Formação

O que fazer quando meu filho perde?

Saiba lidar com as emoções de seu filho no momento mais duro da competição: a derrota


Arquivo Revista TÊNIS

COMO DESCREVER A DOR DA DERROTA? Às vezes, não há mesmo palavras possíveis para dizer como nos sentimos e as lágrimas assumem o papel de traduzir o sentimento através dos olhos. Para um pai, ver o filho perder dói tanto quanto se ele estivesse em quadra. Ou mais. Observar o choro do filho após a derrota é de cortar o coração. Mas é preciso saber como lidar com a criança nessas horas complicadas.

Jogar faz parte do desenvolvimento da inteligência dos pequenos - moral, cognitiva, emocional, física e motora. Crianças brincam e jogam desde que vêm ao mundo. Contudo, o jogo de tênis adquiriu o status de esporte ao ser aceito por diferentes culturas ao longo do tempo, e hoje é praticado em todos os cantos do planeta inclusive de maneira profissional. Há pessoas que pagam suas contas jogando tênis, mas é preciso que se entenda, em primeiro lugar, que a chance de uma criança participar do circuito profissional algum dia e ganhar um monte de dinheiro, é perto de zero[1]

Isto posto, porque as crianças - e os adultos também - têm medo de perder? E, o que fazer quando a criança - aquela coisa fofinha, frágil, pura - perde na frente de todo mundo em um torneio?

Quando as competições são adequadas ao nível dos participantes (conforme vimos no artigo "Quando meu filho deve começar a jogar torneios?" na página 14 da edição 95), a chance de que aconteçam boas partidas, bem equilibradas e disputadas aumenta bastante. A experiência de jogos deve fazer parte da educação tenística desde o princípio, pois jogamos para nos divertir.

Quando jogamos com a orientação adequada, expressamo-nos e aprendemos em todos os jogos, colocamos nosso ser na disputa integralmente, podemos sair revigorados e amadurecidos - que é função original dos jogos. Perdemos a disputa? Ninguém gosta de perder, ficamos tristes por alguns momentos, mas sabemos que não é o fim do mundo...

Marcelo Ruschel/Poapress


O PORQUÊ DO MEDO DE PERDER

Uma primeira pista para encontrar a razão do medo de perder seria a diminuição de autoestima da criança, que ocorreria caso seus pais e professores a tratassem diferente quando vence ou perde. Se a autoestima dos pais ou professores estiver ligada ao fato de seus filhos serem bem sucedidos no esporte, aí teremos um grande problema.

Trate seu filho igualmente nas vitórias e derrotas, valorizando sempre o esforço, o respeito ao adversário e às regras do jogo, e o espírito esportivo

 

Mesmo com todos os cuidados citados, seu filho jogou, perdeu na frente de todo mundo e chorou?

Em primeiro lugar, abrace-o com muito carinho, ganhando ou perdendo. E além disso:
1. Trate-o igualmente nas vitórias e derrotas, valorizando sempre o esforço, o respeito ao adversário e às regras do jogo, e o espírito esportivo;

2. Esteja perto quando ela se sentir desencorajada. Seja um ouvinte atencioso, sem tentar consertar as coisas.

3. Ao mesmo tempo, dê espaço quando a criança precisar. Ela pode querer ficar um pouco sozinha quando perder, até se sentir um pouco melhor. Não há problema nisso.

4. Mantenha seu senso de humor. Quando você se diverte e passa bons momentos com a criança em torneios, o nível de estresse dela cai bastante.

5. Quando ela quiser conversar sobre a partida, faça perguntas efetivas ao invés de criticar. Ela vai aprender muito mais sobre o jogo e sobre aquele adversário específico se você fizer perguntas como: "Que aspecto do seu jogo você sente que mais melhorou desde o último torneio que participou?"; "Qual golpe você sente que precisa melhorar mais?"; "O que você precisa desenvolver para vencer um adversário como ele?"; "Que pontos fracos você descobriu nesse adversário?", e assim por diante. A ideia com as perguntas efetivas é reorientar e motivar a criança para melhorar cada vez mais seu conhecimento sobre o jogo, sobre o adversário e sobre si mesmo.

