). Pelo lado financeiro, pois na época na não tinha dinheiro. Fiquei sem técnico quando voltei e acabei deslanchando nessa época em que estava sozinho mesmo, não tinha nem academia para treinar. Daí, acabei fazendo final de Future, campeão de Challenger.

Houve algum jogo marcante para você? Nessa gira da Itália (após a segunda operação), acabei jogando um Challenger. Passei o quali e ganhei uma rodada surpreendente. Não tinha nenhuma ambição nesse torneio, fui para ganhar experiência. Daí, perdi para o Werner Eschauer, que na época era 90º do mundo. Quase ganhei dele. Depois desse jogo, passei a acreditar mais, a ver que podia ganhar dos caras bons. Pois, até aquele jogo não tinha ganhado de ninguém, sempre perdia em quali de Future. Então, até ali, era uma incógnita se eu poderia jogar ou não. Depois daquele jogo, acabei acreditando mais que poderia ser um jogador profissional. Sempre gostei de jogar torneios grandes, quando ia jogar os pequenos e ganhava de um, dois jogadores, não acreditava que eu era tão bom. Quando jogava torneios maiores e ganhava de uns caras melhor ranqueados, começava a acreditar mais.

No final de 2007 você terminou perto do top 200. E pouco antes de Roland Garros em 2008... Foi perfeito, quase... Aqueles resultados (foram 17 vitórias consecutivas e três títulos de Challenger)... Eu já estava em um nível um pouco maior do que os Challengers. Só faltava experiência. Acho que deram alguns cliques na minha cabeça, de acreditar mais em mim, melhorar a parte técnica, tática. E, a partir daquele momento, comecei a enfrentar mais os caras, ganhar jogos. E, ganhando, você vai pegando mais confiança, acreditando que pode chegar a um nível mais alto. Então, acho que essa época foi perfeita.

Vencer três Challengers (Florianópolis, Tunis e Rabat) seguidos não é uma coisa simples, não é fácil... Você não pensa muito, vai jogando... Mas a gente estava treinando bastante, então aquilo foi fruto do trabalho. Tinha ganhado um Challenger em Santiago, um torneio duro. Ganhei do Eduardo Schwank na final. Nesse torneio, amadureci bastante. Daí, na Copa Davis ajudou bastante ter aquele período de cãibra. Estava dois sets à frente e tomei a virada. A semana seguinte, em Florianópolis, não estava jogando bem e consegui ganhar jogos virando toda hora. Então, essas duas semanas me ajudaram muito naquela sequência. Cheguei mais forte mental e fisicamente. Foi só, mais ou menos, um ajuste. Aquilo poderia ter acontecido um pouco antes se não tivesse vacilado na parte técnica e tática. Sabia que uma hora ia ganhar dos caras e foi isso o que aconteceu.

Falando em Copa Davis. O que aconteceu para ter aquelas cãibras contra o Santiago Giraldo? Aquele jogo foi 99% mental. Não sei se estava totalmente preparado. Todo mundo falava que era um confronto fácil. A pressão estava toda em cima de mim. Se a gente ganhasse o primeiro jogo, praticamente decidiria o confronto. Daí, estava super preparado fisicamente, mas mentalmente não. Conforme foi rolando, estava um calor muito forte, e minha cabeça não aguentou, comecei a sentir cãibra. Foi um pouco de nervosismo de ver que poderia ganhar mais facilmente. Perdi no mental. Acho que esse jogo valeu muito por causa da pressão.

Ficou chateado? Não fiquei tão chateado porque a gente ganhou o confronto, mas foi uma experiência que não gostaria de ter de novo.

Você costuma reagir bem às derrotas? Tem derrotas que não dá para ver o lado positivo. Tem umas duas, três, como para o Nieminen, Falla e Hrbaty, por exemplo, em que você não vê o lado positivo. O jogo era meu e perdi porque vacilei. Tem alguns jogos que você tenta tirar o máximo, como o jogo do Nadal. Era 95% de chance de ele ganhar. Nunca tinha jogado com algum top 10. Então, tem derrotas que são boas.

Fale do jogo do Nadal em Roland Garros. Era seu primeiro Grand Slam... Um pouquinho antes do jogo tinha saído a chave e a gente viu os qualis. Falei com o Leo (Azevedo, ex-técnico de Bellucci): "Quero jogar com ele. Mesmo que tenha jogos melhores". Ele brincou: "Melhor pegar uns caras mais fracos". No último jogo do quali, comecei super nervoso. O cara (Tomas Zib) começou me atropelando, 4 a 0. Mas estava motivado pelo fato de ter a possibilidade de pegar o Nadal. Daí, acabei ganhando o jogo super bem, mas nunca imaginava. Tem 16 chances e você pega o cara (Nadal). Não estava acreditando. Quando o Leo chegou no quarto: "Advinha com quem você joga?" Eu tremi: "Com quem?" "Com o Nadal". Na hora, não sabia se ficava triste ou feliz. Porque estava querendo muito jogar com ele, mas, ao mesmo tempo, a possibilidade de ganhar era bem pequena. Foi legal. Até fiquei arrepiado. Já veio na minha cabeça a imagem da quadra central, um monte de gente vendo o jogo.

Conseguiu dormir? Não tenho esse problema de não dormir por nervoso. Estava super ansioso para jogar e chovia. Choveu dois dias seguidos. Não conseguia nem abrir o MSN. E o Leo falava: "Você não abre e-mail, nada, para não ver o que vão falar". Só falava com meus pais. Eles estavam muito nervosos. Meu pai ficava cinco horas seguidas esperando para ver e eu não jogava: "Quero trabalhar e você não joga, pô". Só depois do jogo que dormi muito mal, minha cabeça estava girando tão rápido de lembrança do jogo que eu...

