Connors

Polêmico e arrojado

Em entrevista, Jimmy Connors compartilha suas opiniões sobre o tênis atual e faz uma reflexão sobre uma de suas campanhas mais célebres - quando atingiu a semifinal do US Open ao 39 anos


Ron C. Angle/TPL

TODOS OS GRAND SLAMS possuem jogadores que se tornaram sinônimos do torneio - que são inseparáveis, como se tivessem nascido para jogar aquelas competições. Andre Agassi no Australian Open. Bjorn Borg, Chris Evert e Rafael Nadal em Roland Garros. Martina Navratilova, Pete Sampras e Roger Federer em Wimbledon. No US Open, esse jogador emblemático é Jimmy Connors, e todos os outros brigam para ocupar o segundo lugar.

Não é apenas pelo fato de Connors ser norte-americano e o único homem a ganhar o torneio na grama, saibro e cimento. Na competição mais louca, enérgica e dura do tênis, ele foi o jogador mais louco, enérgico e duro de todos. Há 20 anos, Connors - aos 39 anos, menos de um ano depois de uma cirurgia de reconstrução do pulso e dado como aposentado pela maioria das pessoas - teve sua campanha mais animalesca no US Open. Ela começou com um déficit de 2 sets a 0 na primeira rodada (sua vitima: Patrick McEnroe) e atingiu o ápice no seu 39º aniversário com a épica partida de cinco sets nas oitavas contra Aaron Krickstein. Os lobs. Os smashes defendidos. As ironias. As discussões. Os punhos ao ar. Os gritos. E a quase que total balbúrdia quando Connors se recuperou e ganhou o jogo depois de buscar o placar perdendo por 5/2 no quinto set.

Neste ano foi o 20° aniversário daquela sua campanha fantástica no US Open. Quais suas lembranças dela?
O US Open 1991 foram os melhores 11 dias da minha carreira. Ter ficado afastado por um ano e ter o pulso reconstruído - ninguém tem ideia do que passei para conseguir voltar às quadras. Tive que fortalecer meu punho e quase que aprender a jogar como um iniciante; e tive que fazer fotos para a imprensa durante esse percurso. Não há nada como um incentivo para que você realmente queira voltar a jogar. Agora alguém tem uma dorzinha e vira noticiário.

Quanto tempo teve de esperar para pegar novamente na raquete depois da cirurgia?
Machuquei meu pulso no primeiro torneio que joguei em 1990. Fui ver cirurgiões de punho por todo o país, e todo me disseram para descansar que depois ficaria tudo bem. Tive o pressentimento de que eles estavam com medo de tomar alguma atitude, pois não queriam ser a pessoa que ia encerrar a minha carreira. Então, descansei, descansei, e fiquei um pouco entediado e tentei jogar alguns torneios enfaixando o pulso - não funcionou. No fim de setembro, um médico amigo ligou e disse: "Jimmy, o que aconteceu?". Eu falei: "Nada. Apenas voltei a jogar". Ele: "Vou lhe dizer o que está acontecendo: você. Amanhã de manhã no meu consultório. Pois você está acabado mesmo". Agora, é meio angustiante. Ele abriu meu punho e viu o que havia lá, o que não era muita coisa. Ele foi refazendo e reconstruindo meu pulso esquerdo. Fiquei com um molde no braço todo durante 10, 11 semanas e com meio molde por outras seis semanas. Comecei a jogar com meus dois filhos lançando bolas para mim, do modo como fazia com eles quando eles começaram. Durante esse tempo, as críticas e o tratamento foram um pouco... É engraçado como você consegue ir rapidamente do número um para o número nada. Tive um pouco de sucesso em Roland Garros e Wimbledon. Mas chegar ao US Open, jogar meu melhor tênis e estar no meio daquele furacão durante 11 dias foi uma experiência tremenda.

No começo deste ano, um pesquisador colocou diversos jogos de várias décadas em uma fórmula e determinou que você foi o maior tenista de todos os tempos, baseado no número de vitórias "de qualidade" durante os anos. O que acha disso?
Isso mostra as partidas "de qualidade" e a competitividade que havia na minha geração. Digo, veja quantos grandes tenistas surgiram na mesma época que eu - e um pouco antestambém -, pois joguei contra caras como Rod Laver, John Newcombe, Roy Emerson, Pancho Gonzalez, e depois contra a geração de Agassi, Sampras, Courier também.

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Ron C. Angle/TPL
"Nossa postura era diferente, nossos jogos eram todos diferentes, ninguém jogava da mesma maneira. Todos jogam igual hoje. Tínhamos variedade e carisma. Odeio dizer isso dessa forma, mas tínhamos tudo e eles (fãs) não apreciavam"