6. Seja firme com seu filho caso ele demonstre comportamentos desrespeitosos quando está perdendo. Diga a ele (e dê o exemplo) que espírito esportivo e comportamento ético dentro de quadra são mais importantes do que vencer. Falar palavrões, jogar raquete, roubar etc, são comportamentos imperdoáveis e, nesse caso, a intervenção dos pais, tirando o filho da quadra caso ele se comporte assim, é bem-vinda.

7. Esteja atento aos sinais de estresse que podem indicar que a experiência competitiva passou do limite da criança. Perda de sono e de apetite, sensação de cansaço extremo, alterações bruscas de humor, constantes lesões, excesso de autocrítica, rompantes de raiva, gripes constantes, indicação de baixa autoestima, entre outros sinais, mostram que a experiência do tênis está inadequada para a constituição física e emocional da criança. Cada um tem o seu ponto de equilíbrio, que deve ser respeitado.

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Arquivo Revista TÊNIS

A criança fica muito exposta em um jogo de tênis - quando comparado com outros esportes, principalmente os coletivos. A quadra é grande e ela está lá, sozinha na maioria das disputas, sem receber instrução, sem ter com quem compartilhar frustrações, sem poder dividir a "culpa" de um ponto perdido. O tenista mirim já elabora uma pressão interna para fazer uma boa exibição em quadra.

Quando a primeira pergunta que ouve de um adulto é: "Ganhou?", a criança que perdeu sente aumentarem bastante a dor, a culpa e a pressão para vencer no próximo torneio. E aí podemos imaginar facilmente o círculo vicioso que se inicia: ganhar a qualquer custo (para ser amada), bloquear o aprendizado, mais derrotas, mais medo.

Temos outra pista para encontrar o medo de perder quando a família faz sacrifícios para que a criança jogue tênis. Os sacrifícios podem ser:

1. Financeiros: para se ter uma ideia, nos Estados Unidos há famílias que hipotecam suas casas para pagar treinamentos e viagens das crianças. Sendo assim, os pais devem decidir juntos quanto do orçamento familiar irão dedicar para estudos, viagens, restaurantes e, claro, para as atividades extras dos filhos. Se os jovens jogam tênis e competem, que seja dentro de um orçamento possível.

2. Familiares: faltar a programas da família constantemente para atender a criança que joga, ou prestigiar apenas os eventos do filho que compete (e nunca os eventos do filho que toca um instrumento musical, por exemplo).

3. Pessoais: quando um dos pais adia projetos pessoais para possibilitar o tênis do filho, ou coloca todas as fichas do senso de realização pessoal no sucesso do garoto. Não é preciso nem explicar o potencial problema emocional que essas atitudes podem causar.

ATITUDE DOS PAIS
Outra situação delicada de derrota para se enfrentar ocorre quando pais e filhos jogam juntos e o pai (ou mãe) é melhor tenista, vencendo todas as partidas. Os filhos frequentemente são competitivos com os pais, mas estes não devem ser competitivos com seus filhos, nem estimular isso em família. O ideal é que pratiquem com as crianças, mas sem contagem de placar, ou contem pontos apenas para quantificar a prática. Quando o adulto compete com o seu filho e finge perder, pode comunicar um falso senso de autoconfiança à criança.

A atitude dos pais do lado de fora da quadra durante o jogo do filho também pode deixar a partida mais ou menos "ameaçadora", aumentando ou diminuindo o medo de perder. Pais que ficam ansiosos do lado de fora da quadra, discutem com a família dos adversários, intrometem-se na contagem, dão instruções etc, passam a mensagem de que o jogo é algo tenebroso e desconfortável. O que dirá quando a criança perde?

Referências: [1] Loehr, J. and Kahn III, E.J The Parent- Player Tennis Training Program. New York: The Stephen Greene Press, 1989. (p. 100)
Suzana Silva

Publicado em 23 de Setembro de 2011 às 12:38


Juvenil/Capacitação

Artigo publicado nesta revista