Mas e o fato de o jogo começar e logo ser interrompido? Isso foi bom para mim. Deu pra sentir um pouco a quadra, a bola dele, e ver que não era nenhum bicho papão, que não conseguiria jogar. Acho que foi perfeito. Dei muita sorte.

E você quebrou o saque dele logo no começo... Foi 1/1 e quebrei.

Mas o primeiro set foi 7/5. Com aquela dupla-falta. Poderia ser 7/6...

" Fiquei arrepiado. Já veio na minha cabeça a imagem da quadra central, um monte de gente vendo o jogo (ao saber que enfrentaria Nadal)"

O segundo foi duro também. Só o terceiro teve um deslanche. Ali, ele estava há 20 jogos sem perder.

Você também... A diferença é que ele em Grand Slam e eu em Challenger (risos).

Pensou em algo na quebra logo no começo do primeiro set? No começo, você entra muito ansioso de não fazer feio. Difícil falar: "Quero ganhar". A partir dos 2/2, 3/3 é que comecei a acreditar que podia jogar pau a pau com ele. Só que daí é difícil. O cara não erra uma bola. É um nível que nunca tinha jogado. Então, me custou um pouco no finalzinho.

Dá para jogar pau-a-pau com esses caras top? Naquela época, ainda não estava pronto para ganhar desse cara nem mental, nem tecnicamente. Mas, em 2009, estou preparado para ganhar desses caras. Lógico que ganhar do Nadal em Roland Garros é complicado... Acho que, jogando bem, você pode ganhar de qualquer um. É difícil falar até onde pode chegar. Você pega jogadores que, às vezes, não são tão expressivos e conseguem ganhar desses caras bons. Então, acho que estou já num nível de surpreender, de ganhar de uns caras melhores que eu.

#Q#

E os comentários do Nadal de que você tinha um jogo muito bom, mas faltava melhorar movimentação e posicionamento? Acho que ele está certo. É uma coisa que a gente está melhorando, tem treinado bastante deslocamento, movimentação, posicionamento.

O que falta no seu jogo? Falta de tudo um pouco, é difícil falar. É um conjunto. Tem jogadores que não tem movimentação tão boa, mas jogam atacando. Tem os que não tem um forehand tão bom, mas sacam bem. Você não pode querer ser bom em tudo. Acho que tem alguns pontos fortes e fracos que você tem que minimizar ao máximo. Mas movimentação é um ponto que posso melhorar bastante. Mentalmente, em 2008, tomei alguns jogos de virada, coisa que não pode se repetir.

Quais as metas para 2009? A minha meta é conseguir sair dos Challengers e começar a jogar só ATP a partir de agora. Então, o começo do ano vai ser muito importante porque 80% dos meus pontos estão no primeiro semestre. É preciso jogar bem, defender os pontos, não deixar o ranking cair e não precisar voltar para Challenger, porque acho que estou em nível ATP já.

Thomaz Cocchiarali Bellucci
Nascimento: 30/12/87 em Tietê
Altura e peso: 1,87m e 80 kg
Canhoto
Técnico: João Zwetsch
Melhor ranking: 67º em simples
(16/06/08) 115º em duplas
(12/05/08)
Família: Ildebrando e Regina, pais
Beatriz, irmã
Time: Palmeiras

"Aquele jogo (contra Santiago Giraldo, na Copa Davis, em Sorocaba) foi 99% mental. Não sei se estava totalmente preparado"

O fato de ser uma promessa do tênis brasileiro pressiona? Promessa tem um monte aí (risos). Promessa sempre vai ter. Todo mundo acredita que vai ter um novo Guga a qualquer momento, mas levo na boa. Não me sinto pressionado quanto a isso.

Você é bastante tímido, um pouco fechado. Tem namorada? Não tenho. Não dá tempo (risos). Estou mais focado no meu tênis. Acho que não surgiu a possibilidade de namorar, por isso não tenho. Mas acho que por viajar muito também, é muito difícil. Como vai manter um relacionamento com uma pessoa que quase nunca vê?

Mas o assédio aumentou? Não, não aumentou nada (risos)... Preciso ir para o top 50 pelo menos (risos)...

E sua relação com a imprensa? Sou assim mesmo. Sou sério, não gosto de falar muito. Mas, no começo de 2008, falava menos. Às vezes não sabia o que falar, então, melhor não falar muito do que falar besteira.

Quem lhe chama de Sid (personagem do filme Era do Gelo)? O Marcelo Melo começou com isso. Só algumas pessoas me chamam, não é todo mundo.

Qual seu sonho? Meu objetivo profissional é me manter entre os melhores do mundo sempre. E ficar quatro, cinco anos entre os top 50, conseguir disparar entre os 20, é ficar jogando em alto nível muito tempo. Não chegar e depois sumir como alguns fazem.

Sua primeira experiência no Brasil Open em 2008... Foi péssimo. Não precisa falar, mas... Não estava preparado para a pressão em cima de mim. Estava todo mundo vendo, por ser a despedida do Guga. Estava todo mundo: "O Bellucci vai ser o sucessor dele". Não estava tão preparado. Para 2009, pelo menos não tem essa desculpa de que nunca jogou, não está preparado (risos)...

Arnaldo Grizzo E Rodrigo Linhares

Publicado em 26 de Janeiro de 2009 às 14:09


Perfil/Entrevista

Artigo publicado nesta revista