Como você enxerga o jogo atualmente?
Treinar Andy Roddick por um ano e meio (começou em 2006) foi uma experiência para abrir meus olhos. Fui capaz de ver muitas mudanças acontecendo no jogo - as boas, más e algumas das mais feias de todas. Gostei de trabalhar com Andy para caramba, mas certamente foi interessante voltar ao circuito e ver como o equipamento mudou o jogo com raquetes e cordas, e o que isso representou na forma como os caras jogam. Em Wimbledon, vi como eles mudaram a grama e a diferença do calçado com que se joga agora comparado com o qual eu jogava. Se tivesse um rali de cinco ou seis bolas com Borg naquela época, nós éramos quase que vaiados. Agora, eles anseiam por isso. Então é incrível como as coisas retornaram ao ponto de partida e o precedente que foi estabelecido há 35 anos está sendo buscado ardentemente agora. Houve tempo melhor do que na época em que joguei? Tenho que dizer isso, certo? Serei honesto: acho que venho de uma geração que está perdida. As pessoas - o establishment e muitos fãs - realmente não sabem o que fazer da gente, pois éramos muito diferentes. Nossa postura era diferente, nossos jogos eram todos diferentes, ninguém jogava da mesma maneira. Todos jogam igual hoje. Tínhamos variedade e carisma. Odeio dizer isso dessa forma, mas tínhamos tudo e eles não apreciavam.

Quem são seus tenistas favoritos atualmente?
Nadal naturalmente. E, ultimamente, Djokovic. Federer agora está descobrindo o que é ter de vencer Djokovic e Nadal na semifinal e na final para ganhar um torneio. Então, será interessante ver como ele lida com isso e que mudanças ele fará para voltar a entrar nesse bolo. Mas seu jogo é mais de elegância e estilo. Nadal é garra e não tem medo de se sujar. Esse é meu tipo de cara.

Federer está com 30 anos. Quanto tempo ele pode ficar no topo? Haverá alguém tão competitivo quanto você quando tinha 38, 39 anos?
Por não existir uma variedade de oponentes que havia antes, acho que ser capaz de jogar por mais tempo será mais fácil agora. Você não precisa jogar com McEnroe de uma forma, depois com Lendl de outra, com Borg de outra ainda, e de outro jeito também Eddie Dibbs. Em cada partida você precisava atuar de duas ou três formas diferentes para poder jogar caso uma delas não desse certo. Da maneira como os caras estão jogando hoje, seus estilos são quase sempre os mesmos.

Como vê o tênis norte-americano? Atualmente é mais complicado ter atletas top com tantos países desenvolvendo tenistas?
Não deveria ser. Ensinamos tudo a eles. Os Estados Unidos eram o plano. Todos vieram e aprenderam como fazer as coisas por aqui e então voltaram para seus países e melhoraram. Infelizmente, todos melhoraram. Nós pensamos que éramos tão bons que teríamos os melhores tenistas do mundo por 35, 40 anos. Tivemos a minha geração, então seguiu com Agassi, Sampras, Courier, aquela geração em que tivemos os melhores por tanto tempo que nos sentamos e dissemos: "Continuem vindo". Ops.

Você teve diversas discussões sobre marcações de bola. Você teria gostado de ter o Hawk-Eye naquela época, ou isso tiraria um pouco do drama das partidas?
Bem, você sabe o que vou dizer. Digo, aquilo era parte do drama do tênis. Agora você questiona uma marcação e é um drama de três segundos. Se olhar para o Hawk-Eye comparado com a época em que jogávamos, quantos jogos se baseavam em uma única chamada? Quantas quebras de saque perdi por metade de metade de um milímetro ou algo do gênero? Ou quantas eu ganhei? Marcações poderiam ter tido uma participação maior nas derrotas e vitórias do que podíamos imaginar. Agora você se admira porque McEnroe, Nastase,Gerulaitis e eu - e outros caras - ficávamos loucos naquelas ocasiões.

Quando você reagia daquela forma, sempre era capaz de usar de forma positiva?
Tudo fazia parte. Ganhar jogos era mais do que apenas bater e rebater bolas. É como você é capaz de lidar com suas emoções, como lida com a plateia, como lida com o oponente e os juízes de linha. É como você lida com a situação toda em quadra que realmente faz com que existam vencedores e perdedores. Gosto do aspecto daquilo. Não era apenas esportividade, era lutar por meus direitos. Não tinha um técnico para descer e gritar comigo; tinha que fazer com que minha presença fosse notada da minha própria forma. Um cara pode ter me roubado uma vez; eu tinha que ter certeza de que ele não faria novamente. Acho que McEnroe, Nastase, Vitas ou quem quer que seja que estivesse naquela posição faria o mesmo. Muitos caras fizeram isso de formas diferentes. Alguns apenas recebiam mais atenção ao fazer aquilo da forma como faziam.

Você chegou a rever o jogo contra Krickstein?
Um pouco. Não sentei para ver o jogo todo, ponto a ponto, mas peguei pedaços dele. Eu estava louco - era como eu jogava. Joguei como um louco; minha atitude era de loucura. Ainda bem que conseguimos ter o tênis que quisemos e tudo o mais que conseguimos no caminho foi um bônus.

Quando você vê hoje, ainda sente o que sentia no momento?
A sensação de jogar uma final do US Open e o que é realmente estar envolvido em uma partida com 5/5 no quinto set - gostaria de poder ter aquela sensação novamente. Muitos caras gostam de ganhar de 6/2, 6/2 e 6/2 - qualquer um pode fazer isso. O jogo de verdade começa no 4/4, 5/5 do quinto set. Não consigo mais ter aquela sensação. Já era. Gostaria de senti-la apenas uma vez mais.

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Tom Perrotta

Publicado em 21 de Outubro de 2011 às 14:48


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Artigo publicado nesta revista